Já falei algumas vezes por aqui como eu ando interessado não apenas no conteúdo dos games, mas também em sua forma e técnica. Este relançamento chamado Tomb Raider I-III Remastered me dá a oportunidade de ver estes jogos de forma que eu simplesmente me recusava a ver em seu lançamento original.
Eu era muito contra gráficos poligonais quando eles começaram a dominar os games. Eu via Turtles In Time e achava lindo. Daí os jogos da suposta próxima geração, como Tomb Raider, eram quadrados e feios. Eu não conseguia ver a evolução absurda de um para o outro, e todas as coisas que um jogo em 3D proporcionava além do sidescroller tradicional. Hoje é claríssimo para mim que para que os games dessem um passo à frente, foi necessário dar um passo para trás. E saber disso permite ver jogos dessa época com novos olhos. E Tomb Raider, de 1996, foi um dos primeiros jogos de exploração em 3D, tendo saído poucos meses depois de Super Mario 64.
É incrível para minha mente adulta pensar que eu olhava para jogos como este e para os de Super Nintendo, e achava apenas que os de PS1 eram mais feios, sem ver tudo que eles proporcionavam. Jogando o primeiro Tomb Raider hoje, em 2024, eu fico simplesmente embasbacado com o que os desenvolvedores conseguiram fazer aqui. Tem um monte de problemas além dos gráficos. Os controles são ruins, a câmera é irritante. Afinal, é tudo tão novo que é como um nenê aprendendo a andar. Os designers estavam pensando em como transformar suas ambiciosas ideias em uma realidade que ainda não existia. Então olhe além dessas coisas e você perceberá que são dores de crescimento, em um jogo que está se esforçando para ir além do que era possível na época.
TOMB RAIDER DE 1996 EM 2024
Hoje estamos habituados com jogos de exploração em 3D, bem como aventuras arqueológicas inspiradas por Indiana Jones. Porém, Tomb Raider é uma tremenda evolução para enormes aventuras interativas, que antes respondiam por franquias como Zelda e Metroid. A sensação de imersão aqui, de estar perdido em meio a ruínas esquecidas, é sensacional, especialmente para a época.
Tomb Raider, o primeiro, traz um estilo de level design que víamos na época em jogos de primeira pessoa, como Doom e Quake. São labirintos que precisam ser explorados. Portas trancadas que são abertas com chaves. É mais ou menos o que Uncharted faria muito tempo depois, mas de forma muito mais aberta e realista. E é engraçado que escrevo isso bem quando a polêmica da tinta amarela está renascendo nas redes sociais.
TINTA AMARELA
Eu não tenho nada contra a famosa tinta amarela ou truquinhos para guiar o jogador. Mas é óbvio que se você estivesse em uma ruína, não teria um caminho perfeitamente estabelecido. É difícil encontrar tesouros esquecidos na vida real, e Tomb Raider simula isso muito bem. Em suas fases, você precisa procurar lugares em que dá para escalar e torcer para eles levarem a um avanço.
Como simulação de aventura e arqueologia, isso é demais. Como game, não dá para negar que pode encher o saco. Eu não acho legal ter que sair do jogo para procurar vídeos de guia na internet, e em 1996 isso deixava o game extremamente obtuso. Seria bacana se este relançamento tivesse implementado guias opcionais no próprio jogo, como Quake 2 fez. Mas aqui temos o início deste tipo de level design, e os criadores até colocam coisas para guiar, mas são bem mais sutis do que se tornariam no futuro.
Uma coisa que eu gosto muito é que, apesar de a exploração ser extremamente complexa, as fases são autocontidas. Considero que isso deixa mais gostoso de jogar. Quando você faz uma estátua se mexer ou pega uma chave, provavelmente vai lembrar da área afetada, pois passou ali poucos minutos antes. Não é como num metroidvania moderno, em que você pega uma chave que abre uma porta pela qual você passou cinco, seis horas antes. Todo jogo com exploração nessa linha atualmente opta por um mundo contínuo, e eu vejo muita beleza neste nível de exploração, mas com fases autocontidas. E já que falamos nos guias opcionais que poderiam estar aqui, permita-me falar sobre a coletânea em si.
TOMB RAIDER I-III REMASTERED
Tomb Raider I-III Remastered é óbvio no que inclui. Temos aqui Tomb Raider, Tomb Raider II e Tomb Raider III, mais um DLC adicional de cada um dos jogos. Isso é o óbvio, então agora vamos nos aprofundar no que você realmente quer saber. A começar pelos gráficos.
