O fim dos games super produzidos

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No último da 21, a Microsoft finalmente apresentou ao mundo o seu representante da próxima geração de videogames, o Xbox One.

Porém, o que era para ser um novo e empolgante capítulo no mundo dos jogos eletrônicos acabou se tornando uma das maiores piadas da história deste ramo do entretenimento. Seria hilário, se não fosse trágico.

Ao passar a primeira impressão de seu novo projeto, ficou claro que a empresa do Bill Gates deu um enfoque ridiculamente imenso em maneirismos desnecessários e, principalmente, em televisão. Enquanto isso, a enorme quantidade das pessoas que realmente estava interessada foi quase totalmente ignorada: os gamers.

Sim, amigo delfonauta, todos aqueles que economizaram cada centavo durante meses para comprar um novo Halo e o dobro deste tempo ovacionando o game internet afora. Estes que defenderam ferrenhamente o Xbox 360 nos fóruns da vida, que trocavam 10 mangos estadunidenses por 800 MS Points só para comprar um DLC de um mapa novo em algum FPS foram completamente desprezados, como um jovem apaixonado que faz de tudo para sua amada e só acaba sendo pisoteado.

Este descaso com quem deveria ser seu público-alvo me fez refletir, enquanto chorava encolhido em posição fetal abraçado ao meu lancer, sobre uma notícia que nós publicamos alguns meses atrás.

OS GAMES BLOCKBUSTERS ESTÃO ACABANDO

O delfonauta talvez se lembre da declaração de Alex Hutchinson, diretor de arte de Assassin’s Creed III, dizendo que “os games AAA estão acabando, nós somos os últimos dinossauros”.

Na época eu até havia concordado, mas achei que este dia ainda demoraria uns 10 anos para chegar. Mas o Xbox One está aí para provar que o fim está muito próximo. E se pararmos para pensar, isto, infelizmente, é a mais pura realidade.

Desde o fim da geração Playstation 2, os games de sucesso tornaram-se cada vez mais parecidos com blockbusters, inclusive no custo de produção. Creio que o motivo disso tenha sido o sucesso de games com uma abordagem mais cinematográfica como God of War, Metal Gear Solid 3 (a série usa este método desde 1998, mas só ficou conhecida mesmo a partir deste episódio) e praticamente o primeiro game de uma nova geração: Gears of War, que deixou as caixas de lado e se concentrou não apenas em animações cinematográficas, mas também em “gameplay cinematográfico”.

O público então ficou sedento por este tipo de game e os produtores viram que havia uma grande chance de lucro aí. Assim, começou toda uma nova safra de games ultra-produzidos, com toda grande franquia lançando seu episódio como se fosse o próximo grande hit do cinema.

O problema é que para fazer uma game pintudo desses, é preciso muita grana, muita grana mesmo: é necessário comprar equipamentos de última geração e pagar centenas de programadores, designers e testers para usá-los. Além disso, é necessário contratar desenhistas, roteiristas, dubladores, atores com treinamento acrobático, publicitários, secretários, faxineiros e cozinheiros. Também é necessário arcar com despesas de água, luz, telefone, transporte e mais um monte de coisas chatas típicas de qualquer empresa.

Pois é, delfonauta, produzir um game hoje em dia não é nada barato. Pra você ter ideia, o GTA IV custou, em 2008, 100 milhões de dólares para ficar pronto.

E é aí que está o grande problema: eles começaram a fazer games estilosos demais, bonitos demais e caros demais para um público que, embora relativamente grande e extremamente dedicado, mal cobre todos os gastos. É como fazer um filme em que todo o dinheiro arrecadado na bilheteria sirva somente para pagar as contas e os salários da equipe, não deixando quase nada para os produtores e estúdios.

Não é à toa que hoje em dia grande parte dos games durem cerca de 16 horas. Não é à toa que, embora sejam os mais belos de toda a franquia, Gears of War: Judgement e God of War: Ascension sejam os mais fracos da série. Não é à toa que todo game hoje em dia tenha um zilhão de DLCs que, se somados, formam o preço de um game novo. Não é à toa que a Square-Enix não tenha atingido sua meta no último ano fiscal. O lucro simplesmente não é suficiente. E quando o lucro não é o suficiente, as empresas rumam para outros mares. Alex Hutchinson tinha razão: os games AAA estão entrando em extinção.

