O mundo dá voltas, delfonauta. Pois é, eu estou iniciando esta resenha com um clichê. Admire-se com minha audácia. Este clichê, porém, é muito apropriado para falar de Injustice. Ora, nos anos 90, quando os games de luta dominavam o mercado, não tinha para ninguém, Street Fighter e demais jogos da Capcom dominavam.

Verdade, Mortal Kombat dava uma canseira na Capcom em popularidade, mas era inegável que os jogos japoneses eram simplesmente mais elaborados, mais complexos… enfim, melhores jogos. Mortal Kombat se destacava pelos gráficos e pela violência, não por sua jogabilidade.

Vinte anos depois, o jogo mudou. Sacou? Jogos, games? Hein, hein? Eu já falei por aqui, mas há um abismo de qualidade entre Mortal Kombat X e Street Fighter V.

O Bátima bate em muié!

Você ainda pode argumentar que a jogabilidade de Street Fighter V é superior, mas Mortal Kombat tem muito mais sustância, muito mais jogo e muito mais vida útil hoje em dia. Injustice 2 pega toda essa expertise da NetherRealm Studios e a coloca em um belíssimo jogo de luta entre heróis e vilões da DC. O resultado não é apenas um excelente lançamento, mas um orgasmo nerd que absolutamente todo fã da DC tem que experimentar.

BATMAN VS. SUPERMAN, MAS AGORA A HISTÓRIA É BOA

Talvez a principal característica dos jogos de porrada da NetherRealm é o modo história. Para os dois delfonautas que não sabem do que se trata, é basicamente um filminho onde você assume o controle nas cenas de luta, alternando entre alguns dos principais personagens.

A história aqui parte do final do anterior. Superman foi preso por seus crimes, e alguns dos heróis que se juntaram a ele no primeiro Injustice estão escondidos. Batman, do alto de sua paranoia, criou um equipamento chamado “Brother Eye”, que visa procurar os refugiados e impedir que eles voltem a aprontar. As coisas ficam mais tensas quando Brainiac aparece buscando o Superman, e acaba desenvolvendo um interesse pela Terra. Cabe ao Batimão e aos seus parceiros impedir a invasão.

A primeira coisa que chama a atenção é o visual. Pelo martelo de Thor, como isso aqui é lindo. Imagine uma animação em computação gráfica que junta os principais personagens da DC com o capricho de uma Pixar e você vai ter uma ideia. Ainda assim, vai indubitavelmente se impressionar.

O negócio é tão elaborado que beira o uncanny valley. Repare nas animações faciais. Até mesmo quando os personagens estão em segundo plano o bagulho impressiona. O Arqueiro Verde pode estar fazendo um discurso com a Arlequina ao fundo, mas a animação dela mascando chiclete é feita com tamanho capricho que você vai olhar mais para ela do que para o glorioso verdão.

E este apelo visual não se limita às cutscenes do modo história, não. O visual do gameplay em si é igualmente pintudo. Na verdade, a coisa muda de uma cena não interativa para as lutas de forma tão sutil que você pode até levar uns sopapos antes de perceber que está na hora do pau. A mesma coisa acontece após as lutas, que conectam na próxima cutscene de forma que tudo parece apenas um único filme muito bem dirigido.

O Coringa sempre foi um fã do Batman.

Aliás, a direção também merece destaque. Os planos são estilosos pra burro e os cenários são épicos, dando aquele ar quase divino pelo qual os heróis da DC são conhecidos. Mesmo na hora da porradaria, o estilo e a epicidade ainda se destacam, especialmente nos super golpes.

Estes ataques, que podem ser dados apertando o L2 e R2 quando a barra de super estiver cheia, são basicamente filminhos no meio da luta. E é tudo de um exagero absurdo, no bom sentido. O super do Flash, por exemplo, leva o desafeto até a esfinge, até os dinossauros e depois volta para o local da luta colidindo a vítima com ela mesma no passado. Tente assistir isso e não soltar um hell, yeah empolgado. Não vou nem descrever outros para não estragar a surpresa, já que vê-los pela primeira vez é um dos grandes prazeres de Injustice 2.

Tudo fica ainda melhor dependendo de quão profundo é o seu conhecimento dos heróis da DC. Os cenários das lutas representam locais importantes para a editora, como o Asilo Arkham ou a  Fortaleza da Solidão. Meu conhecimento do universo DC não é exatamente profundo, então algumas coisas causaram estranhamento. Por exemplo, o Robin nesta história não é Tim Drake ou Jason Todd, mas um tal de Damien, que é filho do Batman. Eita nóis! Isso fez com que eu percebesse quão desinformado eu estou nos quadrinhos da editora.

DEPOIS DA HISTÓRIA

Após concluir o modo história, ainda tem muito jogo. Você obviamente pode levar a porradaria para jogadores do mundo todo no modo online, mas isso hoje em dia é o básico. Ao contrário de Street Fighter V, Injustice 2 tem opções bem robustas para o single player também.

