Vivemos em uma cultura de iterações. Especialmente nos games, e especialmente na Ubisoft, a segunda parte de um jogo costuma ser onde a série realmente atinge seu potencial. Vide Assassin’s CreedWatch DogsThe Crew 2, no entanto, não se contenta com simplesmente atingir seu potencial. Temos aqui uma sequência que, sim, expande no conceito do primeiro jogo, mas ao fazê-lo acaba se tornando o jogo de corrida mais versátil de que se tem notícia.

SE TEM MOTOR, DÁ PARA APOSTAR CORRIDA

Esta é a filosofia de The Crew 2. Enquanto a maioria dos jogos de corrida foca em carros ou motos, The Crew 2 foca em simplesmente tudo. Quer correr com barcos? Aviões? Monster Trucks? Pode apostar que vai ter uma categoria aqui. E ele não foca apenas nas categorias mais exóticas. Há os tradicionais dragdrift, corrida de rua, off-road, circuitos profissionais. A variedade é deveras impressionante.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Assim como minha habilidade para estacionar barcos.

As mais impressionantes envolvem uma combinação de várias categorias. Você pode estar correndo com um carro, daí passa por uma rampa e cai na água, pilotando um barco. Daí passa por outra rampa e cai em uma estrada de terra controlando uma moto. É muito legal, e é apenas uma pena que haja tão poucos destes eventos híbridos.

Nem todas as categorias são totalmente aproveitadas. Aviões, por exemplo, são limitados a fazer acrobacias ou a time trials. Até há uma categoria chamada Air Race, mas ao contrário do título, não são corridas, mas time trials. Outras, como os Monster Trucks, até têm uma ou outra corrida, mas são focadas em ganhar pontos com acrobacias.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Levar seu avião rumo ao chão rende muitos pontos e altas emoções.

Por um lado, The Crew 2 pode parecer um jogo sem foco. É verdade que nenhuma das suas muitas categorias responde por um gameplay “melhor do gênero”. Porém, você poder jogar tantos modos tão diferentes no mesmo título tem o seu valor. Isso também permite que sempre tenha algo diferente para fazer. Enjoou de corridas? Que tal pegar um avião e fazer acrobacias ou então fazer um time trial de barcos?

UM MUNDO ABERTO ENORME – E OPCIONAL

O primeiro The Crew já tinha um dos maiores mundos abertos já feitos, e este segundo beira o absurdo.

The Crew

Assim como no anterior, o mapa visa representar os EUA, e há dezenas de cidades e centenas de pontos turísticos, da Estátua da Liberdade ao Monte Rushmore.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
E tirar fotos dos pontos turísticos rende dinheiro e XP.

O tamanho absurdo, no entanto, torna o mundo aberto praticamente inviável. Eu coloquei um waypoint em um evento que parecia relativamente próximo, e ao voltar para o jogo, ele disse que estava a 24 km. Eu estava de avião, pensei que seria relativamente rápido, mas cinco minutos depois ainda estava a mais de 15 km do meu destino. Desisti e me teleportei direto para o evento.

Esta foi minha única tentativa de brincar no mundo aberto. A partir daí, passei a selecionar todos os eventos pelo menu. E, cá entre nós, eu prefiro mesmo jogar jogos de corrida desta forma, e fico feliz que The Crew 2 permita isso. Por outro lado, boa parte do orçamento do jogo deve ter ido para este mapa ridiculamente grande, e penso que poderia ter sido investido de forma melhor, uma vez que pouquíssimas pessoas vão jogá-lo como um mundo aberto.

Em parte, é uma pena, pois o jogo permite a troca de veículos a qualquer momento. Por exemplo, você pode estar voando e transformar seu avião em um barco.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
É um pássaro? É um avião? Não, é um buggy voador!

Isso possibilita screenshots absurdas e divertidas, e acredito que muitas delas vão popar internet afora, mas é uma pena que não tenha uma aplicação mais prática no gameplay.

PERFORMANCE

Por exemplo, este investimento poderia ter ido para deixar The Crew 2 tecnicamente mais arrojado. Ele roda em 4K no Xbox One X, mas não há suporte a HDR e ele não chega a 60 fps. Pior do que isso, aliás, ele tem quedas constantes no framerate, que fazem trechos de algumas provas rodarem em câmera lenta, o que, obviamente, atrapalha bastante.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Não que não haja momentos de rara beleza.

Por outro lado, é bastante impressionante como o jogo funciona basicamente sem loads. Quando você abre o jogo, há uma carregada considerável, de alguns vários minutos. Porém, depois disso é quase imperceptível. O teleporte é praticamente instantâneo, algo surpreendente dado o tamanho do mapa.

Há loads para as provas, mas estão entre os mais legais que eu já vi. Em geral, o teleporte te coloca em frente a um portão, e o load começa quando você dirige através dele. Basicamente, você está dirigindo até o grid de largada, vendo o backstage e a preparação da corrida. É muito legal, e acredito que a maior parte dos jogadores sequer vão perceber que isso é o jogo carregando a próxima prova.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Esta é a tela de load. Vai dizer que você perceberia se eu não falasse?

Visualmente, The Crew 2 tem seus momentos, mas em geral não impressiona como é praxe em jogos de corrida de alto orçamento. Ele tem gráficos mais simples, e especialmente seus personagens são bem duros e artificiais.

O som é um ponto fraco. Ele tem uma pá de músicas licenciadas de bandas grandes modernas, como Black Keys, mas a qualidade das músicas está abafada. Parece algo intencional, já que o tema do jogo na tela título toca em alta qualidade, mas isso atrapalha bastante aquela sensação de dirigir curtindo um som, algo importantíssimo em jogos de corrida.