À primeira vista, o jogo parece exatamente igual ao que você se lembra. O visual é quadradão e bem retrô, deixando claro que foi lançado em 1996. É imediatamente reconhecível para qualquer pessoa que é o primeiro Tomb Raider. Daí você aperta Start e a imagem acima vira isso aqui.
Mostrei os gráficos novos para a patroa e ela imediatamente reconheceu Tomb Raider. Mudei para o visual antigo e disse “na verdade ele era assim”, e ela simplesmente não acreditou. Achei sinceramente genial que o visual foi recriado de tal forma que ele é exatamente como a gente se lembra, mas ao mesmo tempo é extremamente mais moderno.
REMASTERIZANDO AS PLANTAS
A remasterização foi muito além de aumentar a resolução. Na verdade, a resolução está aumentada até no modo clássico. No moderno, no entanto, a iluminação, os volumes e até explosões e efeitos de sangue são totalmente novos. E mesmo assim o jogo parece totalmente retrô. Você não se sente jogando um remake que mantém o level design mas refaz tudo, como Spyro, por exemplo. Se sente jogando Tomb Raider como ele sempre foi, mas ele nunca foi assim.
Porém, nem tudo são rosas nesta remasterização. Tem horas que o jogo é bem mais claro no caminho a ser seguido na versão antiga. Em determinados casos, itens essenciais parecem ser visíveis apenas na versão antiga.
Isso é uma grande falha, que gostaria de ver melhorado em futuros updates. Outro problema é que nos gráficos antigos a performance é muito ruim. Não sei se isso é intencional, para a gente lembrar como o jogo era na época. Mas o fato é que a taxa de quadros é tão inferior no modo antigo que deixa incômodo fazer coisas como girar a câmera. No modo moderno, Tomb Raider I-III Remastered roda lisinho que é uma delícia, e gostaria que o modo clássico rodasse assim também. Afinal, quando a gente joga algo antigo não tem interesse em ver como rodava num computador abaixo dos requisitos mínimos, mas sim ver o jogo rodando em todo seu potencial.
MAIS DA COLETÂNEA TOMB RAIDER I-III REMASTERED
Além dos gráficos altamente modernizados, uma novidade que também considero essencial é a modernização dos controles. O modo tanque original está disponível, mas convenhamos que não dá mais para jogar daquele jeito. Infelizmente, os games não foram totalmente adaptados para o novo estilo. Há algumas habilidades que precisam de funções que só existem no tanque, como andar para trás. Pular para uma plataforma distante, por exemplo, exige dar um passo para trás e correr segurando o botão de pulo. Isso é impossível agora, e o jeito é apelar para gambiarras, como se pendurar na ponta contrária e subir de volta.
Os comandos também foram recriados e modificados, mas o jogo não avisa disso. Por exemplo, no tutorial, Lara ensina que para agarrar no meio do pulo, você precisa segurar o botão “action” durante o pulo. Porém, o botão “action“, que originalmente fica mapeado para o Y, não funciona. Apenas no controle tanque esta função funciona.
Achei que o jogo estava quebrado, e só depois de tentar de tudo vi que a função de segurar, que anteriormente era usada com o botão “action“, agora é ativada pelo botão de atirar. O botão “action” antes servia para pegar itens e segurar beiradas. Agora ele foi dividido. O action pega coisas, mas o de tiro serve para escalar. Não é uma mudança ruim para jogar, mas deveriam ter no mínimo colocado uma mensagem no tutorial.
MORDOMIAS MODERNAS
Uma coisa que eu estava um pouco inseguro é em relação aos saves. Nas versões de console, você precisava pagar com itens e só podia salvar em pontos específicos, estilo Resident Evil. Isso fez com que minha primeira experiência com o jogo, no Saturn, parecesse totalmente impossível. Só depois quando fui tentar jogar no PC, com saves à vontade, pude de fato avançar.
Felizmente, nesta coletânea você pode salvar a qualquer momento quantas vezes quiser. Infelizmente, não existe um botão ou comando para “quick save“. Você precisa abrir o menu, navegar para as opções, entrar na tela de carregamento, e daí escolher salvar. Algo que deveria ser imediato demora alguns segundos, o que não parece muito, mas deixa o jogo menos divertido. Especialmente porque você fatalmente vai escolher carregar ao tentar salvar, e daí perder progresso. Também incomoda que o “select” abre o menu, e o “start” modifica os gráficos, quando deveria ser o contrário.
De qualquer forma, a coletânea de Tomb Raider I-III Remastered não é perfeita, mas é uma excelente forma de jogar games que hoje em dia são difíceis de engolir em sua forma original. Não é perfeito, mas é um ótimo trabalho. E os jogos, em si, estão entre as aventuras mais históricas da história dos games. E não me refiro à temática.