Resident Evil 7: Biohazard

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Acho que nunca uma série de games mudou tanto tantas vezes quanto Resident Evil. Os jogos originais cunharam o termo survival horror e focavam em puzzles e exploração. A partir de Resident Evil 4, a câmera mudou para o hoje popular papagaio de pirata, e a partir daí os lançamentos focaram na ação, deixando os fãs antigos insatisfeitos.

Resident Evil 7 traz um retorno real ao survival horror, mas não para por aí, pois a câmera novamente sofre uma mudança. Agora a coisa toda rola em primeira pessoa e, convenhamos, esta é a melhor perspectiva para deixar um jogo de terror bem mais assustador.

E não se engane, meu estimado amigo. Resident Evil 7 é um jogo de terror, e não deixa nada a dever para títulos como Outlast que, aliás, foi claramente uma inspiração para a Capcom.

Afinal, nenhum jogo existe em um vácuo. A Capcom ouviu as reclamações dos fãs que clamavam por um retorno às raízes, mas ao mesmo tempo ficou de olho no que estava sendo feito de bom no gênero que ajudou a criar. O resultado é não apenas um jogaço, para mim um dos melhores de uma geração relativamente fraca, como também a melhor e mais completa experiência disponível para o Playstation VR até o momento.

Sério, o negócio é tão absurdamente potencializado pelo PS VR que parece até que é um jogo pensado e projetado especificamente para realidade virtual. E digo mais, se você estava em cima do muro quanto a ser um early adopter do headset da Sony, este é O jogo que vai te convencer a comprar. Desde que você goste tanto de jogos de terror quanto eu, é claro.

BEM-VINDO À FAMÍLIA, MOLEQUE!

Você joga com Ethan Winters, um novo personagem na série. Sua esposa desapareceu anos atrás e, do nada você recebe um e-mail dizendo que ela está na fazenda dos Baker, em Louisiana. Como até este momento Ethan não sabe que é o protagonista de um jogo de terror, ele resolve ir até lá, sozinho e desarmado em busca de sua amada teteia. Rá, big mistake! Não demora para ele ser capturado pela família e, na melhor tradição dos survival horrors, seu objetivo é um só e é bastante simples: escape com a sua vida.

Para piorar, os Bakers parecem ser grandes fãs da Umbrella, pois sua casa é repleta de armadilhas, portas trancadas e quebra-cabeças. E é aí que você começa a ver porque o negócio se chama Resident Evil. Sem exagero, a casa e todo o gameplay focado no uso de itens e na exploração lembram muito o primeiro jogo da série. E quando você finalmente consegue abrir a porta da casa, vê que ela é apenas um pedaço da propriedade dos Baker e que você ainda está longe de escapar.

A semelhança com os antigos está apenas no gameplay, pois a história é totalmente independente da mitologia da série, os inimigos são diferentes e eu percebi uma única ligação clara com os jogos anteriores. Dá até para a gente especular se a ideia não surgiu para um jogo diferente e que foi batizado com o nome de Resident Evil para chamar mais atenção, como acontece bastante no cinema (a série Duro de Matar, por exemplo, é notória por comprar roteiros de filmes de ação independentes e colocar seus personagens e título neles).

FUJA! ATIRE!

E se os puzzles e exploração são totalmente roots, a ação é ao mesmo tempo nova para a série e familiar. Por um lado, há a influência de Outlast/Amnesia. Isso significa que é comum aparecerem inimigos contra os quais você estará basicamente indefeso, e o máximo que dá para fazer é retardá-los.

Estes momentos são os mais tensos e marcantes do jogo, e normalmente envolvem um membro da família Baker caçando você. O patriarca da família, Jack, que você vai conhecer a fundo logo nas primeiras horas do jogo, é especialmente assustador e lembra bastante vilões de slasher como o Jason ou Michael Myers.

