Jethro Tull – Ian Anderson & Orquestra Popular Brasileira

0

Devo admitir que estava absurdamente ansioso para esse show. Até então, a única oportunidade que tive de assistir uma banda de Rock tocar com uma orquestra foi quando o Deep Purple veio fazer aquele tremendo show com a Orquestra Jazz Sinfônica trazendo até o Dio na bagagem (leia resenha do mais recente show do Dio em São Paulo).

A primeira decepção foi quando recebi o setlist da assessoria de imprensa do Credicard Hall e constatei que clássicos do porte de Too Old To Rock ‘n’ Roll e Bungle in the Jungle ficariam de fora. Aliás, isso é um erro que quase toda banda comete quando vai tocar com uma orquestra: esquecer os clássicos e focar nas baladas (vide Scorpions) e/ou músicas da carreira solo dos integrantes (vide Deep Purple). Isso é até estranho quando vemos como uma música pesada, como Dynamite, do Scorpions, funciona bem nesse formato. Creio que a única banda que me lembro no momento que fez um bom setlist ao tocar com uma orquestra foi o Kiss (leia resenha do DVD Kiss Symphony), mas estes cometeram outra falha muito grave: rebaixaram a orquestra a segundo plano, sem aproveitar toda a sua potência.

A segunda decepção veio quando, ao entrar no Credicard, uma garota veio toda simpática falar conosco: “Oi, vocês já estão sentados?”. “Somos imprensa, estamos procurando onde são os lugares de imprensa”, respondi. A garota fechou a cara e disse: “Imagina, imprensa não senta. Vocês tem que ficar em algum canto qualquer da casa”. O mais absurdo é que tinham muitos, e eu digo MUITOS lugares vazios durante o show. Obviamente, não só o DELFOS, como todos os outros veículos acabaram ocupando esses lugares.

Terceira decepção: quando olhei para o palco e vi a ínfima quantidade de cadeiras que seriam ocupadas pela orquestra. Ok, ok, provavelmente aqui a culpa é minha, pois quando penso em uma orquestra, penso logo na Filarmônica de Berlim ou na Sinfônica de Londres (esta última, inclusive, gravou um CD maravilhoso chamado A Classic Case, apenas com músicas do Jethro Tull). Mas realmente foi difícil não me lembrar de um show da Rita Lee no Parque Ibirapuera há alguns anos, que foi divulgado que seria Rita Lee com Orquestra e, ao chegar lá, a “orquestra” era pouco mais que um quarteto de cordas. Não, a orquestra que tocou com o Ian Anderson não chegava a tanto, mas era formada basicamente por instrumentos de cordas e um ou outro de sopro que ficavam lá atrás, escondidinhos da visão do público. Eu, pelo menos, senti falta de pratos, instrumentos de percussão e tal, que dão uma cor (e um peso) a mais para uma orquestra.

O show começou com um pequeno atraso de uns 15 minutos com a divertida Eurology, tocada apenas pela banda. A orquestra se juntaria a eles mais para frente. Ótima abertura. Empolgou bastante a platéia. Seguiram com a também ótima Calliandra Shade. Entre cada música, Ian conversava com a platéia, sempre com muito humor. Na verdade, o humor foi o principal ingrediente desse show, tanto nas conversas, como até mesmo na forma de Ian se movimentar e nas caretas que ele faz. Infelizmente, o único que se movimentava era ele. O resto da banda ficava estático no seu local (e, como disse nosso amigo Bruno, aqui do DELFOS, o guitarrista parecia ser do Hanson. Não que isso faça alguma diferença, mas é engraçado). Até mesmo o tecladista e maestro não tinha aquela empolgação tradicional que vemos normalmente nos regentes em shows de orquestra. Ele nem tinha varetinha, pô! 🙂

Seguiram com Skating Away, Up The Pool e We Five Kings. Finalmente, chegou o momento tão esperado: a entrada da orquestra. Durante as três primeiras músicas com essa formação (Life is a Long Song, Stronger Stuff e Wond’ring Aloud) seria o momento designado para os fotógrafos fazerem seu trabalho. E aqui quero fazer uma pausa para um comentário extra musical.

