Madrugada dos Mortos

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Na natureza nada se cria, tudo se copia. Já no cinema, alguns criam, outros copiam e outros copiam o copião. Explico: no fim da década de 60, mais precisamente em 1968, o cineasta George Romero tornou moda o tema dos “mortos-vivos que comem miolos” com o clássico A Noite Dos Mortos Vivos, filme independente que se tornou uma verdadeira coqueluche e iniciou uma avalanche de filmes com o tema.

Como tudo que faz muito sucesso, a continuação era inevitável. Antes tarde do que nunca, George filmou o mais clássico ainda, O Despertar dos Mortos, que mostrava uma galerinha presa em um Shopping Center rodeado de zumbis salivando por miolos. Uma outra continuação chamada O Dia dos Mortos também foi feita, mas esta é irrelevante para onde eu quero chegar. Vale lembrar que os zumbis de Romero sempre foram lentos, mal conseguindo se locomover sem perder os membros.

Principalmente nos anos 80, vimos muitas vezes mortos-vivos serem as grandes estrelas de filmes (alguém se lembra de Reanimator?), mas a moda (como toda moda) acabou se esvaindo.

Até que, 25 anos depois de O Despertar dos Mortos, um outro filme independente fez a moda ressurgir como uma fênix. Este filme era Extermínio que, embora tenha uma péssima qualidade de imagem (e, segundo o diretor, parece que a imagem ruim foi intencional, vai entender esse povo) e terríveis atuações, consegue prender o expectador na cadeira e dar muitos sustos devido, principalmente, à ótima condução da estória. A principal (ou melhor, a única) inovação deste filme em relação às incursões anteriores de George “morto-vivo” Romero é que os zumbis mudaram da água para o vinho, passando de lesmas preguiçosas para verdadeiros atletas olímpicos.

E agora cheguei onde queria. Madrugada dos Mortos é uma refilmagem de O Despertar dos Mortos (Dawn Of The Dead, o nome em inglês, é o mesmo nas duas fitas), misturando o original com a única criação do copião Extermínio. Ou seja, vemos aqui uma galerinha presa em um Shopping Center rodeado de zumbis salivando por miolos, com a diferença de que os monstrengos agora sabem correr, e muito bem por sinal. Em uma das primeiras cenas, vemos um morto perseguindo um carro e, pasme, ele quase alcança o veículo. Imagine só, como se não bastasse termos que desviar dos motoqueiros que acham que nossos espelhos retrovisores são pinos de boliche e de fugir de trombadinhas em dois de cada três faróis vermelhos, ainda tivéssemos que fugir de mortos-vivos. E imagine se esses mortos-vivos comprassem motos ou virassem trombadinhas, como seria. É nessas horas que eu agradeço pela frase “esta é uma obra de ficção” exibida no final dos filmes.

Mas voltando ao Madrugada dos Mortos, não há muito a se contar de sua estória. Até porque ela mesma não se conta. É basicamente o povo preso no Shopping pensando em como escapar. Em nenhum momento sabemos o que está acontecendo e, sinceramente, nem precisa.

O principal pecado do filme é o excesso de personagens. Talvez tenham optado por isso para terem muita gente para matar, mas é tanta gente presa no Shopping (e convenhamos, norte-americanos são todos iguais) que dificilmente lembramos de quem é quem. É comum pensarmos coisas como “Ué, ele não morreu?” ou “Steve? Quem é Steve?” além de que, com tanta gente, não temos como nos importar com os personagens. Cada um que morre é simplesmente mais um, já que poucos são realmente desenvolvidos e esses, obviamente, não morrem (não tão cedo pelo menos).

Madrugada dos Mortos é aquele tipo de “filme claustrofobia”. Talvez o único tipo de filme onde a condução é mais importante do que a estória em si. Não é nenhuma obra-prima, mas é divertido e muito bom naquilo que se propõe. Minha única decepção ficou com o fato de a palavra “Miolos” não ter sido usado nenhuma vez no filme inteiro. Sacrilégio!