OS GAMERS CASUAIS E A APOSTA DA MICROSOFT

A verdade é que, enquanto games elaborados e pomposos, com enredos que fazem muito filminho por aí se morder de inveja, vão mal das pernas, as coisas mais alternativas estão fazendo muito sucesso.

Pegue o Angry Birds, por exemplo: um joguinho relativamente simples de se fazer, sem falas, sem expressões faciais realistas, sem explosões a rodo ou mecânicas de combate complexas, foi baixado por 1,7 bilhões de pessoas, segundo a Forbes.

Outro excelente exemplo é o Wii. O videogame é, de fato, alvo de chacota entre a comunidade gamer até hoje, por não oferecer games com alta qualidade de gráficos… ou mesmo qualquer qualidade para o público hardcore. E você pode até rir dele, delfonauta, mas eu te garanto que os executivos da Sony e da Microsoft não veem muita graça no gráfico abaixo, fornecido pelo VGChartz, onde a Nintendo tem uma vantagem de 20 milhões de unidades vendidas mundo afora.

E sabe o que é pior? É que grande parte destas vendas são causadas pelo público casual, que mal conhece toda a arte do videogame. Um dos meus priminhos, que deve estar com oito ou nove anos, tem um Wii U. E ele só tem dois games: Wii Sports e Nintendo Land. Ele os joga por uma ou duas horas a cada três ou quatro dias e depois vai fazer coisas que são completamente incompreensíveis para mim, como jogar bola na rua. Eu sei, ele é um moleque estranho. Mas existem vários outros como ele.

E você acha que a Nintendo está preocupada com o fato dele e outras cem milhões de pessoas não compreenderem toda a magnitude de um No More Heroes ou de um The Legend of Zelda: Skyward Sword? Claro que não, eles só querem lucro.

Mas não ache que este grande público casual está limitado ao Wii, delfonauta. Eu conheço pessoas que compraram um PS3 só para jogarem Winning Eleven e Fifa, pessoas que compram um X360 só para brincar no Kinect e até uns caras que deram um upgrade caprichado no PC para jogar Counter-Strike e Battlefield 3.

Com as vendas do Kinect nas alturas (o aparelho entrou para o Guinness como o periférico de videogame vendido mais rápido no mundo), e o enorme interesse em televisões interativas, e o Wii velho vendendo mais que seu console atual, o Xbox 360, a Microsoft resolveu apostar no caminho mais promissor, investindo em periféricos e games de esporte, onde os casuais poderão se maravilhar com o fato de ver um bonequinho na tela “fazer o que eu faço”.

Enquanto isso nós, que enchemos os bolsos da Microsoft no passado, receberemos apenas algumas sobras de FPSs genéricos com 15 horas de gameplay e cheios de DLCs para comprar. O PS4 e o PC parecem ser nossa salvação, mas se o Xbox One vingar e o Wii U desencalhar, por que os grandes estúdios perderão tempo (e dinheiro) com isso? Por que raios a Ubisoft irá gastar bilhões de dólares em um novo Assassin’s Creed para milhões de jogadores, quando pode fazer um Just Dance: Backstreet Boys por metade do preço para centenas de milhões?

Claro, o Xbox One terá alguns games muito bons para nós. Quantum Break parece ser ótimo, mas desde já eles deixam um gosto amargo na boca. Digo, Assassin’s Creed IV: Black Flag e Destiny terão conteúdo exclusivo para o PS4, enquanto o console do Bill Gates fica com conteúdos exclusivos dos games da EA Sports. Já é um sinal de que há alguma coisa errada aí.

Torço do fundo do meu coração para que eu esteja errado e esta seja só uma moda passageira, mas eu falei a mesma coisa sobre o Wii seis anos atrás e, pelo jeito, não adiantou muito. Se os games blockbusters realmente forem extintos, creio que seja a hora de pendurar meu controle.