O LADO RPG

The Crew foi o primeiro jogo de corrida que eu vi a ter um lado RPG bastante desenvolvido. Desde então, isso foi reproduzido em outros jogos. Notoriamente, foi usado para o mal em Need For Speed Payback, onde o sistema de RPG basicamente servia para justificar as microtransações.

Microtransações e loot boxes: como chegamos a este ponto?

Isso era o que diferenciava The Crew de seus congêneres, mas agora, quando do lançamento de sua segunda parte, encontra jogadores desconfiados dos objetivos por trás disso. Felizmente, The Crew 2 não é tão perverso quanto o jogo de corrida da EA. Há microtransações sim, mas elas servem apenas para comprar carros, não peças. E no final das contas, a progressão de RPG está basicamente focada nas peças.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Que gamer em 2018 não está condicionado a liberar endorfinas ao ver loot roxo?

Funciona assim: cada vez que você ganha um evento, recebe algumas peças. É necessário equipá-las imediatamente ao seu veículo ou você vai ficar underleveled rapidinho. A princípio, isso funciona bem, mas conforme você avança em cada categoria, o nível das corridas obviamente vai subindo acima do seu. Ou seja, se torna impossível vencer as provas a não ser que você repita as anteriores – e as ganhe.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
O jogo avisa quando você perde por estar underleveled.

Esta é uma das coisas mais irritantes em RPGs: a necessidade de grinding para progredir na história. Seria menos chato se, ao perder uma prova, você também ganhasse peças. Isso faria com que suas chances aumentassem a cada nova tentativa. Como também não há a possibilidade de comprar peças (nem com dinheiro do jogo nem com dinheiro real), a única forma de recuperar o nível de seus veículos é repetindo provas previamente vencidas.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Cada veículo tem uma tela com as peças equipadas e seu nível geral.

Cada categoria de evento (chamada pelo jogo de “disciplina”) tem um veículo específico, cada veículo tem seu nível e você precisa comprar pelo menos um deles para brincar em cada categoria. Assim como o primeiro, os veículos custam caríssimo. Teve categorias inteiras que eu ainda não experimentei simplesmente porque não consigo comprar um apropriado.

A Hyper Car, por exemplo, tem carros que custam três milhões de dinheirinhos do jogo. Para te dar uma ideia, cada prova que você completa rende por volta de 15 mil dinheiros. Faça as contas de quantas provas você precisa vencer para juntar três milhoes, 15 mil por vez. A impressão que dá é que a categoria Hyper Car é basicamente um DLC trancado atrás de microtransações.

NOVAS DISCIPLINAS

Já que falamos das disciplinas e de DLCs, com a cópia de imprensa de The Crew veio o plano de marketing dele, e isso inclui o lançamento de uma nova disciplina a cada três meses. A primeira, disponível em setembro, já foi anunciada e será de hovercrafts.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Hovercrafts já estão disponíveis no jogo, mas neste momento só dá para brincar com eles no mundo aberto.

Não está claro no material enviado se estas novas disciplinas estarão disponíveis para todos ou apenas para quem adquirir o Season Pass. Na página oficial do Season Pass, eles falam apenas que inclui novos veículos e outros itens cosméticos, mas nada que realmente afete o gameplay.

JOGANDO ONLINE

The Crew 2 é um daqueles jogos always online.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Com todos os problemas que isso traz.

Inclusive, eu fui obrigado a parar de jogar mais de uma vez porque ele não conseguia conectar aos servidores.

Ao contrário do anterior, no entanto, o coop parece bem mais limitado. O mundo aberto é dividido, mas como você fica basicamente pulando de um evento a outro, quase não vê outros jogadores. Não há, como no primeiro, a possibilidade de convidar os desconhecidos que estão com você para uma partida. Encontrei apenas a possibilidade de convidar amigos para jogar com você, mas ao longo da minha campanha, não vi outros amigos jogando The Crew 2 na Xbox Live.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
The Crew 2 é estiloso paca.

Imagino que seja legal jogar em coop, principalmente porque ao final da campanha ele fica muito difícil, mas isso foi algo que não consegui testar. Então pela minha experiência, o requisito always online serviu apenas para eu ser obrigado a parar de jogar de vez em quando, sem trazer nenhum benefício prático.

THE CREW 2

The Crew 2 ganha muitos pontos pela sua versatilidade e muitas formas diferentes de jogar. É impressionante como você pode alternar entre elas rapidamente, dando a sensação de que temos aqui muitos jogos em um.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
O mundo está de ponta-cabeça!

Por outro lado, seu approach RPG para as corridas parece servir apenas para incentivar o grinding, o que considero algo imperdoável. Para terminar sua campanha propriamente dita, você vai ter que repetir muitas vezes o mesmo evento, além de provavelmente desembolsar dinheiro real para comprar os veículos das disciplinas mais caras, como a hyper car. Isso arrasta o jogo para baixo com força. Convenhamos que ter que pagar extra para terminar a campanha é algo tão malvado quanto loot boxespay to win.

The Crew 2, Delfos, Ubisoft
Tem cabeças naquela montanha!

No final das contas, o saldo ainda é positivo por tudo que ele faz certo. A versatilidade de The Crew 2 o torna um jogo de corrida único e bastante divertido, ainda que poucas pessoas tenham a paciência – e o bolso – necessários para jogar sua campanha até o fim.