O delfonauta fã de RPG com certeza tem uma relação afetiva com Ni No Kuni. O lindo jogo com participação do Estúdio Ghibli é considerado por fãs do gênero um dos melhores exclusivos do PS3. De Ni No Kuni, admito, eu só joguei um demo. Mas pelo pouco que joguei, devo dizer que senti bastante influência dele em Shiness: The Lightning Kingdom, a começar pela estética apurada com cara de animê.

Shiness
Não é lindo?

Temos aqui um jogo cheio de cores vivas e com um cuidado absurdo em seu visual. Explorar seus mundos coloridos, ouvindo músicas alegres e cheias de melodia dão à experiência de jogá-lo um clima jovial e divertido.

Embora seja lindo de se ver, é fácil perceber que ele não é tecnicamente tão apurado quanto seu lado artístico. Os personagens ficam presos no cenário, algumas animações são estranhas e eventualmente você pode ver coisas que simplesmente não deveriam estar lá.

Shiness
Tipo isso.

Shiness é claramente um jogo ambicioso. Almeja ser um RPG AAA com um orçamento bem mais baixo do que um jogo desta categoria precisa. Isso conta muito em pontos de carisma, mas a verdade é que a experiência de jogá-lo é bem próxima à de um jogo nada.

Algumas ausências de coisas básicas, por exemplo, não fazem sentido algum. Por exemplo, o minimapa não gira com você, como é tradicional desde Virtua Racing, lá nos anos 90. É o tipo de conforto com o qual estamos tão acostumados hoje em dia que, quando é inadvertidamente arrancado de nós, ficamos totalmente indefesos. Era comum eu ver no minimapa um save e ficar andando em círculos feito uma barata tonta tentando encontrá-lo no mundo do jogo, pois não consigo descobrir em qual direção do meu personagem é a esquerda que mostra no mapa.

ROUND 1, FIGHT!

Os controles também não são tão precisos quanto deveriam, e isso se torna um problema grave pelo fato de que o combate de Shiness quer se equiparar ao de um jogo de luta.

Shiness
Embora também seja um problema nos desafios de plataforma.

Assim como em Ni No Kuni, quando uma cena de ação é iniciada, você fica preso nela até vencer ou perder. No entanto, aqui a coisa depende bastante de timing e de golpes especiais que são dados com comandos complicados, tipo A, X, RT. Não parece complicado, né? Acontece que o A chuta e o X soca, mas este comando não funciona como um combo. Não é chute, soco, RT, mas ele exige que você aperte os três botões rapidamente, antes mesmo do personagem executar um chute. Sabe aquele super combo altamente complicado do Akuma em Super Street Fighter II Turbo? É tipo aquele. E todos os golpes especiais são assim.

Há também magias, mas essas são traídas por um lado RPG mal planejado. Acontece que você precisa equipá-las na tela de magias, e depois escolher um botão para ela em outra tela. Mais complicado do que deveria, né? Mas fica ainda pior. A descrição na primeira tela sempre é algo poético, tipo “possibilita que o herói se torne um com o elemento do ar”, o que não ajuda em nada para saber para que diabos ela serve. Só depois de equipá-la e ir para o segundo menu é que você vê a descrição real, que fala algo como “solta um projétil de ar” ou “cura 20% do life”.

Para piorar ainda mais, tem magias que você equipa na primeira tela, mas elas simplesmente não aparecem na segunda para você ver o que diabos elas fazem ou escolher um botão para usá-la. Isso faz com que para cada novo poder que você pegue, você precise desequipar a que está equipada e passar por dois menus só para descobrir o que a nova faz, se é que ela faz alguma coisa. Na prática, eu acabei ignorando as magias e me defendendo apenas com a força dos meus punhos.

Ah, e você só pode equipar uma magia e um combo por vez. Equipou outra, a anterior some, a não ser que você a tenha dominado, usando-a dezenas de vezes em combate. E nada de ficar usando no ar para dominar logo, os botões de ataque só funcionam durante as lutas.

ShinessROUND 2, SUPPORT!

Algo essencial em um RPG é que os menus sejam simples e bem elaborados, possibilitando que o jogador passe a maior parte do tempo jogando, e não equipando itens. Shiness tem nisso seu principal ponto fraco. E isso é curioso, porque como RPG ele é até bem simples, mas seus menus são desnecessariamente complexos.