Há um tal de multiverse, basicamente uma versão das torres de Mortal Kombat X ou, para os velhos como eu, seria o modo arcade, com uma luta depois da outra. Estes desafios são alterados pela própria NetherRealm, o que significa que sempre há algo novo para jogar. Alguns ficam no ar por minutos, enquanto outros duram dias. Eles podem ser lutas tradicionais ou ter modificações sapecas. Por exemplo, uma que eu joguei fazia a luta acontecer de ponta cabeça.

É mais ou menos por aí que o lado negro de Injustice começa a aparecer. Acontece que, na pressão de inovar e de ganhar dinheiro com microtransações, o pessoal da NetherRealm resolveu dar ao jogo fortes características de RPG.

Todos os personagens são customizáveis, e cada roupinha nova afeta não apenas o visual, mas suas habilidades e estatísticas. Pode parecer legal, mas da implantação ao princípio da coisa toda, eu infelizmente não tenho nada de bom a dizer.

LEVEL UP

Praticamente tudo que você faz no jogo rende experiência, o que faz o personagem que você está controlando (e apenas ele) subir de nível. A maioria das roupas e desafios só podem ser usufruídos por jogadores acima de determinado nível, e demora bastante para rolar cada level up. Isso foi muito mal planejado, pois acaba incentivando os jogadores a escolher o seu herói ou vilão preferido e jogar apenas com ele para poder aproveitar o resto do jogo.

Isso é algo que RPGs com party conseguiram resolver fazendo todos os personagens subirem de nível conforme você joga, dando apenas bônus de experiência para que os que você controla diretamente subam um pouco mais rápido. Infelizmente, Injustice 2 não copiou essa ideia, e na prática isso significa que você dificilmente vai jogar com muitos personagens diferentes.

Nos anos 90, por exemplo, eu sabia jogar Street Fighter II e Mortal Kombat com todos os personagens. Não vejo isso acontecendo com frequência em Injustice 2, mesmo entre jogadores mais jovens. Nas próprias partidas online, as pessoas parecem nunca variar seus lutadores.

Isso de ter nível dos lutadores também significa que quem jogou bastante e está num nível alto tem vantagens enormes em relação a alguém que acabou de começar, e isso é claramente sentido nas partidas online. Se você é nível 5 e é juntado com um caboclo de nível 20, suas chances de ganhar são mínimas, e o próprio jogo mostra isso. Chega a ser hilário a quantidade de lutas online que o jogo me dava 0% de chance de vitória.

Claro, você sempre tem a opção de comprar com dinheiro de verdade loot boxes para equipar melhor seus personagens, dando ao jogo uma característica pay-to-win. Para piorar, as caixas em questão são aleatórias. Você pode ter o Batman no nível 20, mas não parar de ganhar equipamentos de nível alto para o Aquaman. E não pense que as compras se limitam a isso, pois desde o lançamento já existem dois personagens para DLC, e são dois legais: Brainiac e Darkseid. Pelo menos o Brainiac é liberado de graça após você concluir a história, mas o Darkseid só pagando mesmo.

Os próprios menus dessa parte RPG são bastante convolutos. Após uma luta, você pode ganhar equipamentos para qualquer lutador. Por exemplo, você pode estar jogando com o Superman e ganhar uma roupinha para a Mulher-Maravilha. No entanto, só é possível equipar imediatamente roupas para o personagem que está utilizando. Para quaisquer outros, você precisa voltar ao menu principal e entrar na parte de customização de personagens.

Vender peças que não lhe interessam, então, é ainda pior. Não basta você não poder vender direto da tela de recompensas, também não é possível vender do menu de customização. É necessário entrar em um outro menu, o de vendas, e depois disso escolher o sujeito cujos equipamentos deseja vender e, depois disso, as peças uma a uma. Não dá nem para marcar peças de vários ao mesmo tempo, você precisa ir de um em um. Se eu já acho chato a necessidade de ficar um bom tempo em RPGs olhando para menus, Injustice turbina isso ao 11, com aqueles que são possivelmente os menus mais mal planejados do gênero. Me fez sentir falta de For Honor e sua função básica de equipar ou vender roupinhas assim que você as recebe.

Uma reclamação final, mas não menos importante, é que alguns dos desafios do multiverse exigem que você pague para serem destravados, uma terrível herança de jogos free-to-play que não tem porque existir em um AAA de consoles.

INJUSTIÇA DOIS

Injustice 2 combina o que existe de melhor no mundo dos jogos de luta com o pior dos RPGs e mobile. Focasse no que faz bem – a parte de luta – poderia ser perfeito, talvez um dos melhores já lançados. Infelizmente, se você deseja jogar online ou qualquer coisa fora da história, prepare-se para muito grinding para subir de nível e conseguir equipamentos ou simplesmente não vai ter chance de ganhar.

Esta tentativa de expandir a vida útil do jogo através de grinding pode funcionar para quem tem muito tempo nas costas, mas para pessoas normais acaba sendo um tiro nos pés, que acaba reduzindo a parte interessante do jogo ao modo história, colocando uma exigência de investimento de tempo muito grande para poder usufruir do resto do jogo – e mesmo assim vai ficar limitado ao personagem que escolheu upar.