A fabulosa série Need For Speed já faz parte da história dos videogames. Seu primeiro jogo, lançado na metade dos anos 90, tinha um grande diferencial: possibilitar ao jogador controlar carros nos quais a maioria de nós não terá nem oportunidade de colocar os olhos. Para você ter uma idéia, alguns dos primeiros carros que você poderia escolher eram do nível de um Jaguar. Isso, aliado aos ótimos gráficos e trilha sonora fizeram a fama do game. Particularmente, um dos motivos pelos quais gostei desse jogo, embora fosse um jogo de corrida (na época não gostava de jogos desse estilo) foi o fato de as corridas não terem aquela pentelhação de obrigar você a dar inúmeras voltas em torno de um circuito. A maior parte delas, se não todas (ok, eu não me lembro exatamente) era uma corrida com um destino. Chegou lá, acabou, não precisava chegar lá 4 ou 5 vezes. Não sei dizer se foi o primeiro jogo do estilo a seguir essa linha, mas ao menos foi o primeiro que conheci.
Depois desse primeiro jogo, me afastei um pouco dos videogames (como você já deve ter percebido, eu já estou de volta) e parei de acompanhar as novas investidas da série. Até que caiu nas minhas mãos o excepcional, grandioso e tremendão Need For Speed: Hot Pursuit 2 que tem até hoje o troféu Carlíneo de melhor jogo de corrida. Gráficos fenomenais, trilha sonora que tinha até Rush, e a possibilidade de dirigir carrões animalescos fizeram esse jogo invadir meu coração. E melhor, o jogador tinha uma opção de carros diferentes para escolher em cada corrida, tornando o jogo muito mais simples e mais divertido.
Em seguida ao Hot Pursuit, veio o primeiro exemplar do NFS: Underground, que simplesmente acabou com tudo que o jogo anterior tinha de bom. Saíram os carrões inalcaçáveis e entraram carros mais populares como o Honda Civic, por exemplo. Ok, para nós, pobres mortais que andam de ônibus ou que dirigem carros como Corsa ou Palio, um Honda Civic é, sem dúvida, um carrão, mas é um sacrilégio compará-lo a um Jaguar ou a uma Ferrari. Agora você comprava um carro e ficava com ele por um tempão, até poder bancar outro (mais ou menos como a maior parte dos jogos de corridas tradicionais). E ainda tinha aquelas coisas de ficar enfeitando o carro com neon e vinil, o que para aqueles entre nós com “necessidade por velocidade”, não por enfeites, era uma tremenda pentelhação. Além disso, todas as corridas eram noturnas, tornando o jogo, como sempre, muito escuro (e sem controle de Gamma nas opções), satisfazendo as manias dos designers por colocar dificuldade no jogo impedindo que você veja o que acontece.
A trilha trazia alguns Raps que tocavam nos menus e alguns Rocks para lá de barulhentos (não me refiro a peso, mas a barulho mesmo), a maioria de artistas completamente desconhecidos. As músicas parecem ter dois únicos pontos em comum: serem ruins e terem letras que falam sobre carros e velocidades (esse último provavelmente foi o critério de escolha da EA). E ainda tinha trânsito. Sim, trânsito. Carrinhos que não faziam parte da corrida e que estavam lá simplesmente para atrapalhar. Para coroar o assassinato, boa parte das provas eram circuitos com mais de seis voltas, o que ficava extremamente sacal depois de um tempo, até porque a falta de cenários do jogo dava ao jogador a sensação de estar correndo sempre na mesma pista. Não preciso nem citar a alegria que um jogador sente quando fica dando voltas durante uns vinte minutos, mantendo a primeira posição durante todo esse tempo, mas então, na reta final, um carrinho atravessa a pista (sim, ATRAVESSA) como quem não quer nada, gerando um inevitável acidente e fazendo com que o paciente jogador chegue em último.