Há também inimigos padrões, os populares minions, mas eles demoram muito para aparecer. Para você ter uma ideia, eu estava com quatro horas de jogo quando apareceu o primeiro desafeto que podia ser morto com alguns poucos tiros. Não foi meu primeiro momento de perigo, é claro, pois antes disso teve até alguns chefes propriamente ditos.

Contra os minions, a ação lembra mais aquela que conhecemos da série. Por mais mequetrefe que seja o monstro, ele sempre vai precisar de vários headshots para apresuntar e seu personagem não é nem um pouco ágil. Isso significa que o tiroteio segue um certo ritmo. Você vai apertar para trás junto com o botão bola para girar 180º e fugir. Quando ganhar uma certa distância, vai girar de novo e soltar uns pipocos. Se o bicho estiver chegando perto e se recusando a pedir arrego, repita a operação, e torça para sua munição não acabar.

Jogando na dificuldade padrão, eu nunca tive munição suficiente para ficar confortável ou usar apenas as armas mais poderosas, mas também não fiquei indefeso. Isso é bom, porque sabe-se lá por qual motivo, o jogo não deixa você mudar a dificuldade após iniciar a partida.

Meu único momento mais tenso foi pouco depois de começar a aparecer inimigos genéricos, em uma sala na qual apareciam quatro ou cinco de uma vez e eu estava apenas com o revolvinho. Acabei usando uma grande quantidade de recursos, o que me deixou um tanto preocupado, mas depois disso tudo rolou numa boa. Você fica consideravelmente menos indefeso contra vários inimigos após pegar a escopeta (e para pegá-la rola uma referência direta ao primeiro jogo).

FITAS

Se você jogou o demo, já sabe da sacada das fitas interativas. Ao longo da jogatina, você vai encontrar fitas VHS que pode colocar em videocassetes espalhados pela fazenda mostrando o que aconteceu com vítimas anteriores da família Baker. O legal é que você não apenas as assiste, mas as joga. Elas são basicamente desafios autocontidos, que devem ser superados apenas com os itens que você encontrar por ali. Em geral, elas também permitem que você dê uma xeretada em lugares pelos quais ainda vai passar e é claro, quando você chegar lá com o protagonista, o jogo vai brincar com suas expectativas, deixando tudo ainda mais tenso.

Uma das fitas, em especial, chamada de Happy Birthday, é um dos grandes momentos do jogo e lembra bastante uma cena tirada de um Jogos Mortais.

Infelizmente, há uma cena em um navio que se estende mais do que deveria. Ela não é ruim, propriamente dita, mas você é obrigado a explorar o navio inteiro duas vezes, uma dentro da fita e outra fora. E, ao contrário das outras fitas, esta não é opcional, pois é parte importante da história. Eu estava durante todo o jogo considerando que daria o Selo Delfiano Supremo, mas quando constatei que havia passado três horas no navio e que estava me divertindo bem menos ali do que antes, me vi obrigado a guardar o selo de volta no meu bolso.

Nas últimas horas de jogo, também, a coisa começa a ficar bem próxima de um jogo de ação. Neste momento, os puzzles somem e você basicamente anda e atira. Só que agora você está bem armado, então não dá mais medo. Eu até achei legal, afinal, me senti indefeso durante boa parte do jogo, eu merecia chutar uns traseiros. No entanto, já prevejo que vai ter gente reclamando que o terror some nas últimas horas.

Aqui a maioria dos sites encerra a resenha, mas o DELFOS vai além. Eu joguei toda a experiência em VR e agora quero falar um pouco de como foi.

MEDO EM REALIDADE VIRTUAL

Resident Evil 7 dá medo. Até aí, Outlast ou Alien: Isolation também dão. Jogar em VR, no entanto, é um outro nível. É o primeiro passo rumo ao futuro dos games que nos prometiam desde O Passageiro do Futuro.

