Hellboy é, sem dúvida, um dos personagens mais cults dos quadrinhos estadunidenses, com uma vasta legião de fãs espalhada pelo mundo inteiro. O demoníaco detetive do sobrenatural conquistou os leitores com suas histórias cheias de clima de filme de terror – muitas baseadas em folclores de diversos países – visual gótico, uma galeria de coadjuvantes bizarros e o bom humor do protagonista para contrabalancear.
Mas o que de fato diferencia Hellboy dos outros quadrinhos de super-heróis é o controle extremo que seu criador, Mike Mignola, exerce sobre a obra. O sujeito só produz uma HQ do vermelhão quando acha que tem uma boa história do personagem para contar. Deste modo, HB não tem um título mensal. E desta forma, não há a obrigação de criar uma história por mês ou de ter de trocar de equipe criativa, o que em muitos casos compromete a qualidade de uma HQ (é só pegar qualquer personagem que possua uma revista mensal para comprovar que nenhum escapa de algumas fases negras). Outro fator importante: Mignola é um sujeito um tanto quanto lento, então sempre há uma grande janela de tempo entre uma minissérie e outra.
Todas essas características aliadas fazem com que, quando uma nova história do vermelhudo saia, seja praticamente um evento. E mais, fácil de acompanhar e de completar a coleção. E, especificamente no caso do Brasil, isso é mais fácil ainda, pois a maioria das histórias é lançada em encadernados pela Mythos Editora, que começou a publicar suas aventuras em 1998. Nunca foi tão simples acompanhar toda a cronologia de um personagem como é no caso do Hellboy.
E este é o tema desta matéria. Dar uma geral em todo o material do capetão lançado por aqui, ajudando os fãs que porventura não tenham lido tudo a saber o que falta para completar a coleção e os neófitos a se situar no estranho universo do investigador do sobrenatural. Vale lembrar, os títulos estão em ordem de publicação no país, ainda que não necessariamente mantenham a ordem cronológica das histórias. E como já disse antes, todos os títulos saíram pela Mythos Editora, à exceção do crossover Savage Dragon & Hellboy, lançado pela Pandora. E, a não ser onde indicado, roteiro e arte são de Mike Mignola. Tudo esclarecido? Então, vamos às HQs.
SEMENTES DA DESTRUIÇÃO (1998)
A primeira minissérie do vermelhão, publicada aqui em duas edições. Além da origem do Hellboy e da apresentação do Bureau de Pesquisas & Defesa Paranormal (uma organização tipo Arquivo X, onde Hellboy é seu principal agente), conhecemos outros personagens importantes, como o Professor Bruttenholm (o qual cria Hellboy como um filho), Liz Sherman (capaz de gerar fogo do nada) e Abe Sapien (um mutante meio humano meio réptil), e há o primeiro confronto com aquele que até hoje foi seu maior inimigo, o mago Rasputin. Hellboy deve impedi-lo de acordar o megademônio Ogdru Jahad e iniciar o Ragna Rok no planeta, como havia tentado fazer já na 2ª Guerra Mundial.
Essa mini foi usada como a base do primeiro filme do HB. Antes dela, Mike Mignola tinha feito apenas duas histórias curtas (duas páginas cada) para apresentar o personagem, então não se sentia muito confiante como roteirista. Ele escreveu o argumento e cuidou da arte, mas chamou o veterano John Byrne para lhe dar uma força. John concordou em escrever os diálogos, mas apenas para ajudá-lo a encontrar a voz do personagem, para que posteriormente Mignola pudesse escrever sozinho.
Em maio desse ano, a Mythos republicou a minissérie, agora em um encadernado intitulado Hellboy Edição Histórica Volume 1: Sementes da Destruição, ótima oportunidade para quem perdeu à época de seu lançamento original.
Nota: 5,0
O DESPERTAR DO DEMÔNIO (1998)
Continuação direta de Sementes da Destruição, aqui Hellboy e sua equipe vão à Romênia investigar o roubo do cadáver de um possível vampiro e se vêem às voltas com os nazistas responsáveis pelo Projeto Ragna Rok (entre eles Ilsa Haupstein e o mascarado Karl Kroenen, que também apareceram no primeiro filme) e também com o retorno de Rasputin, que ainda não desistiu de trazer o demônio-dragão Ogdru Jahad para a Terra.