Pois pelos parágrafos acima, você pode imaginar minha decepção quando fiquei sabendo que o representante da série para esse ano seria o segundo exemplar do esquema Underground. Quando li a primeira resenha sobre o jogo, então, quase me desesperei ao saber que, por algum motivo bizarro e, com certeza, sem nenhum sentido, a EA decidiu obrigar os jogadores a dirigir ATÉ as corridas e lojas. Ou seja, não só era necessário ficar “enfeitando” o carro, como você também tinha que dirigir até as lojas para fazê-lo. Na boa, se esse tipo de coisa já era o ponto baixo de jogos como GTA ou o detonante Mafia fica completamente sem sentido em um jogo que deveria ser única e simplesmente um jogo de corrida.
Dito isto, fica claro o motivo de eu estar com uma pulga atrás da orelha durante a instalação do bicho. Para a minha surpresa, contudo, esta seqüência superou seu antecessor (o Underground, não o Hot Pursuit 2) em quase todos os aspectos. Sim, os defeitos ainda estão lá: falta de carros legais (o melhor carro do jogo é um Lancer Evolution que, convenhamos, não é nenhum Porsche), necessidade de comprar e enfeitar os carros, corridas noturnas e sua decorrente escuridão, trânsito e ainda a necessidade de dirigir pela cidade e encontrar as lojas. Sim, não basta ter que dirigir até as lojas, mas você também precisa encontrá-las.
Contudo, por incrível que pareça, não é tão chato dirigir de uma corrida à outra. Claro, seria melhor se existisse a opção de ir direto para as corridas, mas realmente não é tão chato quanto parece. O problema é que isso acaba fazendo com que você escolha as corridas não pelas que você está a fim de correr, mas pela proximidade delas. O que é muito chato é ficar dirigindo para as lojas (e são lojas de vários tipos). E, ao trocar de carro, você perde todos os upgrades que fez no carro anterior, ou seja, além de ter que ter uma boa grana em estoque, precisa dirigir para todas as lojas e comprar tudo de novo. Você consegue imaginar alguma coisa mais chata que isso? Não, o show do Robert Fripp não vale, agora estamos falando de games.
A trilha sonora está bem melhor e muito menos barulhenta. Nada que chegue à qualidade de um Rush, mas temos algumas bandas um pouco mais conhecidas do que antes, como Helmet e Queens of the Stone Age, por exemplo. Não posso deixar de citar também a inusitada parceria entre The Doors e o rapper Snoopy Dogg em Riders on the Storm. Ok, na verdade não é uma parceria. Snoop Dogg apenas canta em cima de um sampler da música, mantendo o vocal de Jim Morrison em alguns momentos. Até que ficou legal, mas para muita gente, isso sem dúvida será considerado um sacrilégio, já que The Doors faz parte da turminha dos intocáveis, junto com Beatles, Jimi Hendrix e alguns (poucos) outros. Assim como no jogo anterior, você pode escolher quais músicas deseja tocar no menu e na corrida e quais você não quer ouvir de jeito nenhum, o que é ótimo. Para falar a verdade, a ausência dessa opção realmente era um dos poucos defeitos do Hot Pursuit 2.
Foram mantidos os tipos de corridas do Underground 1 (única melhora deste em relação ao Hot Pursuit 2) e acrescentados alguns. Dos já conhecidos, saiu o Knockout e foram mantidos os já conhecidos Sprint – corrida de um ponto a outro, o mais legal de todos, Circuit – corrida com várias voltas, Drag – corrida em uma linha quase reta, onde você vai desviando dos obstáculos e mudando de marchas, mesmo que tenha escolhido a opção de marcha automática. Bem legal também. E, por fim, Drift – prova para ver quem derrapa mais batendo menos. Pode ser tanto dentro de um circuito fechado como uma ainda mais legal, aonde você vai descendo uma montanha na contra mão, enquanto derrapa, satisfazendo os mais negros instintos de pessoas que têm um parafuso solto, como eu. Também foram mantidos os tradicionais Time Trials, aqui designados como Special Events, onde você tem que dirigir de um ponto a outro no tempo determinado.
