Quando eu era adolescente, considerava a Capcom a melhor desenvolvedora de games que existia. Beat’em Up era meu gênero favorito e ninguém fazia tantos jogos nessa linha com tanta qualidade quanto a Capcom. Por isso, é com imenso prazer que hoje publico minha análise de Capcom Beat’em Up Bundle, que traz todos os beat’em ups de fliperama originais da marca favorita da minha adolescência.
HISTÓRIA EM FORMA DE BEAT’EM UPS
Por todos os originais, entenda que não são todos os jogos do gênero que a Capcom lançou. Se não me falha a memória, ficaram de fora Dynasty Wars (1989), The Punisher (1993), Aliens vs. Predator (1994), os dois Dungeons & Dragons (1993 e 1996, ambos saíram em 2013 para a geração passada de consoles) e, claro, aquele que todo mundo pede há três décadas e que nunca foi relançado, Cadillacs and Dinosaurs (1992).
Todos estes têm algo em comum: são jogos licenciados, ou seja, baseados em marcas das quais a Capcom não é dona e, portanto, são bem mais difíceis de relançar, pois exigem novos acordos entre as empresas. Eu entendo os motivos pelos quais estes jogos não foram incluídos, mas se esta fosse uma coletânea realmente completa, teria tudo para levar o Selo Delfiano Supremo.
Mas o que temos aqui? Todo o resto! Final Fight (1989), The King of Dragons (1991), Captain Commando (1991), Knights of the Round (1992), Warriors of Fate (1992), Armored Warriors (1994) e Battle Circuit (1997). Pelo menos dois destes jogos estão entre os meus preferidos de todos os tempos, e na minha adolescência, eu sonhava com o dia que poderia tê-los em casa. Você deve se lembrar que alguns saíram para Super Nintendo, mas eu tinha só um Mega Drive. Curiosamente, o único que saiu em cartucho para o console da Sega foi o The Punisher, em uma versão bastante inferior à original.
Pois veja só, demorou quase 30 anos, mas agora eu tenho estes fliperamas em casa. Sonhos realmente se realizam!
Falemos um pouco de cada um dos jogos.
FINAL FIGHT (1989): UM DOS JOGOS MAIS IMPORTANTES DA HISTÓRIA
Double Dragon (de 1987) foi o jogo que iniciou a era dourada dos beat’em ups. Acredito que não é exagero dizer que Final Fight foi o que pegou a fórmula e a aperfeiçoou, tornando-se, portanto, o benchmark pelo qual os melhores jogos do gênero seriam comparados.
Este já foi relançado várias vezes em diversos consoles e coleções e, dada sua importância, você provavelmente já o jogou. Este foi também o único jogo desta coleção que eu tive em casa na minha adolescência, pois ele recebeu uma versão para Sega-CD, que era inclusive superior à arcade presente aqui.
O que era diferente? Tinha todas as fases e personagens jogáveis (a de Super Nintendo tinha cortado um de cada) e o visual era igual ao do fliper. Porém, as músicas foram todas regravadas por uma banda. Mesmas composições, porém em versões com instrumentos reais (algumas até com vocais). Era legal pra caramba! E a versão em CD deve estar entre os jogos que mais joguei na vida. É uma pena que ela provavelmente nunca mais será relançada, mesmo sendo superior à arcade.
Vale uma curiosidade: assim como Devil May Cry começou como um novo Resident Evil, Final Fight era para ser uma sequência para Street Fighter. Pois é, aquele cuja eventual sequência se tornaria um dos maiores e mais famosos jogos da história.
THE KING OF DRAGONS (1991): E AGORA ALGO TOTALMENTE DIFERENTE
Este era um do qual eu, sinceramente, não me lembrava até jogar. Pudera, é também o mais diferente da coleção. Se os beat’em ups da Capcom focavam em combos, este funcionava com um ataque por vez. Ao atacar um inimigo, ele se afastava e ficava invencível por um curto tempinho. Talvez você se lembre deste tipo de funcionamento por ser o mesmo do Turtles 2, popular port do ainda mais popular fliperama da Konami das Tartarugas Ninja. Isso me causou algum estranhamento e uma certa repulsa inicial, mas depois que eu me acostumei, passei a me divertir bastante com ele.