Esta série também marca a primeira aparição de um personagem que irá se tornar um dos principais coadjuvantes mais para frente, o Homúnculo, uma pessoa artificial feita de sangue e ervas, cozidas num frasco e incubadas em esterco de cavalo (alguém aí se habilita a fazer o seu?). A criatura é encontrada em um castelo, sem vida, mas Liz Sherman toca no buraco que ele tem no peito e ele acaba por sugar seu poder pirocinético, bem como sua força vital, fugindo em seguida (mais para frente você vai saber o motivo de eu contar isso).
Também é revelado aqui o verdadeiro nome de Hellboy e surge outra marca registrada de suas aventuras, quando ele quebra os próprios chifres, renegando sua função demoníaca.
O Despertar do Demônio foi publicado aqui em três edições, e nelas consta que Mike Mignola foi responsável pelo argumento e arte, mas o roteiro é de James Sinclair. No entanto, pesquisando para esta matéria, entrei no site da Dark Horse (sua editora nos EUA) e lá consta que Mignola roteirizou a história e Sinclair é na verdade apenas o colorista. Bizarro…
Nota: 5,0
HELLBOY & GHOST (1999)
E surge o primeiro crossover para o vermelhão. Nesta edição especial, HB encontra outra personagem da Dark Horse, Ghost. E não, não se trata daquele filme com o Patrick Swayze e a Demi Moore que passa umas três vezes por ano na Sessão da Tarde. Completamente desconhecida por aqui (esta edição marca sua estréia no Brasil), Ghost é Elisa Cameron, uma fantasma (hum, mulheres espectrais com molho transparente…) que busca a verdade sobre sua morte.
Nesta edição, Hellboy vai a mando do Bureau até Arcádia (a cidade de Ghost) para investigar a existência da assombração. E como em todo bom crossover eles vão se encontrar, se estranhar no começo, mas depois se unir para enfrentar um inimigo em comum. O encontro foi escrito por Mike Mignola, mas a arte ficou a cargo de Scott Benefiel (desenhos) e Jasen Rodriguez (arte-final).
Essa é uma das duas histórias do Hellboy publicadas aqui que eu não li. Eu me lembro de quando ela saiu nas bancas. Pensei: “quem diabos é essa Ghost?”, e acabei desencanando de comprar.
Sem nota
SAVAGE DRAGON & HELLBOY (PANDORA, 2001)
E essa é a outra que não li. Porém, nesse caso me arrependo muito de não tê-lo feito. Aliás, não sei dizer porque não comprei essa edição, já que eu também gostava do Savage Dragon, outro personagem cult e muito divertido.
Na verdade, essa é uma história do Dragon com a participação especial do Hellboy, já que foi publicada lá fora em Savage Dragon # 34 e 35, escritas e desenhadas por Erik Larsen, o criador do policial verde com barbatana na cabeça.
Como não li, não sei de muitos detalhes da história, a não ser que ela possui uma das mais insólitas fugas da história das HQs, quando Dragon, após ser engolido por um monstro gigante, escapa pela porta dos fundos (sim, é exatamente onde você está pensando).
Sem nota
HELLBOY 1 DE 2 – O GIGANTE INFERNAL (2001)
Apesar do título, não se trata de uma minissérie em duas partes. Cada número apresenta uma história completa e independente, então você pode ler o número 2 primeiro, se quiser.
Lembra da história do Homúnculo que eu contei lá em cima? Pois é, Liz Sherman está morrendo e Hellboy e a professora Corrigan (uma agente do Bureau de menos destaque) voltam à Romênia para encontrar a criatura.
No entanto, quem a acha primeiro é seu “irmão mais velho”, outro Homúnculo que foi a primeira experiência de seu criador com uma forma de vida artificial. E qualquer semelhança com Frankenstein não é mera coincidência.
