Par Perfeito

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Permita-me começar este texto narrando fielmente como é quando eu saio de casa rumo a uma cabine de um filme do Ashton Kutcher. Para começar, após deliciar-me com um saudável café da manhã feito na minha churrasqueira profissional, eu tento cometer suicídio batendo repetidamente a xícara contra a minha cabeça. Quando isso falha e eu vejo que não terei escolha, acabo saindo de casa, bufando e mal humorado.

No elevador, encontro a simpática velhinha que mora no apartamento ao lado e, quando ela sorri para mim e me dá bom dia, eu a chuto até ela olhar para cima chorando e perguntar “por quê?”. Eu respondo que é por causa de mulheres como ela, que não vêem diferença entre um cara bonitinho e um bom ator, que eu tenho que aturar o Ashton Kutcher.

Finalmente, saio do prédio mostrando o dedo do meio para o porteiro, após enforcar o gato de estimação da vizinha gata. No caminho para o cinema, vou literalmente matando cachorro a grito. O que eu grito? “Zorro”. É tiro e queda, experimente.

Mas talvez eu esteja me apressando para julgar. Afinal, o último filme do sujeito não foi assim tão ruim. Talvez esse seja assistível. Quem diria? Após a sessão, vejo que ele era mesmo assistível. Acho que eu devo desculpas à velhinha simpática e à vizinha gata. Obviamente, só desculpar-me-ei com a vizinha gata, pois não quero visitar a velhinha no hospital e “ei, desculpa por ter enforcado seu gato até a morte” é uma excelente abertura para chamar a bonitinha para um encontro. Se eu completar isso dizendo que o piercing dela reflete a luz do sol e isso me pira o cabeção, ela sem dúvida será minha.

E depois, o mundo! Bwa-hahaha!

Divagações à parte, temos aqui uma versão piorada de Encontro Explosivo. Ashton Kutcher trabalha para o governo matando pessoas malvadas. Mas daí ele conhece a Katherine Heigl que, convenhamos, não seria mais linda nem se tivesse fatias de mussarela derretida escorrendo pelas bochechas. Obviamente, ele se apaixona durante um videoclipe (se vocês querem ir de completos desconhecidos para almas gêmeas, tudo que precisam é de um videoclipe) e decide largar a vida de matador. Mas sabe como é, como boa mulher ciumenta, talvez a vida de matador não queira largar dele. Alguém pensou em altas confusões? Pois é.

Agora diz aí, que filme isso lembra? Se você falou True Lies, pode me adicionar no Orkut, pois agora você é meu amigo e todos nós sabemos que se algo diz “amizade verdadeira” é ter o retrato do outro no Orkut.

Porém, ao contrário de True Lies, onde fomos abençoados com a atuação sempre impecável de Arnold Schwarzenegger e a direção precisa de James Cameron, aqui temos a dupla Ashton e sei-lá-quem-dirige-isso. Desnecessário dizer que, portanto, não temos aqui nenhuma pérola da sétima arte, como os filmes estrelados pelo governator.

Mas sabe que o negócio não me fez considerar o suicídio em nenhum momento? Ei, essa é uma tremenda vitória por parte do Ashton Kutcher. Temos aqui mais um pornô feminino (aliás, se alguma delfonauta feminina quiser explicar porque diabos mulheres gostam de sentir perigo, acredito que todos os delfonautos vão querer saber), onde todo mundo está atirando nos dois e o mocinho está constantemente protegendo a mocinha enquanto vai perdendo pouco a pouco as peças de roupa. Felizmente, o diretor não é Zack Snyder, então ele não chega a ficar só de cueca.

E visto dessa forma, como um filminho genérico para mulheres que gostam de agitação, até dá para se divertir um pouco. Poxa, tem até helicópteros explodindo e nós sabemos que isso nunca é demais. O filme não se leva a sério e, portanto, nós também não devemos encará-lo assim.

O problema, no entanto, é o final. Na tentativa de fazer uma viradinha à Shyamalan, os roteiristas acabaram fazendo um emaranhado que simplesmente não faz sentido nenhum. Isso prejudicou sobremaneira o filme, especialmente porque eu percebi que nunca tinha usado a palavra sobremaneira por aqui e achei que já era hora.

Dessa forma, temos aqui um filminho divertido, onde é quase possível ignorar a presença do Ashton Kutcher e se divertir um pouco. Quase. Mas, ei, sério que tem alguém que paga para ver filmes com esse cara?

REVER GERAL
Nota
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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
par-perfeitoPaís: EUA<br> Ano: 2010<br> Elenco: Ashton Kutcher, Katherine Heigl e Tom Selleck.<br> Diretor: Robert Luketick<br> Distribuidor: Imagem<br>