Esta jogabilidade diferente permite também que alguns de seus personagens jogáveis sejam focados em ataques à distância, tornando-se uma entrada bastante única no gênero. Os personagens também tinham equipamentos e um nível geral, que iam melhorando conforme você progredia. Nada tão elaborado quanto o que a Capcom viria a fazer em Dungeons & Dragons, mas é o mais elaborado desta coleção, ainda que não seja o único a trazer level ups.
No fim das contas, é uma inclusão bacana, um jogo que mostra a Capcom saindo da sua zona de conforto antes mesmo desta zona estar estabelecida.
CAPTAIN COMMANDO (1991): EU SOU O MELHOR NO QUE FAÇO, E O QUE FAÇO NÃO É BONITO
Aqui a Capcom já entrava totalmente em sua zona de conforto. Quando você pensa em um beat’em up da empresa, o que vem à mente é bastante parecido com este jogo. Também pudera, Captain Commando (sacou o negrito?) era usado como um mascote pela Capcom, então nada mais justo do que seu primeiro (e até o momento o único) jogo fosse bem representativo do que a empresa fazia de melhor.
Cá entre nós, na época eu considerava este um tanto inferior aos melhores do gênero, mas não fiquei com esta impressão agora. Captain Commando é um jogo divertido e visualmente bem legal. Aliás, ele se destaca visualmente por lançar mão de uma estética cartoon, que traz mais exagero e bom humor do que costumávamos ver nos jogos da companhia.
Aliás, sempre achei curioso que um jogo chamado de Captain Commando tivesse no bebê, e não no titular, seu personagem mais lembrado.
KNIGHTS OF THE ROUND (1992): O MEU PREFERIDO
Este jogo saiu para Super Nintendo e acredito que eu devo ter pago o valor da fitinha umas cinco vezes em fichas, de tanto que o joguei no fliperama, mas nunca o tive em casa até agora. Baseado, claro, na lenda do Rei Arthur e dos Cavaleiros da Távola Redonda, Knights of the Round é provavelmente o jogo mais bonito desta coleção.
Ele tem uma jogabilidade mais simples do que Captain Commando. Não dá para correr nem para agarrar, por exemplo. Ainda assim, ele é tão gostoso de jogar que essas coisas nem fazem falta. Como uma boa música de punk rock, Knights of the Round mostra como um básico bem feito pode ser tão bom ou melhor do que algo mais elaborado.
Como mecânica única, ele tem um level up baseado em pontos, que torna o visual do personagem cada vez mais parrudo. Não faz muita diferença no gameplay, mas é bem legal ver o Lancelot ficando cada vez mais perigoso.
Eu sinceramente adoro Knights of the Round. Quando a Capcom anunciou esta coleção, a primeira coisa que fiz foi checar se este estava na lista. Estava. E isso me torna um panda feliz. Pode não ser o mais famoso ou o mais importante daqui, mas é o que eu mais gosto e, como tal, o recomendo com todas as forças.
WARRIORS OF FATE (1992): ALGUMAS COISAS NÃO FAZEM SENTIDO
Esta é a inclusão mais curiosa. De todos os jogos aqui presentes, este é o único licenciado, tendo sido baseado no mangá Tenchi wo Kurau (ou 天地を喰らう para os puristas). Ele é também uma sequência de Dynasty Wars, que você deve se lembrar do início deste texto como um dos beat’em ups da Capcom que ficou de fora desta coleção. Isso não faz sentido, né? Se a empresa conseguiu o direito do mangá para o relançamento, por que não incluir os dois jogos que fez baseado nele?
Este é mais um que eu me lembrava como sendo um tanto inferior aos melhores da Capcom, mas ainda gostei de jogá-lo novamente hoje. Trata-se do segundo jogo mais complexo desta coletânea (o troféu vai para Battle Circuit), com combos, golpes especiais e até combate a cavalo.
É um jogo bacana e uma inclusão digna, mas não deve ser um dos que mais vou jogar.
ARMORED WARRIORS (1994): CÍRCULO DE FOGO, O JOGO
Este título e o próximo nunca foram relançados, sendo até o momento exclusivos de arcades. Admito que eu nunca tinha ouvido falar deles, então eles tiveram um sabor especial para mim. É como se eu abrisse uma máquina do tempo e, de repente, tivesse dois jogos novos da época clássica da Capcom que eu nunca tinha jogado antes.
E, meu amiguinho, como eu me empolguei quando comecei a jogar Armored Warriors. Trata-se de um jogo em que tanto você quanto seus inimigos controlam robôs gigantes. Não sei você, mas eu diria que não há robôs gigantes em quantidade suficiente na cultura pop!
