Nesta geração tem sido relativamente comum vermos jogos brasileiros saindo para os consoles. De todos eles, talvez o que mais brinca com a cultura brasileira seja este Dandara. Se liga nessa imagem.

Dandara, Delfos
Imagina, Tarsila. São seus olhos. Você… tem olhos, né?

Caso você tenha faltado nas aulas de história, Dandara foi uma guerreira brasileira. Ela foi casada com o Zumbi dos Palmares – deste você provavelmente se lembra. O jogo se inspira visualmente na guerreira real, mas é uma obra de ficção, contando uma história inédita.

UM METROIDVANIA ÚNICO

Se tem um gênero que anda bem popular entre os jogos indies é o metroidvania. Dandara, no entanto, lança mão de uma mecânica que o torna totalmente diferente dos outros. Você não consegue andar. Cuma? Pois é.

Dandara do jogo se movimenta em pulos. Para ela, a gravidade é apenas uma sugestão do seu Newton, então ela consegue pular para qualquer plataforma, desde que tenha um pouquinho de sal nela.

Dandara, Delfos
Na prática, você pode ir apenas para plataformas com a cor branca.

Isso significa que você se movimenta em zigue-zague, pulando do chão para o teto ou para as paredes. Assim, Dandara tem uma movimentação bastante criativa e única. Admito que, quando fiquei sabendo disso, torci o nariz. Pensei que prejudicaria bastante a jogabilidade.

De fato, tem horas que você vai ficar com vontade de xingar, como quando você quer apenas se movimentar um pouquinho para a direita e para isso precisa pular para o teto e depois de volta para a plataforma onde estava. Isso poderia ser resolvido com uma espécie de dash que movimentasse a protagonista horizontalmente em plataformas salgadas.

Dandara, Delfos
Zigue-zague rumo ao futuro.

De qualquer forma, a mecânica funciona melhor do que pode parecer e contribui bastante para o feeling único do jogo.

COM UM MONTE DE COISAS NÃO TÃO ÚNICAS

Infelizmente, apesar da criatividade mostrada na mecânica de movimentação, o jogo peca bastante ao ser MAIS UM que puxa as piores características de Dark Souls. Refiro-me a coisas pentelhas como os checkpoints extremamente limitados e o fato de que você perde toda a experiência acumulada quando morre.

Dica aos desenvolvedores: ninguém nunca morreu num desses jogos carregando XP para três ou quatro upgrades e exclamou “puxa, eu nunca me diverti tanto”. Não, isso é algo que faz os jogadores xingarem com todas as forças, o que torna incompreensível que tantos jogos usem esta mecânica hoje em dia. O mesmo pode ser dito dos checkpoints. Ninguém acha legal ter que repetir uma grande quantidade do jogo ao morrer. Isso não torna o jogo mais desafiador, apenas mais chato.

Dandara, Delfos
Esse sujeito devia chamar Raul.

Dandara bebe bastante na fonte de Dark Souls também em outras características, como você ter um item que recupera sua saúde e outro para mana, ambos recarregados sempre que você ativa um checkpoint, que aqui são acampamentos.

layout do mapa também lembra bastante os jogos da From Software, com um monte de caminhos possíveis e sem nenhuma dica de para onde você deve ir. Claro, a dica é que alguns caminhos estarão bloqueados por obstáculos que só podem ser ultrapassados com novas habilidades. Então, na melhor tradição metroidvania, você basicamente vai explorar em busca de upgrades, e daí vai voltar nestes obstáculos para avançar para novas áreas.

COMBATE

Dandara, Delfos

Dandara tem apenas um ataque padrão, que é um tiro de alcance limitado. Para ativá-lo, você deve segurar o botão X (que no Switch seria o equivalente ao triângulo do Playstation) por cerca de um segundo, mirar e soltar.

Esta necessidade de carregar por um segundo seu ataque normal é uma decisão bem estranha da Long Hat House. Talvez a ideia seja deixar o combate lento, como o de Dark Souls, mas na prática atrapalha bastante, especialmente nos chefes.

Por exemplo, o primeiro grande chefe envolve plataformas que se movimentam para fora da tela. Tem inimigos nelas. Você precisa matar os inimigos e pular nas plataformas que estiverem próximas ao chefe para conseguir atacá-lo, mas no tempo de carregar o ataque, é comum a plataforma sair do alcance do seu tiro.

Dandara, Delfos
Aliás, este chefe é a cabeça flutuante do M. Bison.

Além do ataque normal, há também os que utilizam mana, que são ataques mais rápidos, embora aparentemente não sejam mais poderosos. Eles podem, no entanto, ter habilidades especiais como quebrar paredes de concreto, o que é vital para progredir no jogo.

CULTURA BRASILEIRA

O mais legal do jogo é justamente o fato de que ele parece ser um jogo brasileiro. O nome dos personagens, a cultura e até algumas piadinhas são coisas pensadas especialmente para nós. Por exemplo, tem uma área que chama “A Ponte do Rio que Cai”, referência clara ao programa do Faustão nos anos 90.

Dandara, Delfos

O delfonauta sabe que eu não sou um grande admirador do visual pixelado, e penso que Dandara poderia ser lindo demais se tivesse um visual 3D (na minha cabeça, seria parecido com Psychonauts), mas é claro que isso tornaria o projeto inviável, já que não estamos falando de um AAA.

Apesar de ser artisticamente bastante criativo, não dá para comparar o visual de Dandara com os dos jogos pixelados mais bonitos de outrora. Games como Super Mario WorldStreet Fighter IISonicToe Jam & Earl conseguiam ser bonitos justamente pelo que faziam apesar das limitações das máquinas da época.

No que aparenta ser o final do jogo, uma área chamada “Terra dos Sonhos”, o jogo abre mão de um mapa e apresenta muitos caminhos para o jogador. Um deles leva de volta para a primeira fase. Os outros parecem andar em círculos. Eu fiquei mais de uma hora tentando passar daí, repetindo os mesmos cenários (inclusive na Vila dos Artistas) e aparentemente sem nenhum progresso, o que prejudicou bastante meu tempo com ele.

DANDARA

Não é comum termos um jogo tão inserido na cultura brasileira. A primeira fase, “Vila dos Artistas”, por exemplo, tem um visual totalmente inspirado na arte moderna brasileira. Isso torna Dandara um jogo especial para nós, brasileiros.

Dandara, Delfos
Passar por aí é bem mais difícil do que parece.

É um jogo interessante, que merece ser jogado pelos fãs de Metroidvania e, principalmente, de Dark Souls. Assim como em Dark Souls, no entanto, prepare-se para muita frustração, repetição de longos checkpoints e perda de experiência, além de uma última fase que vai testar sua paciência. Dandara seria melhor se não copiasse estes aspectos, mas ainda é legal apesar deles.

REVER GERAL
Nota:
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
dandara-metroidvania-na-cultura-brasileiraDisponível: Switch, PC, Mac, iOS e Android (PS4 e Xbox One ganharão versões posteriormente)<br> Analisada: Switch<br> Desenvolvedora: Long Hat House<br> Editora: Raw Fury<br> Gênero: Metroidvania brasileiro<br> Lançamento: 6 de fevereiro de 2018<br>