Enfim, o mano mais velho quer que o mais novo se una a ele em um novo e gigante corpo artificial que este construiu com o intuito de escravizar a humanidade. O mais novo destrói o maninho maluco e é batizado por HB com o nome de Roger. Ele devolve a força vital de Liz, mas isso o deixa novamente inerte, como quando fora encontrado pela primeira vez.
Nota: 4,0
HELLBOY 2 DE 2 – OS LOBOS DE SANTO AUGUSTO (2001)
Já essa história inaugura uma tradição nos quadrinhos do vermelhão, contar “causos” de seu passado. Em 1994, HB vai ao vilarejo de Griart investigar a chacina de todos os moradores em uma única noite. E acaba saindo no braço com o responsável, um lobisomem.
Ao final, há uma história curta, O Caixão Acorrentado, onde HB volta ao local onde foi conjurado durante a 2ª Guerra. Nada de mais.
Nota: 3,0
BATMAN / HELLBOY / STARMAN (2001)
Neste novo crossover, Hellboy encontra dois personagens da DC Comics, um certo Cavaleiro das Trevas e o menos conhecido Starman. O que é estranho, no entanto, é que, diferente do que o título sugere, não temos a colaboração entre os três personagens! Primeiro o vermelhão interage com Batman e só depois se encontra com Starman. Isso porque, nos EUA, tal crossover foi publicado em duas edições, cada uma dedicada a um personagem, mas aqui saiu em um único número.
Na trama, um grupo de neonazistas ligados à magia ataca Gotham City e Hellboy aparece para ajudar nas investigações, formando uma parceria com o Batimão. Depois o vermelhão e Starman vão até a floresta amazônica desbaratar o covil da organização. História dispensável, com arte de Mignola e roteiro de James Robinson.
Nota: 2,0
A MÃO DIREITA DA PERDIÇÃO (2004)
A partir desta edição, a Mythos passou a publicar as aventuras de Hellboy em encadernados. Esta estréia no novo formato apresenta oito histórias. São seis aventuras curtas no estilo “casos antigos” – todas fruto da fascinação de Mike Mignola pelo folclore dos mais diversos países – e outras duas de mais destaque.
São essas duas que interessam para a cronologia do personagem, A Mão Direita da Perdição e A Caixa do Mal. A primeira, mesmo também sendo curta, esclarece o que diabos é a enorme manopla que Hellboy possui em seu braço direito.
Já A Caixa do Mal gira em torno de um ocultista que liberta um demônio (que estava preso na tal caixa) para ajudá-lo a aprisionar Hellboy e roubar sua coroa (sim, ele tem uma) para que possa controlar o Apocalipse. Aqui é explicada exatamente qual a função da manopla.
Nota: 4,5
O VERME VENCEDOR (2005)
Hellboy e Roger são enviados à Áustria para investigar o retorno de uma espaçonave lançada pelos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial. Em seu interior pode estar o fim da humanidade como a conhecemos, pois ela pegou um passageiro pelo caminho, o tal Verme Vencedor, uma espécie de demônio-fantasma-extraterrestre!
No entanto, eles contarão com a ajuda do lendário Lagosta Johnson para impedir mais uma bagunça de autoria nazista. O Lagosta é outra criação de Mignola, e rapidamente se tornou um favorito dos fãs, que aparece por aqui pela primeira vez (sua primeira aparição cronológica, na verdade, foi em outra história publicada posteriormente por aqui). Johnson foi um vigilante mascarado na década de 30, embora muitos o considerassem apenas um personagem de ficção. Então, como ele pode estar vivo e saltitante nos dias atuais? Bem, para desvendar esse mistério você terá de ler a revista.
Ao final deste encadernado (que originalmente era uma minissérie em quatro partes), Hellboy se demite do B.P.D.P., dando o pontapé para uma nova fase de histórias do vermelhão.
Ah, sim, como curiosidade, o prefácio deste volume é de autoria de Guillermo Del Toro. Acho que você sabe qual filme ele dirigiu.