Por outro lado, ele nem parece um jogo da Capcom. Os beat’em ups dela sempre foram mais técnicos, mais lentos. Este segue aquele esquema mais rápido e bagunçado. Também é legal, mas é daqueles casos que sempre tem tanto inimigo e tanta explosão na tela que é difícil saber onde está o seu personagem.
Ele traz uma mecânica que nunca vi em outro jogo do gênero: os robôs são modificáveis. Sabe como você sempre pega armas do chão nestes jogos? Aqui você pega peças que mudam completamente o seu robô. São braços e pernas que afetam a forma como ele ataca e se movimenta. Isso faz com que o personagem escolhido seja apenas um template inicial, pois no final das contas, todo mundo pode ter os mesmos ataques ao longo do jogo, bastando pegar as mesmas coisas.
O lado ruim é que suas peças originais somem quando você pega outra, então a única forma de voltar para o original é morrendo. Isso vira um problema pelo fato de a ação ser frenética e confusa, tornando comum pegar uma peça alternativa sem querer, por literalmente não ter visto ela no chão.
BATTLE CIRCUIT (1997): O FIM DE UMA ERA
Este foi o último fliperama do gênero criado pela Capcom, e ele nunca foi distribuído fora do Japão, então deve ser novidade para muita gente. Assim como Captain Commando, ele traz um visual cartunesco e um clima mais fanfarrão. Entre os personagens jogáveis, por exemplo, você tem uma menina que cavalga um avestruz rosa e uma planta.
Este é também o mais complexo. Durante as fases, você ganha dinheiro, que pode usar para comprar novos golpes entre as missões. E cada um dos personagens tem movimentos totalmente diferentes. Assim, se você gosta de alternar entre eles ao longo da campanha, vai ficar sem saber seus movimentos (o golpe 1 adquirido para o personagem X se mantém comprado como o golpe 1 do personagem Y, mas o comando para ativá-lo é diferente para cada herói). Há uma forma de checar os golpes básicos, mas a Capcom não incluiu estes upgrades no how to play.
Apesar de ser o mais elaborado, Battle Circuit também foi o que eu menos gostei. Ele tem pouco de beat’em up propriamente dito, é quase um boss rush. Com isso, quero dizer que há muitos chefes e pouco tempo de fase. Pretendo jogá-lo mais vezes para dominar melhor cada personagem, mas acho difícil que ele se torne um dos meu preferidos por causa do excesso de chefes.
CAPCOM BEAT’EM UP BUNDLE
De conteúdo extra, há muito pouco. O que temos é o básico. É possível jogar qualquer título online, mas até o momento de fechamento desta resenha, o lag torna isso praticamente impossível no Xbox One, onde testei. Há conquistas, que envolvem basicamente terminar cada um dos jogos. E tem a possibilidade de salvar um único ponto de cada jogo (o que não é especialmente necessário, já que há “fichas infinitas” e eles duram cerca de 60 minutos cada). Por fim, há uma galeria de imagens, que já é desbloqueada desde o início.
Poderia haver um capricho maior neste aspecto. A versão de Final Fight que saiu para a geração passada de consoles com bem menos fanfarra, por exemplo, incluía uma trilha sonora remixada que, se não era tão legal quanto a de Sega CD, ainda era um upgrade. Poderiam tê-la incluído aqui, bem como colocado outros mimos equivalentes para os outros títulos. Filtros de imagem, por exemplo, é algo que costuma ter em relançamentos deste tipo e que não há aqui. Não tem nem a possibilidade de alargar a imagem para o formato widescreen.
Dito isso, eu me diverti com Capcom Beat’em Up Bundle como não me divertia há tempos. Apesar da ausência de conteúdo extra, para mim é um sonho realizado poder jogar estes jogos em casa quantas vezes quiser, e pretendo jogar meus preferidos muitas vezes ainda.
Não foi desta vez que tivemos Cadillacs and Dinosaurs, mas esta é a melhor forma que temos hoje de relembrar a época dourada dos fliperamas. Eu tenho plena consciência de que não é uma coleção que vai agradar a todos. As pessoas em geral consideram que beat’em up é um gênero que não envelheceu bem. Se você concorda com isso e não tem apego emocional a estes títulos, esta coletânea não foi feita para você. Mas, por Odin, ela foi muito feita para mim!