Em se tratando de literatura britânica, muitos brasileiros conhecem apenas a fantástica saga criada por Tolkien com a febre de O Senhor dos Anéis e afins. Mas a terra da rainha tem em seu currículo nomes de respeito além de Tolkien, como Arthur Conan Doyle, Agatha Christie e, por quê não, Douglas Adams com sua série sobre o Guia do Mochileiro das Galáxias.
Há anos ouço falar deste livro, mas nunca consegui encontrá-lo nas prateleiras das lojas especializadas. Até que em uma visitinha recente a uma famosa (e gigante) livraria em um shopping aqui em São Paulo, dou de cara com um exemplar e nem pensei duas vezes antes de comprá-lo.
Douglas Adams escreveu o “Guia”, originalmente, como um programa de televisão no formato Sitcom, mas foi recusado por todos os canais onde tentou ganhar espaço na programação. Um funcionário da BBC inglesa, no entanto, gostou do trabalho de Adams e encaminhou os roteiros para uma rádio local de Londres que levou o programa ao ar, pela primeira vez, em 1978 no formato semanal, parecido com as antigas novelas do rádio que também tínhamos aqui no Brasil. Não preciso nem dizer que a série fez muito sucesso e passou para uma coleção em fitas cassete, novamente como um sucesso de vendas e, finalmente foi transformada, em uma coleção de livros. Só por curiosidade, o livro ganhou, finalmente, uma adaptação para a televisão em 1981, mas esta foi a única franquia da série que não fez muito sucesso. O escritor faleceu precocemente aos 49 anos de idade, em 2001, mas deixou como herança um belíssimo exemplar de ficção científica que nos traz várias reflexões sobre os motivos de nossa existência.
A premissa da história é bem interessante: imagine você, uma pessoa normal, dona de uma vidinha medíocre (já se identificou?) que, de repente, sem mais nem menos, descobre que o Planeta Terra foi destruído e você é o único sobrevivente da espécie humana, perdido nos confins do universo infinito.
Pois isso foi exatamente o que aconteceu com Arthur Dent, um britânico que, de uma hora para outra, vê tudo o que ele conhecia indo literalmente para o espaço. Mas Dent não está sozinho nisso, seu amigo Ford Prefect (sentiu o trocadilho do nome?), um alienígena que vivia disfarçado aqui na Terra para nos pesquisar, vai ajudá-lo em sua nova readaptação. Prefect estava pesquisando a raça humana e o planeta Terra para escrever alguns parágrafos para o Guia do Mochileiro das Galáxias (daí o nome do livro), uma espécie de enciclopédia espacial (quase) completa, com a famosa e convencional frase “Não entre em pânico!” na capa e, onde estão reunidas informações sobre (quase) tudo que existe no universo, sempre com comentários irônicos e, digamos, não muito educados sobre os planetas e suas raças.
Ao contrário do que você possa estar imaginando, a história não gira em torno de um drama e não procura concentrar muitas páginas na reação de Dent ao perder seus amigos, familiares e seu planeta. O Guia do Mochileiro das Galáxias é um belo exemplar do humor britânico nonsense, estilo Monty Phyton (aliás, o autor Douglas Adams era amigo íntimo dos integrantes do grupo e fez uma participação especial em um episódio de 1974), que não perdoa nada e faz duras críticas à burocracia, política, à “alta cultura”, mas tudo cercado por doses cavalares de risadas e muitas situações inusitadas como, por exemplo, as portas de uma determinada nave espacial que gemem de prazer sempre que abrem ou fecham pelo bom serviço prestado aos seus donos, ou o robô depressivo Marvin.
A jornada através das galáxias e povos tão diferentes, acaba levando Arthur Dent a descobrir até mesmo o sentido da vida (de onde viemos e para onde vamos) e o verdadeiro propósito da criação de nosso querido planeta Terra. Para ler, reler, se divertir e refletir se, na verdade, não somos apenas protagonistas de uma grande piada cósmica. Surpreendi-me muito (sempre pelo lado positivo) com o livro e recomendo à todos. Mais que uma bela história engraçada, é uma aula de como valorizar o que realmente é importante na vida.
A Editora Sextante está relançando o livro no Brasil por um preço camarada (R$ 20,00) após quase uma década de sumiço nas prateleiras. Vale lembrar também que este é apenas o primeiro volume da viagem de Arthur Dent pela galáxia. As aventuras continuarão em O Restaurante no Fim do Universo; A vida, o Universo e Tudo mais; e Até mais, e Obrigado pelos Peixes, que a Editora promete lançar em breve e serve de aquecimento também para o filme do Guia do Mochileiro das Galáxias que já está sendo rodado e deve sair em 2005.