Uma coisa que me incomoda – e que provavelmente incomoda todos os fãs de games – é a efemeridade da mídia. Em nenhuma outra manifestação cultural, algo lançado 10 ou 15 anos atrás fica praticamente desaparecido e inacessível para um novo público. Daí a importância de relançamentos. Infelizmente, estes costumam ser focados em grandes sucessos, que boa parte do público já jogou. Esta é nossa análise Vasara Collection.
ANÁLISE VASARA COLLECTION
Vasara é um arcade desenvolvido pela Visco Corporation em 2000, com uma continuação lançada em 2001. Nesta época, os fliperamas já estavam morrendo, e talvez por isso os dois Vasara nunca atingiram a popularidade de outros representantes do mesmo gênero, como R-Type ou Gradius. Daí entra a QUByte e o objeto desta análise, Vasara Collection.
Este é um caso único de preservação da nossa cultura gamer. Até onde sei, os brasileiros da QUByte (criadores de 99Vidas) não têm em sua equipe alguém envolvido com a criação dos Vasara originais. Ainda assim, eles foram atrás da licença e fizeram toda a mão de obra para trazer este jogo aos consoles atuais e a um público que em sua maioria nunca os jogou antes. E isso é digno de aplausos.
Vasara Collection inclui os dois arcades originais, com algumas opções bacaninhas e o mais impressionante: uma recriação visual da arte em um novo e inédito modo chamado Timeless. Confira a diferença nas duas imagens abaixo.
Vamos falar um pouco de cada um deles.
VASARA 1 & 2
Aqui temos versões dos jogos como eles eram, com a mesma jogabilidade, visual e músicas, com algumas opções espertas. Vasara é um daqueles jogos de navinha em que a tela era vertical. Nesta versão, você pode escolher jogar em widescreen normal, em que o aspecto original é preservado e apenas um terço da tela é usado pelo jogo (o restante é ocupado por uma moldura). Outra opção é rotacionar a imagem, para que ela ocupe mais espaço na tela.
Isso tem alguma utilidade se você estiver jogando no Switch em modo portátil, uma vez que pode simplesmente mudar a orientação da tela. No PS4 ou no Xbox One, você teria que mudar a posição da sua TV apenas para este jogo, o que duvido que alguém faça. Teria sido legal se houvesse uma opção para inverter também o direcional do controle, o que possibilitaria jogar Vasara como um sidescroller estilo R-Type, mas acho que a turma da QUByte não pensou nisso.
Os dois Vasara são jogos muito legais e absurdamente divertidos. A diferença entre eles, além das fases, claro, está no golpe especial. No primeiro, você tem um botão para a bomba e um para o Vasara, que é tipo um ataque de espada fortão e que só pode ser usado com a barra de energia cheia. O segundo game combina ambos em um único super ataque, o que possibilita brincar com mais frequência com eles.
O Vasara 2 também tem duas formas de jogo, uma com seis estágios e outra com 12.
Além da opção da tela, que você escolhe antes de abrir um dos jogos, tem a tela acima em que você pode modificar o funcionamento do arcade. Em especial, é possível aumentar ou diminuir a dificuldade, vidas e estoque de especiais.
CONTINUES SEMI-ILIMITADOS
Os arcades de Vasara presentes aqui funcionam como os fliperamas originais, com a possibilidade de brincar em free play ou colocando fichas virtuais. Como é comum em arcades, usar um continue coloca o jogador de volta na ação onde ele morreu.
Infelizmente, há uma exceção. Ao chegar na sexta fase de qualquer modalidade (mesmo no modo 12 fases do Vasara 2), você ainda pode usar continues, mas eles vão te colocar de volta no início da fase. O problema é que Vasara é um bullet hell, sendo extremamente comum a tela ficar cheia de balas inimigas. Você sabe, arcades não eram feitos para apresentar uma jogabilidade equilibrada, mas para comer fichas. Isso não é um problema com vidas infinitas. Eu perdia dúzias de vidas em cada uma das fases anteriores, e ainda me divertia muito. Porém, ter que passar por uma delas com no máximo cinco tentativas para mim parece um feito sobre-humano. Até mesmo no easy.