Assim que os fotógrafos foram para o seu local de trabalho, o público das primeiras fileiras começaram a reclamar, xingar e coisas do tipo (mais ou menos como aconteceu com o G3) pedindo (ou melhor, mandando) os “fotógrafos parasitas” (que na verdade estavam trabalhando para que esse mesmo público pudesse ler resenhas e ter fotos de lembrança do show posteriormente) se abaixarem.

Ok, eu realmente entendo o ponto de vista do público (não sua falta de educação e agressividade, principalmente porque se tratava de um público mais velho do que o normal em shows de Rock e, justamente por isso, é normal esperar uma atitude mais civilizada). Afinal, pagaram uma boa grana para ver a banda (principalmente nas primeiras fileiras) e ficar três músicas, cuja soma não chega a 10 minutos, sem poder ver o Ian Anderson da cintura para baixo deve incomodá-los. Tudo bem também que eu acho que incomoda muito mais quando um animal coloca a namorada (ou uma mina da qual ele está querendo “usufruir”) nos ombros. Afinal, isso fecha completamente (não apenas da cintura para baixo) a visão de todo mundo que está atrás dele – e nunca vi alguém além de mim reclamar, mas ok. Possivelmente as pessoas gostam mais de prejudicar aqueles que estão trabalhando mesmo. E prejudicou, já que tirar fotos ajoelhados quase sem poder mudar de localização (o público reclamava até quando os fotógrafos levantavam apenas a câmera para tirar fotos de um ponto de vista mais alto) não é algo muito recomendável. Mas o fato é que a culpa disso acaba sendo mesmo da organização. Os fotógrafos têm que trabalhar, o público tem que assistir. O Credicard Hall estava com vários degraus removíveis, que deixavam as cadeiras de trás mais altas que as da frente, como no cinema. Bastava colocar alguns desses degraus para deixar as primeiras fileiras acima do nível do chão e pronto. Então fica a dica para o próximo show que tenha cadeiras.

Voltando à nossa resenha, antes da primeira música com orquestra, a banda fez uma pausa para que os músicos da mesma afinassem seus instrumentos. Após fazerem isso, Ian Anderson falou: “Agora é hora de afinar vocês”, e fez aquela brincadeira de a platéia repetir o que ele fala, o que foi feito de forma muito engraçada.

Após estas três músicas citadas três parágrafos atrás, seguiram com Griminelli’s Lament, Cheap Day Return e finalmente dois grandes clássicos do Jethro Tull, Mother Goose e Bouree, ambas muitíssimos bem recebidas e esta última, principalmente, ficou lindíssima com a orquestra (obviamente, já que se trata de uma versão de Bach). A banda fez então uma desnecessária pausa de uns 20 minutos (que durou uns 25).

Após essa primeira metade do show, as pessoas já começaram a formar uma opinião sobre o mesmo. Alguns acharam ótima a possibilidade de assistir músicas dificilmente tocadas ao vivo pelo Jethro Tull. Outros gostariam de assistir os maiores clássicos em suas versões orquestradas. Eu, particularmente, tenho a opinião de que a orquestra, assim como no supracitado Kiss Symphony, estava muito sutil, sem aquela força e peso que eu sempre associo à orquestra e à música clássica (e nem venha me dizer que compositores clássicos como Wagner, por exemplo, não são pesados). Na verdade, a partir da segunda parte, podia-se sentir uma certa frustração da platéia, que se aproveitou do baixo volume e do pouco peso do show para fazer brincadeiras como “Toca Raul”, pedir músicas como Thick as a Brick (que não foi tocada) e até mesmo, no caso de alguns semi-retardados fazer xingamentos e coisas semelhantes ao que aconteceu quando o Deep Purple se aventurou por aqui com suas músicas orquestradas o que, diga-se de passagem, deixou o vocalista Ian Gillian muito bravo com o público tupiniquim e chegou a acusá-lo, com certa razão, de sem cultura, entre outras coisas mais graves. Em um determinado momento, isso parece ter chegado inclusive a irritar o outro Ian, o Anderson, que pediu silêncio para o público fazendo aquele gesto universal de colocar o dedo indicador na frente da boca.