Nota: 4,0
CONTOS BIZARROS – VOLUME UM (2006)
Depois de anos de controle total sobre sua maior criação, Mike Mignola decide relaxar e abrir as portas para uma galeria de artistas apresentarem suas visões sobre o Hellboy em uma série de 13 histórias curtas, produzidas por nomes como Fabian Nicieza, Joe Casey, John Cassaday e Alex Maleev, dentre outros.
Como qualquer coletânea com múltiplos criadores, os resultados variam, tornando o encadernado irregular, indo do ruim ao muito bom em poucas páginas de distância. O curioso é que a maioria dos artistas aboliu a atmosfera de terror que Mignola tanto aprecia em detrimento de olhares mais cômicos sobre o personagem.
Nota: 2,5
B.P.D.P.: BUREAU DE PESQUISAS & DEFESA PARANORMAL – VOLUME 1 (2006)
Antes de mais nada, é preciso avisar que Hellboy não participa das histórias contidas nesse volume, pois já havia se demitido do Bureau. No entanto, como o foco é em seus coadjuvantes, creio que vale a sua inclusão aqui.
A primeira história, Terra Oca, escrita por Mike Mignola, Christopher Golden e Tom Sniegoski e desenhada por Ryan Sook, traz de volta personagens favoritos dos fãs, como Abe Sapien, Liz Sherman e Roger, além de apresentar Johann Kraus, um fantasma que usa uma roupa de contenção para que seu ectoplasma não se espalhe por aí. Vale lembrar, Kraus marca presença no segundo filme de Hellboy.
Depois, temos mais duas histórias curtas, O Assassino em Meu Crânio e Abe Sapien Contra a Ciência, ambas escritas por Mignola e desenhadas por Matt Smith. O Assassino… marca a primeira aparição cronológica de Lagosta Johnson. Já a segunda mostra Abe Sapien revivendo Roger, o Homúnculo, que fora desativado ao final de O Gigante Infernal, e, portanto, se passa antes de Terra Oca.
Completa este volume outra história protagonizada por Abe Sapien, Tambores dos Mortos, escrita por Brian McDonald e com arte de Derek Thompson.
Nota: 3,5
CONTOS BIZARROS – VOLUME DOIS (2007)
Mais 13 contos do vermelhão, no mesmo esquema do Volume Um. Nesta edição, quem se aventura pelo universo do HB são nomes como Ron Marz, Jim Starlin, P. Craig Russell e Jill Thompson. Tudo o que foi dito sobre o primeiro volume continua valendo para este.
Nota: 2,5
PARAGENS EXÓTICAS (2007)
Agora atuando sozinho, Hellboy embarca em duas aventuras, O Terceiro Desejo e A Ilha, sem grandes novidades para quem já leu alguma de suas aventuras. Também não possui importantes ligações com a sua cronologia. Leitura divertida, mas não chega a ser obrigatória.
Nota: 3,0
A FEITICEIRA TROLL E OUTRAS HISTÓRIAS (2008)
Apesar deste encadernado ser publicado após O Verme Vencedor, e de fato, algumas aventuras terem sido produzidas após essa saga, todas as histórias desta edição ocorrem antes, quando o vermelho ainda fazia parte do B.P.D.P..
São cinco histórias curtas, todas de Mignola e duas mais longas, onde ele apenas escreve, mas entrega a arte a amigos.
A primeira é O Vampiro de Praga, desenhada por P. Craig Russel, onde creio que o título seja auto-explicativo. Na capital da República Tcheca, HB sai no braço com um vampiro. Só ação do começo ao fim.
A outra é Makoma, desenhada por Richard Corben e baseada em uma história do folclore africano. Apenas ok, sem grandes emoções.
Nota: 3,5
E assim demos uma geral em todo o material do personagem publicado em terras brasilis. Para quem quer completar a coleção ou se iniciar no mundo de Hellboy, uma boa pedida é visitar sebos, onde as revistas podem ser achadas facilmente. Para os mais pacientes, talvez valha esperar pelas republicações prometidas pela Mythos na série Hellboy Edição Histórica.
Depois de relembrar todas essas histórias para a matéria que você acabou de ler, creio já estar mais do que preparado para assistir a Hellboy 2 – O Exército Dourado. Então, fico por aqui, pois o cinema me chama. Até a próxima.