Creedence Clearwater Revisited

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Caipiras são legais. Espero que nenhum paranóico veja nenhuma ofensa nessa informação, mas desde criança era assim que eu me sentia. Sempre preferi ter contato com pessoas do interior a da cidade grande, pois essa galera era simplesmente muito mais agradável para se estar por perto, já que nós, moradores de megalópoles, passamos tanto tempo preocupados com nossas obrigações que praticamente jogamos nossas vidas inteiras no lixo. Então dedico essa resenha a todas essas pessoas legais que moram no interior que sabem curtir a vida tão melhor do que nós.

Claro que o parágrafo acima se refere apenas aos caipiras brasileiros, já que os caipiras estadunidenses costumam ser grandes babacas, dos quais o presidente Bush é o melhor exemplo. Curiosamente, quando se fala de música, os caipiras dos EUA detonam os nossos, pois enquanto os nossos fazem coisas como Leandro e Leonardo, os deles fazem o fenomenal Creedence Clearwater Revival. Isso sem falar que a própria música Country, equivalente direto deles ao nosso Sertanejo, é muito legal.

É fato que toda a equipe do DELFOS curte Rock, então admito que me surpreendi quando ninguém se manifestou quando perguntei quem gostaria de cobrir o show do Creedence Clearwater Revisited. O Guilherme, nosso representante true do mais pesado do Metal disse que eles eram Pop. O Cyrino os acusou, com certa razão, de serem uma banda cover (falo mais sobre isso em breve) e o Rezek… bem, acho que nesse momento, ele estava pensando no show do Michael Jackson que assistiu há tempos.

O problema era que o show do Dio estava marcado para o dia seguinte e cobrir sozinho dois shows seguidos, ainda mais nos dias da semana mais pesados para mim por diversos motivos, seria extremamente desgastante (cobrir um show é muito mais trabalho do que a maior parte das pessoas pensa, acredite). Então insisti um pouco e acabei convencendo o Cyrino a cobrir o show caso emprestasse um CD da banda para ele. O problema é que ele só poderia cobrir o segundo dia. Adivinha só: fomos credenciados apenas para o primeiro.

Felizmente, o show do baixinho do Metal foi adiado, o que diminuiu o desgaste de cobrir o show sozinho. Liguei para a Cinthia, minha tradicional ajudante quando ninguém mais na equipe está disponível e lá fomos nós em direção ao Credicard Hall.

Para quem não sabe, o Creedence Clearwater Revisited é um projeto do baixista Stu Cook e do baterista Doug Clifford (membros originais da banda Creedence Clearwater Revival), que consistia em chamar outros três membros para tocar clássicos de sua banda mais famosa. Os adendos são o vocalista John Tristao, o guitarrista Tal Morris e o faz-tudo Steve Gunner, que toca teclado, violão, pandeiro, chocalho, gaita e provavelmente deve ser um virtuoso na campainha.

Essa resenha poderia ser inteira uma discussão sobre quão justo é eles voltarem com a banda sem os irmãos John e Tom Fogerty, mas vou condensar minha opinião sobre isso neste parágrafo: teria sido muito pior se tivessem voltado com o nome de Creedence Clearwater Revival, mas não fizeram isso. Está bem claro em todos os anúncios que é o Revisited, ou seja, uma banda cover com membros originais. E como Tom Fogerty está morto, isso é o mais próximo que os mais jovens, como eu, vão chegar de assistir a um show do Creedence. E por mais que isso possa não ser justo com a memória do ex-líder, admito que adoraria ter uma chance de assistir a um show do Queen, mesmo que fosse com Paul Rodgers assumindo o posto de um dos maiores vocalistas da história do Rock.

Já tornei público aqui no DELFOS minha decepção com a galera do Metal, o que tem feito com que eu ouça cada vez mais outros estilos que já ouvia antes, mas com os quais estou atualmente mais ligado do que com o Metal, como o Hard Rock, música clássica e até muita coisa do bom Pop. Isso, aliado ao fato de eu já ter tido oportunidade de assistir a quase todas as bandas de Metal que gosto, inclusive fotografando os shows, como Helloween ou Gamma Ray, me deixa bem mais empolgado para assistir a concertos diferentes e ver como outros tipos de público reagem aos seus ídolos. Foi assim com o Millencolin e foi assim nesse show que, ao contrário dos Punks suecos, foi bem agradável.

