Shotgun Cop Man demonstra bem uma relação interessante nos games entre orçamento, criatividade e qualidade. Acredito que quase todos concordam que a indústria de alto orçamento peca em criatividade, mas seus jogos sempre têm um mínimo de qualidade (sim, até Concord ou Suicide Squad). Os jogos de orçamento mais baixo são os que trazem experiências novas e criativas.

Porém, deve ser difícil conhecer seus limites. Assim, temos dezenas de jogos independentes que tentam dar um passo maior que a perna, e com isso se tornam difíceis de suportarShotgun Cop Man está naquele limiar mágico, em que o desenvolvedor sabe exatamente o que é capaz de alcançar, e não tem orçamento suficiente para envenenar toda a obra.

REVIEW SHOTGUN COP MAN

Shotgun Cop Man, Devolver Digital, DeadToast Entertainment, Delfos

O visual é simples, muito simples. As músicas são sutis e quase inexistentes. Assim, todo o esforço vai para o que realmente interessa: as mecânicas e a sensação de jogar. E nisso, Shotgun Cop Man brilha.

Um twin-stick shooter na alma, esta descrição não é capaz de te dizer o que esperar. Então vou elaborar. Você tem duas armas, sendo que uma é sempre uma escopeta. Forte, com um coice danado, e alcance curto. A outra é um revólver que pode ser trocado por metralhadoras, escopetas de alcance mais longo, entre outras. A pegada é que o coice é parte vital do gameplay.

O COICE É PARTE VITAL DO GAMEPLAY

O coice é a única forma que você tem de pular. Um tiro da escopeta padrão te lança alto e longe, enquanto a outra arma dá um pulinho mais baixo. Isso é tudo, mas o que o jogo faz com isso é incrível. As fases envolvem tiroteio e plataforma, e são absurdamente criativas. Cada mundo – e às vezes mais de uma vez por mundo – temos uma nova mecânica. Canos, ventos, caixas empurradas pelos tiros. E normalmente todas essas mecânicas são combinadas com as que vieram antes para criar novas experiências, às vezes até com quebra-cabeças. Shotgun Cop Man é daqueles que você joga com um sorriso no rosto, sem nunca saber o que te espera na próxima fase.

Ele também tem um grande foco em ser gostoso de jogar. É o tipo de experiência que poderia ser claramente estragada por repetição e frustração. Mas as fases, embora curtas (a maioria não chega a 30 segundos) têm checkpoints. Além disso, você não morre fácil. Ser atingido faz um coração voar. Se você pegar o coração, se recupera. Sem coração, obviamente, um segundo tiro acaba com sua vida. Estas duas colheres de chá fazem TODA a diferença.

Para quem é mais hardcore e quer um desafio, Shotgun Cop Man também entrega. Todas as fases têm objetivos opcionais. Matar todo mundo, vencer o relógio, não ser atingido e, claro, cumprir tudo em uma só jogada. Algumas você vai cumprir naturalmente, outras vão precisar de muitas tentativas. Assim, Shotgun Cop Man entrega o que você deseja, seja o que isso for. É altamente desafiador, mas também pode ser terminado com tranquilidade por quem só quer curtir as fases.

UM FIAPO DE HISTÓRIA

Shotgun Cop Man, Devolver Digital, DeadToast Entertainment, Delfos

Um exemplo de orçamento muito bem investido é na história. Seu objetivo é simples: prender Satanás. Todo mundo começa com um diálogo entre herói e vilão. O herói sempre fala coisas típicas policiais, e o vilão repete sempre a mesma frase: “fuck you, Shotgun Cop Man“, seguido de um dedo do meio. Eu sempre sabia o que ele ia falar e sempre sorria. É tipo quando você tenta ter uma conversa séria com alguém e a pessoa só responde algo tipo “seu cu”. É extremamente irritante, mas neste contexto fica muito engraçado. E, obviamente, é uma história bem rápida de se escrever, sem grandes detalhes, mas que consegue arrancar risos frequentes. Isso é um elogio que poucos jogos merecem.

Shotgun Cop Man não é um jogo longo. Ele pode ser terminado em apenas três horas. Porém, como as fases são bastante curtas, tem uma pá delas. São nove mundos, com 17 fases em cada um. Isso deixa o jogo um tanto cansativo. Imagino que se você jogar um pouquinho por dia, deve ser uma delícia, mas como estava jogando para review, fiz tudo em uma só sentada, e apesar da criatividade extrema no level design, ficou cansativo. Dá aquela sensação de “passei de uma fase, duzentas para terminar”, sabe? Isso fica mais grave porque, embora mecanicamente as fases sejam criativas e divertidas, o audiovisual não muda nunca. É um jogo totalmente focado no gameplay, e creio que ele ganharia pontos se investisse um pouquinho mais no audiovisual.

De qualquer forma, Shotgun Cop Man é um jogo que vem altamente recomendado pelo DELFOS. Se você gosta de videogames pelas mecânicas e pela criatividade, esta é uma das melhores pedidas recentes.

REVER GERAL
Nota:
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
review-shotgun-cop-man-e-joguinho-criativoDisponível: Windows, Switch<br> Analisada: Switch<br> Desenvolvedora: DeadToast Entertainment<br> Editora: Devolver Digital<br> Lançamento: 1 de maio de 2025<br> Gênero: Twin-stick shooter, plataforma 2D<br>