Já vi vários fliperamas antigos com limitações como esta. Às vezes mesmo usando fichas, o jogo não deixa continuar na última fase, então acredito que esta é a forma que Vasara foi criado. Consultei o pessoal da QUByte sobre isso, e fui informado que manter o estilo de jogo idêntico (no qual isso se inclui) era uma exigência da Visco. Então infelizmente não tem nada que eles possam fazer sobre isso e não deve rolar um patch que altere este funcionamento.
É uma pena, pois não dá para negar o gosto amargo que fica na boca ao você chegar ao que parece ser a última fase, e daí ficar travado em um chefe intransponível. Simplesmente não é divertido.
Outra opção que seria bacana ter é não perder os upgrades quando morre. Isso era algo comum nos shoot’em ups antigos e já não era divertido naquela época. Hoje simplesmente não faz sentido.
TIMELESS
Dependendo do tipo de jogador que você seja, o modo Timeless pode ser o prato principal ou apenas um bônus. A maioria dos troféus do jogo estão neste modo, então acredito que é aqui que a QUByte gostaria que você passasse mais tempo.
O modo Timeless vem com gráficos totalmente refeitos em 3D, widescreen real, com o jogo ocupando a tela inteira, e possibilidade de jogar em até quatro jogadores (os arcades suportam dois).
Ao contrário dos arcades, aqui inimigos e chefes popam aleatoriamente, mas a coisa ainda é dividida em fases. Nesta modalidade, você tem um número limitado de vidas e não pode continuar. Morreu, é game over.
Talvez para compensar isso, os ataques inimigos são bem mais suaves. Com um pouco de habilidade e atenção, aqui sempre parece possível desviar das balas. Por outro lado, a inexistência de continues tira a sustância deste modo, pois ele sempre é resumido a partidas curtas, de poucos minutos.
O trabalho feito para este modo timeless é impressionante, uma vez que é basicamente um remake total do visual original. Os chefes aqui ganham até introduções pintudas, em que você tem alguns segundos para admirar suas naves em 3D.
Eu não tenho ideia se este modo tem um final ou se continua infinitamente como o nome sugere. Acredito ser um daqueles desafios de “quão longe você consegue chegar?”. Depois de algumas dezenas de tentativas, eu consegui chegar até o chefe do quarto estágio, e senti que fui longe pra burro considerando que nos arcades eu nem passo da primeira fase sem usar continue.
PELA PRESERVAÇÃO DA HISTÓRIA DOS GAMES
Vasara Collection é um excelente trabalho de preservação, trazendo um jogo bacana e relativamente desconhecido para toda uma nova geração. Ele tem um único problema, mas é um problema gravíssimo (o funcionamento dos continues na sexta fase) e aparentemente sem possibilidade de solução. Por outro lado, isso não é um problema desta coleção, mas do design original, que visava justamente impedir que as pessoas terminassem o jogo e continuassem colocando fichas infinitamente. Obviamente, isso não faz sentido nenhum para quem vai jogar no sofá, o que me parece um bom argumento para ser usado pelo pessoal da QUByte. Seria legal se a Visco deixasse a QUByte dar um jeito nisso, mas convenhamos que os brasileiros já fizeram aqui um trabalho superior a muitos outros relançamentos.
CURIOSIDADE:
Uma das coisas mais peculiares de jogar antes do lançamento é conseguir ficar em posições altas nas leaderboards, algo quase impossível depois do lançamento. No caso de Vasara Collection, meu nome foi o primeiro a ser registrado na leaderboard do PS4. Eu até tirei uma foto para imortalizar o momento, que não deve durar muito.