Sinceramente, achei que fosse estar muito vazio, afinal, dois dias de shows de uma banda cover que já veio várias vezes para cá, ambos realizados durante a semana e na maior casa de espetáculos de São Paulo (embora esteja muito longe de ser a melhor). Ledo engano, pois estava muito cheio.

O público também era diferente. Tive a impressão que eu era a única pessoa com menos de 30 anos no local. Tinha vários tios com aquele tradicional visual Born to be Wild, pessoas de terno, que possivelmente tinham no show o melhor momento de um exaustivo dia de trabalho e até umas mulheres bem mais velhas do que estou acostumado a ver em shows, embora nem por isso sejam mais feias, aliás, muito pelo contrário. Tinha também uns dois carinhas que pareciam sósias do Elvis. Será que eles saem na rua daquele jeito ou foi uma produção específica para o show?

As pessoas mais jovens que vi pareciam ser os representantes da imprensa, e mesmo eles não eram os que sempre vejo em shows, ao contrário do Millencolin, que pareceu ter sido coberto pelos mesmos veículos metálicos de sempre. Fico pensando se, daqui a uns 20 anos, o público de um show do Destruction também seria composto de engravatados sentadinhos. Ia ser legal.

Outra coisa que estava bem curioso nesse show, já que nunca tinha tido a oportunidade de ir a um concerto de Rock’n’Roll puro, era se a galera dançaria como no Baile do Encanto Submarino. E já adianto: não, não dançaram.

Como o show era sentado, não tinha chiqueirinho, o que significa que novamente teria que fotografar ajoelhado, como se por ter essa profissão tivesse que pagar penitência. Ia ser legal chegar no escritório de um daqueles engravatados e pedir para eles trabalharem ajoelhados para ver qual seria a reação e se eles seriam tão dóceis quanto os fotógrafos, que acabam ajoelhando. Curioso que ninguém reclama quando, no final do show, todo mundo levanta. Por que será?

Bom, o show começou às 10 horas, com meia-hora de atraso. Calmamente, os músicos aparecem, cada um pega seu instrumento e começam a tocar Born on the Bayou. Achei uma opção estranha para abrir o show, mas admito que não fiquei com nem um pouquinho de saudades das pentelhíssimas introduções de 10 a 15 minutos usadas por bandas como o Angra. Claro que esses também são casos específicos de bandas sem noção que devem achar que o público vai para ouvir playback.

Estava curioso para conferir como o vocalista se sairia, já que John Fogerty tem uma voz bem diferente e inimitável. E quem diria, John Tristao manda muito bem. Não diria que não ficamos com saudades de Fogerty, mas Tristao fez seu trabalho muito bem. Aliás, não posso deixar de comentar isso, o cara é a cara do Ralf Scheepers. A iluminação também chamou muito a atenção, variando bastante em cores e desenhos e dando um ar meio psicodélico para o show.

Seguiram com Green River, Lodi e Commotion. A banda é bem sorridente e simpática e até mesmo as pausas eram divertidas. Após dizer como é legal estar de volta em nossas terras, mandam três classicaços seguidos. O primeiro foi Who’ll Stop The Rain, seguida de Suzie Q, que foi prolongada e teve um solo de guitarra legal, mas que deveria ter sido mais curto, afinal, o público do Creedence não tem nada a ver com o do Malmsteen. O terceiro clássico foi a divertida Hey Tonight, que fez todos cantarem juntos.

Uma pequena pausa e o baixista apresenta a banda. Quando chega no baterista, o cara sai de seu instrumento, vem até o microfone e conta uma história de como foi formada a banda há 48 anos (48 anos, cara! Provavelmente quando seu pai nasceu, o Creedence já existia). Muito legal e divertida, mas não precisava ter terminado com o clichezão “Acredite nos seus sonhos”. Como ainda tem gente que aplaude esse tipo de coisa? É só repetição de frases feitas e desgastadas.