Após algum tempo de jogo, você vai liberar outros personagens e vai poder formar times de três personagens, cada um com combos, magias, equipamentos e habilidades específicas. Resolver um puzzle pode necessitar o uso das habilidades de dois ou três personagens, e isso se torna um problema, pois embora você possa liberar cinco caboclos ao longo do jogo, pode ter apenas três equipados.

Sim, você pode trocar os que estão ativos no time a qualquer momento, mas é mais uma entrada desnecessária nos atribulados menus do jogo. Você pode trocar entre os que estão equipados simplesmente apertando LB e não dá para entender porque não é possível trocar entre os cinco dessa forma. Pelo menos durante a exploração, a troca deveria ser livre, e os três equipados poderiam valer apenas para as lutas.

Durante o combate, os personagens equipados podem participar com golpes de apoio. Coisas como recuperar seu life, curar efeitos como veneno e aumentar sua força. Esta é uma das coisas que eu mais gostei no combate. Você pode escolher o apoio e as condições – adivinha só – no menu, e é muito legal quando você é envenenado e imediatamente o coleguinha te cura do efeito negativo. Você pode também alternar entre seus personagens equipados durante o combate e, para perder mesmo, todos os seus heróis equipados devem ser eliminados.

Só há checkpoints em momentos bem específicos. Normalmente, ao perder você volta para o último save, e os saves são manuais. O bichinho no qual você salva é bem comum, se você salvar em todos quase nunca vai voltar muito. No entanto, o processo de salvar, como já está se tornando um tema por aqui, é mais complicado do que deveria. Ao invés de ser só passar perto ou, vá lá, interagir com o personagem, você precisa interagir, passar por algumas telas de diálogos, escolher a opção sim, escolher a posição em que deseja salvar, confirmar o salvamento e dar ok quando o jogo avisar que foi salvo com sucesso. Com o tempo, você passará por todas essas telas rapidamente martelando os botões, mas não dá para negar que não precisava ser tão elaborado para algo tão simples e que você vai fazer com tanta frequência.

ROUND 3, OPEN WORLD!

Considerando que o que temos aqui é um RPG de mundo aberto, até que ele é bem leve neste aspecto. Não há muitas sidemissions durante boa parte do jogo, e mesmo os mapas estão mais para fases do que para mundos grandes e expansivos. Diria que durante a primeira metade, Shiness está mais para um metroidvania do que para um mundo aberto propriamente dito.

A coisa muda quando você chega no mapa Gendys Plain. Este sim é bem largo e bem aberto, com vários pontos de interesse e várias sidemissions que você pode receber ao mesmo tempo. Nessa parte do jogo, dá até para comprar uma montaria, que permite que você se locomova mais rapidamente, e é só ao chegar aí que você libera o fast travel.

Shiness
E a montaria em questão é bem simpática.

Há vários Dungeons também, fases mais lineares onde você passa tanto tempo explorando e solucionando puzzles quanto lutando. Como é tradicional no gênero, são os melhores momentos do jogo.

Infelizmente, o jogo é muito mais longo do que deveria. Durou 24 horas para mim e a essa altura eu estava jogando totalmente pela obrigação de terminar. Dava para tirar umas 10 horas da experiência numa boa.

Para piorar, o chefe final é um dos mais apelões e pentelhos da história dos games. Ela tem um golpe indefensável que tira toda sua energia e que é usado muito rapidamente, deixando quase impossível desviar. Grande falha de gamedesign.

Shiness
Tirar um selfie na frente do boss derrotado é tão Deadpool, né?

Minha experiência com ela ainda foi degradada por um bug bizarro. Esta luta é dividida em duas partes. A primeira é bem fácil, e a segunda é muito difícil. No entanto, depois que eu morri a primeira vez, a primeira parte começou a agir e usar os golpes da segunda. Isso fez com que eu tivesse que vencer a parte difícil duas vezes na mesma vida para contar. Eu até tentei reiniciar o jogo e o console, mas não deu outra, tive que encarar o desafio. Como resultado, o tédio que eu estava sentindo nas últimas horas deu lugar à raiva. Eu terminei o jogo dando graças a Santo Antônio casamenteiro que o troço acabou.

FINAL ROUND!

Shiness: The Lightning Kingdom talvez conseguisse mais sucesso se tivesse sido lançado em uma época não tão saturada por RPGs. Ele é bonito e agradável o suficiente para entreter moderadamente, mas não é tão polido quanto o gênero exige, o que o torna mais exigente do que o necessário. Talvez esta tenha sido a intenção, parecer mais complexo do que realmente é, mas no final das contas isso teve um impacto considerável no fator diversão, aproximando bastante o jogo de um game nada.