Das novidades, não temos nada demais. Os novos modos são Street X – um circuito tradicional e cheio de curvas onde você passa mais tempo freiando do que acelerando, ou seja, é um saco, e URL – um circuito normal com corridas cheias de voltas e muitas vezes torneios com duas ou três corridas onde quem tiver mais pontos ganha, exatamente como era nos Tournaments dos jogos anteriores. A maior novidade mesmo é uma forma de corrida completamente opcional: Outrun. Neste modo, você pode desafiar qualquer corredor que esteja passeando pela cidade. Aí seu objetivo é ultrapassá-lo e fazê-lo perder você de vista, tendo a cidade inteira para correr, sem nenhum caminho específico (desde que você esteja na liderança). Se você perder, tem que pagar. Se ganhar, o rival paga para você. Na teoria parece bem interessante mas quando você joga é bem sem graça, pois consiste em apenas ficar correndo pela cidade sem destino, torcendo para o cara ficar para trás. É mais ou menos como fugir dos policiais em Hot Pursuit 2.
Conforme você progride na sua carreira, vai recebendo convites de patrocinadores. Realmente não existe diferença entre eles, além das especificadas no contrato que, mesmo assim, são muito parecidos. A diferença é quanto eles vão pagar e as corridas que eles exigem que você corra. Ou seja, se você tem gosto parecido com o meu, fuja dos contratos que obrigam o jogador a correr em três Street X.
Uma vantagem indiscutível sobre seus antecessores é que, pela primeira vez na série, as pistas não estão absurdamente repetitivas. Além disso, como você sempre tem várias corridas para escolher e não é obrigado a correr em todas (excetos nas URLs, essas não tem jeito), você pode jogar apenas nos estilos que gostar mais, evitando as Street X da vida.
Esse é um jogo com uma dificuldade realmente variável. Três opções são oferecidas (Easy, Normal e Hard) e podem ser modificadas a qualquer momento entre as corridas. A diferença entre elas é brutal. Para você ter uma idéia, no Easy eu conseguia chegar sempre com uma vantagem superior a 20 segundos em relação ao segundo colocado. Já no Normal, a dificuldade varia entre o fácil e o difícil, dependendo da corrida. E no Hard, é simplesmente impossível (ei, eu não sou nenhum Bruno Sanchez). Sinceramente, mais opções fazem falta. Joguei a maior parte do jogo no Normal, mas passei boa parte do tempo desejando que determinada corrida fosse um pouco mais fácil ou mais difícil sem, contudo, chegar aos extremos que o jogo oferece.
Talvez até por causa desses extremos, NFS: Underground 2 é o jogo mais fácil da série e o primeiro no qual eu consegui chegar no final (Iupi!) pois, ao “encalhar” em uma corrida, você pode simplesmente mudar a dificuldade para o fácil e vencer sem nenhuma dificuldade. O jogo também é bem curto. Terminei-o em cerca de uma semana, jogando-o apenas no meu tempo livre, o que foi bem rápido para os padrões atuais.
Como você não é obrigado a correr em todas as corridas que o jogo oferece, meu jogo terminou quando eu tinha completado apenas uns 65% das suas corridas, o que me surpreendeu bastante. Depois de terminar o jogo, você pode ir para a garagem e escolher correr novamente em qualquer prova do jogo, mesmo nas que você ainda não tenha corrido, possibilitando que você atinja logo os cobiçados 100%. Creio que completei esses 35% que faltavam em apenas uns dois dias, o que mostra quão curto o jogo é, uma vez que você não é mais obrigado a ficar dirigindo de uma corrida a outra ou incrementando o carro nas lojas.
NFS: Underground 2 é um jogo legal. Traz a franquia Need For Speed de volta do abismo no qual seu antecessor a colocou, mas ainda assim a série é capaz de mais. Se tiver que escolher um, ainda fico com o Hot Pursuit 2. E que 2005 nos traga um NFS digno de ganhar mais um espaço nos nossos corações.