O show parece ter seguido o esquema de três músicas e uma pausa e as próximas três foram Long as I Can See the Light, Down on the Corner e Lookin’ Out My Backdoor, seguidas de Heard it Through the Grapevine, que teve solos de todo mundo e, durante a qual, Tristao teve sua careca lustrada por um roadie de forma bem engraçada, me senti até em um desenho do Pica Pau; Midnight Special e Bad Moon.

Como você pode perceber, foi clássico atrás de clássico. Até a pessoa mais leiga na platéia provavelmente conhecia 90 por cento dessas músicas. Aliás, boa parte delas é daquele tipo que ninguém sabe o nome ou de qual banda é, mas todos conhecem. De qualquer forma, os grandes clássicos estavam ainda por vir e, a partir daí, ouviríamos uma seqüência com algumas das músicas mais conhecidas da história do Rock, daquelas que vira e mexe são cantadas até por astros da música Pop (já vi umas três delas no American Idol, por exemplo. E quase não assisto a esse programa).

A primeira delas foi Proud Mary e o público gritou tanto que quase não se ouvia a banda. É, amigão, os tiozinhos engravatados sabem agitar tanto quanto os headbangers. Desnecessário dizer que seu refrão foi cantado por todos os presentes e que, se a banda não quisesse, nem precisaria ter cantado, já que a galera se encarregaria disso. Esse clima se manteve pelo resto do show, já que a próxima também é uma das preferidas de todo mundo, inclusive a minha: Fortunate Son e sua melodia deliciosa.

Os músicos saem do show e então acontece uma coisa inédita: o público realmente pede pelo bis! Sério, cara, foi muito estranho. Nunca vi isso acontecer em nenhum dos shows que fui e olha que já fui em muito show que não tem nada a ver com Metal, tipo Rita Lee e Luís Melodia. Será que os velhinhos não sabiam que hoje em dia o bis faz parte do show programado ou será que estavam tão empolgados que nem se importaram com isso?

Bom, a banda não se fez de rogada e voltou rapidinho com o hit de videokê Have You Ever Seen The Rain, onde o público começou a se levantar em massa. Me deu vontade de começar a gritar “Ajoelha aí, po**a”, como os caras da primeira fila falaram para os fotógrafos, mas me contive e continuei curtindo o show. Afinal, não sou um troglodita.

É hora de dançar com a típica Rock’n’Roll Travellin’ Band, que é outra de minhas preferidas. E realmente a galera dançou, mas infelizmente não tinham nem metade da habilidade mostrada no supracitado baile do De Volta Para o Futuro. A banda sai novamente e o pessoal pede o bis de novo.

Não demora muito e os caras voltam com Run Through the Jungle e Up Around the Bend, antes de se despedir de vez. Esse final foi um tanto desnecessário e, embora sejam músicas muito legais, não são legais o suficiente para seguir as quatro anteriores, que são os grandes hits da banda. Acredito que o show teria sido mais legal se tivessem passado essas duas para o meio do show.

Noventa minutos depois, o show da banda cover Creedence Clearwater Revisited termina, me deixando agradavelmente surpreso com quão tremendão foi. Considero uma hora e meia bem pouco para um show, mas como foi em um dia de semana e os caras provavelmente não têm as mesmas condições físicas de bandas jovens como o Children of Bodom, que fazem shows ainda mais curtos, vou perdoar essa falha. Execuções primorosas de clássicos atrás de clássicos, um setlist muito bem escolhido e muita simpatia permearam esses 90 minutos e arrecadaram para os caras a honra máxima do DELFOS, o Selo Delfiano Supremo, que não era concedido para shows há muito, muito tempo. E aposto que o Cyrino está mordendo as unhas nesse momento por ter perdido o que foi, até agora, o melhor show do ano. Mas o ano ainda promete, pois Dio e Stryper vêm aí. Quem ganhará o título afinal? Fique ligado no DELFOS para descobrir.

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