Se você já brincou com realidade virtual em jogos que permitem movimentação, deve ter percebido a grande propensão a enjoo. Robinson: The Journey, por exemplo, é muito legal e bastante sossegado. Basicamente, você está em uma ilha e deve explorá-la tranquilamente. No entanto, enquanto eu o jogava, a questão era por quanto tempo eu iria conseguir jogá-lo até passar mal e ter que parar.

Resident Evil 7, por outro lado, teve seu aspecto VR desenvolvido com um cuidado que não vemos nem em jogos exclusivos para o headset. Tem aquelas coisas que são padrão, como girar em ângulos pré-definidos, além da possibilidade de você diminuir a velocidade de movimento.

A grande sacada da Capcom, no entanto, foi a inclusão de um filtro. Se você o deixar no automático, ele fica invisível na maior parte do tempo. No entanto, quando você corre, cai ou qualquer coisa que envolva uma movimentação mais rápida, seu campo de visão é diminuído.

Além disso, há alguns momentos mais intensos que são roteirizados. Por exemplo, um inimigo pode te agarrar, bater sua cabeça contra a parede e te arremessar. Nestes casos, o filtro não apenas diminui seu campo de visão, mas chega a fazer cortes, alternando imagens com a tela totalmente preta, dando uma sensação de visão de discoteca, manja?

O PREÇO DO VR

Pode parecer inconveniente, e de fato é. Isso tira parte do impacto e até deixa difícil entender o que está acontecendo. Porém, se este é o preço do VR para não passar mal, é um preço que eu estou disposto a aceitar. Você pode desligar tudo isso e jogar no VR exatamente como jogaria em 2D, e eu até tentei mexer um pouco nisso, aumentando a velocidade do movimento, por exemplo, mas imediatamente rolou desconforto e eu voltei para o padrão. Então acaba sendo um caso de você explorar as opções e ver como funciona melhor para você. Para mim, as opções VR padrões funcionaram muito bem.

Apesar de ter o headset há uns meses, eu o usei relativamente pouco. A maioria dos jogos era bem curto e simples, enquanto outros mais envolventes, como o Robinson, me faziam passar mal a ponto de eu ter que parar de jogar depois de uns 30 minutos.

Graças a estes filtros e ao cuidado da Capcom, eu consegui jogar Resident Evil 7 por uma tarde inteira sem desconforto. Eu não diria que toda a minha campanha foi livre de enjoo. Após alguns chefes ou checkpoints mais difíceis, que exigiam que eu me movimentasse de forma mais intensa, correndo e girando com frequência, eu senti um certo enjoo. Mas foi bem leve perto do que acontecia em jogos muito mais sossegados do que este. Nessas horas, eu desligava o VR um pouquinho e logo já estava pronto para entrar de novo.

Felizmente, todas essas opções são independentes para VR e para 2D. Em outras palavras, você pode manter seu personagem configurado para a lentidão máxima em VR e para a velocidade normal em 2D, que foi o que eu fiz. Pode não parecer uma boa ideia deixar seu personagem mais lento em um jogo com inimigos mortais, e de fato eu diria que Resident Evil 7 é mais difícil em realidade virtual por causa disso. Naquele checkpoint dos quatro ou cinco inimigos do qual falei antes, eu acabei resolvendo tentar passar sem o headset e de fato a coisa ficou bem mais controlável.

Além desses filtros e opções feitas para evitar desconforto, Resident Evil 7 em VR traz algumas outras limitações, provavelmente técnicas. Por exemplo, você não vê o corpo do seu personagem, nem a sua sombra, o que acontece em 2D. Em VR, dá para ver apenas as mãos voando na sua frente, sem estarem conectadas a braços.

Além disso, não dá para negar, o jogo é bem mais bonito na televisão. Com o headset dá a sensação de você estar jogando em uma resolução bem mais baixa, o que acontece pela proximidade da tela aos seus olhos, apesar do fato de a tela do óculos também ser 1080p.