Após a pausa, a banda volta novamente sem a orquestra fazendo uma homenagem a Boris Yeltsin em Boris Dancing. Seguiram com a classiquíssima Living In The Past. E finalmente a Orquestra Popular Brasileira volta a subir ao palco (o fato de tocarem uma parte do show sem a orquestra também remeteu minhas memórias ao Kiss Symphony).

A primeira música com a formação completa seria Pavane, que mostrou mais um show de humor do Ian Anderson. “A próxima música é de um compositor russo que, para minha sorte, está morto. Isso significa que eu posso fazer o que quiser com ela. Até colocar um flamenco ou algo do tipo”, disse o vocalista/flautista.

Após Pavane, Ian disse apenas “Vamos ver se vocês reconhecem a próxima música” e a orquestra começou a tocar a melodia mais conhecida do maior clássico da banda: Aqualung. Finalmente o público estava recebendo o que queria. A música foi absurdamente aplaudida diversas vezes, principalmente quando chegava nos momentos da já citada “melodia mais conhecida” e era comum ouvirmos membros da platéia dizendo coisas como “Nossa” ou “Que legal”. Realmente, a versão de Aqualung é uma prova de como o show inteiro deveria ter sido. Para o amigo leitor ter uma idéia, foi nessa música a primeira vez na noite em que o tal guitarrista que parecia do Hanson largou seu violão e pegou uma guitarra.

Seguiram com mais uma música do Christmas Álbum, God Rest Ye Merry Gentlemen, que também foi gravada pelo tremendão Trans-Siberian Orchestra (leia resenha do disco mais recente deles). Fecharam então com My God e a longa Budapest. Durante esta última, enquanto o maestro/tecladista estava regendo a orquestra, ouvi sons de piano/teclado. Não era o maestro tocando. Procurei no palco, mas não encontrei nenhum outro instrumento de teclas além do teclado do regente. Seria playback? Você decide.

Deram boa noite e saíram do palco. Obviamente, o público ainda não estava saciado e pediu bis (que, também obviamente, já estava previsto no setlist). A banda não enrolou muito. Uns 30 segundos depois que saíram do palco, já estavam todos voltando para a música final: Locomotive Breath (que já foi gravada pelo Helloween e pelo W.A.S.P. – aguarde a entrevista exclusiva do DELFOS com este último para breve).

Como sempre acontece nas últimas músicas de shows onde a platéia fica sentada, todo mundo se levantou e a galera que estava nos lugares mais baratos correu para a frente da primeira fileira, obstruindo a visão do pessoal que desembolsou uma tremenda grana para ficar nessa posição privilegiada. Curiosamente, ao contrário do que aconteceu com os fotógrafos, dessa vez eles não reclamaram. A música ficou muito legal em sua versão orquestrada e é até previsível dizer, mas as únicas músicas mais pesadas do show (Aqualung e Locomotive Breath) foram as mais bem recebidas e as que mais se beneficiaram do formato de orquestra. Vamos torcer para que as próximas bandas que decidam tocar versões orquestradas de suas músicas percebam isso e façam um setlist focado em músicas mais pesadas. E que venham mais shows orquestrados para o Brasil. Será que alguma alma bondosa (e trilhardária) não pode dar um jeito de trazer o Scorpions para cá? De preferência com a Filarmônica de Berlim? Bom, sonhar é de graça…

PS: O Bruno pediu para acrescentar a seguinte notinha na resenha:

“Alguma coisa precisa ser feita para melhorar a saída do Credicard Hall. É inadmissível esperar 1 hora para conseguir tirar o carro do estacionamento oficial da casa com todos os funcionários e manobristas apenas olhando, sem saber o que fazer. E nem adianta ir de ônibus porque, como quem mora em Sampa já sabe, é difícil de chegar no Credicard Hall e agora está difícil para sair também”.

Galeria