O BENEFÍCIO DO VR

Parece que só tem coisa ruim jogando em VR? Pois de forma alguma! Resident Evil 7 se torna uma experiência única ao ser vivenciado em realidade virtual. Você realmente se sente fisicamente nos locais que está explorando, a ponto de até parar de se incomodar com a baixa resolução depois de um tempo.

Uma coisa realmente impressionante é a noção de escala. Por exemplo, em VR você consegue ter uma noção exata do tamanho físico da sua esposa Mia. Ela é uma moça pequena, bem menor do que o Ethan, e isso facilita que você se afeiçoe a ela. Como eu sou na vida real um sujeito grande, é comum que as mulheres sejam menores do que eu, e achei legal perceber isso também no jogo.

Da mesma forma, Jack Baker é um sujeito enorme, provavelmente passando dos dois metros, o que o deixa deveras intimidador. Eu não sou um cara muito apegado a sustos do tipo “bu!”, mas cheguei ao ponto de gritar de susto em horas que o patriarca dá as caras inesperadamente.

Os inimigos mais monstruosos, então, ficam bem mais assustadores se você os percebe como monstros de mais de dois metros, bem maiores do que você. Até mesmo insetos gigantes, coisa padrão em videogame, ficam mais assustadores quando você se vê frente a frente a um do tamanho do seu braço.

Isso sem falar nos chefes. Seguindo a tradição da série, há alguns chefes enormes, e por enormes eu não quero dizer dois metros, mas tipo do tamanho de uma casa. Não chega ao nível de escala de um God of War, mas uma coisa é você ver um bicho do tamanho de um prédio na sua televisão e outra bem mais assustadora é ver um monstro do tamanho de uma casa bem na sua frente.

Tem também alguns momentos roteirizados em que outros personagens chegam realmente perto de você. De novo, é algo comum em jogos em primeira pessoa e acredito que para quem jogar na televisão vai ser simplesmente uma cutscene, mas é outra coisa quando Jack segura sua cabeça e te obriga a comer um troço nojento que você vê, literalmente, quase encostando nos seus lábios.

Se não fosse o VR, eu teria gostado de Resident Evil 7. Provavelmente tanto quanto gostei de Outlast. Portanto, por tê-lo jogado em VR, eu tive uma das experiências mais marcantes que já vivenciei com um controle na mão. Pela primeira vez eu senti que valeu a pena ter investido os caros tostões no PS VR e fiquei esperançoso com o que o futuro reserva para ele.

LEON É O CAR@$#O, MEU NOME É ETHAN WINTERS!

Se você não tem o PS VR e nem pretende ter, Resident Evil 7 é um excelente jogo. É o retorno à forma antiga que os fãs vinham pedindo à Capcom. Agora se você já tem um PS VR ou pretende adquirí-lo num futuro próximo, este é o jogo que eu recomendaria para você estrear seu novo aparelhinho futurista. É sem dúvida o melhor e o mais impressionante título em VR que já joguei, e torço para que ele não seja a exceção, mas o início de um mundo mágico e mais envolvente para os games.

Se você quer saber a duração do jogo, confira aí na galeria uma imagem com as minhas estatísticas ao terminá-lo.

OS FILMES RESIDENTES:

Resident Evil 2: Apocalipse

Resident Evil 3: A Extinção

Resident Evil 4: Recomeço

Resident Evil 5: Retribuição

Resident Evil 6: O Capítulo Final

OS JOGOS RESIDENTES:

Resident Evil 4: o jogo

Resident Evil HD Remaster

Resident Evil Revelations 2

Resident Evil 0 HD Remaster

Resident Evil 4 ainda é maior legal

Galeria

REVER GERAL
Nota
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
resident-evil-7-biohazardAno: 24 de janeiro de 2017<br> Gênero: Survival Horror<br> Plataforma: PC, PS4 e Xbox One<br> Fabricante: Capcom<br> Versao: PS4<br> Distribuidor: Capcom<br>