Grim Fandango Remastered

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O delfonauta dedicado sabe que um gênero de game muito apreciado aqui no Oráculo é o adventure. Por isso, o hype foi grande quando soubemos da vindoura remasterização de Grim Fandango, um dos jogos mais divertidos do estilo. A excitação causada nesse primeiro momento só foi superada quando surgiu a oportunidade de resenhar este clássico e, mais ainda, de lançar a análise no fuckin’ dia de lançamento do jogo! É ou não é para comemorar?

E eis que, muitas risadas depois, é chegada a hora de dizer se o jogo valeu esse hype todo – mas é claro que, se você viu a nota ali do lado, já sabe a resposta.

CONHEÇA – OU RELEMBRE – “MANNY” CALAVERA

A premissa do jogo é ao mesmo tempo simples e complexa. Neste jogo, você é apresentado a uma representação muito distinta e específica do Mundo dos Mortos. Aqui, todas as almas precisam fazer uma viagem de quatro anos para alcançar o esperado descanso eterno, mas é claro que a vida que você levou pode fazer a diferença.

Dependendo de como você viveu a sua vida, você pode conseguir facilitadores para a viagem, como por exemplo um carro esportivo, um navio ou ainda o luxuoso Trem Expresso Número Nove. Todo esse universo é apresentado logo na primeira cutscene, onde você também conhece o protagonista Manuel “Manny” Calavera.

Manny é um dos agentes de viagens do Departamento da Morte da cidade de El Marrow, e sua viagem para o descanso eterno depende diretamente dos pacotes que consegue vender. Ele se encontra desmotivado, pois há algum tempo não consegue mais clientes que consigam comprar os melhores pacotes, e tudo isso piora quando ele conhece Mercedez “Meche” Colomar.

Meche é uma recém-chegada ao Mundo dos Mortos. Seu histórico de vida indica que ela merecia um Bilhete NN (os bilhetes para o Trem Número Nove), mas o sistema não o concede a ela. Manny acha isso muito estranho, e após liberá-la para a sua jornada de quatro anos, decide investigar o que está acontecendo. Como não poderia deixar de ser, ele descobre que tem caroço nesse angu, e parte em sua jornada atrás de Meche para entregar o que é seu de direito.

VIVA LA REVOLUCIÓN!

Complementando essa representação do Mundo dos Mortos, temos aqui um jogo totalmente inspirado na tradição mexicana do Dia de Los Muertos, como Guacamelee!. Para quem não sabe, se trata de uma data comemorativa em que todos se reúnem em memória dos mortos. É algo como o nosso dia de Finados, mas com caveiras fofas e com uma decoração extremamente colorida, o que se reflete no jogo: essa dualidade é uma constante e dá a tônica de tudo o que você verá durante a jogatina.

O humor, como nos saudosos adventures de antigamente, também é afiado. Em uma das fases, por exemplo, Manny começa a bordo de um navio, como capitão. Um marujo surge e avisa que existem alguns funcionários da alfândega querendo revistar o navio. Manny permite, afinal “não temos nenhum esqueleto escondido no armário”. Impagável.

Outro detalhe também chamou a minha atenção. Em determinado momento, você descobre que as almas podem morrer no Mundo dos Mortos – existe uma substância chamada brotadela que floresce quando em contato com os ossos, e que, quando posta na bala de um revólver, é fatal. Acontece que, ao invés de sair sangue, crescem flores no corpo do “brotado”, o que cria momentos ao mesmo tempo tensos e belos – exatamente como a própria morte. Se quiser saber como é, eu separei um desses momentos para a galeria.

É importante destacar também a influência forte de filmes noir. Fãs de cinema, tenho certeza de que vocês vão se deliciar com as referências feitas aqui, que já começam na própria capa: diga a verdade, é ou não é uma capa vinda diretamente dos anos 40?

OH, LUZ MINHA EM ALTO MAR, VOU DEIXAR VOCÊ BRILHAR

O jogo é um adventure clássico, em que tudo o que você precisa para jogar é o mouse. Na versão original se jogava com o teclado, e a possibilidade dos controles clássicos apenas com o mouse é, curiosamente, nova. Sendo o primeiro adventure da LucasArts em 3D, à época optou-se por manter o fundo fixo, o que nessa versão foi mantido. O jogo aqui é dividido em quatro atos, cada um correspondente a um ano diferente. A minha sugestão é que você não pare de jogar enquanto não finalizar o ato, pois se você não está acostumado com a mecânica desses adventures antigos, pode acabar se embananando.

Em jogos como The Walking Dead, a mecânica é muito mais instintiva e rápida, sem que ocorram momentos em que você não saiba o que fazer e fique muito tempo pensando. Essa facilidade, que é característica das gerações mais recentes, contrasta com o que Grim Fandango Remastered oferece – um jogo bem contemplativo e por vezes lento, com bastante backtracking e momentos em que você só vai apertar botões aleatoriamente esperando que algo ocorra.

Dos quatro atos, um especialmente é bem difícil: o segundo, que possui um único puzzle na cidade de Rubacava. O puzzle é tão grande e intrincado que eu, que não estava acostumado com a mecânica, acabei sofrendo para terminar. A bem da verdade, eu precisei dos dois primeiros atos inteiros para conseguir entender como se jogava o jogo, e foi só no Ano Três que eu senti segurança e comecei a curtir a história sem me preocupar com o que tinha que fazer. Mas Odin sabe o que faz, delfonauta.

Eu demorei para curtir o jogo, mas depois tudo ficou legalzudo demais! A história é toda muito bem construída e bem diferente do que os jogos de hoje em dia proporcionam. Minhas últimas experiências gamísticas foram com Watch Dogs e The Walking Dead Season 2, e posso dizer que, diferenças à parte, nenhuma delas me entreteve tanto quanto Grim Fandango Remastered.

Quanto aos extras, o jogo não possui muitos. Os principais são poder ouvir comentários do autor (Tim Schafer, um dos criadores de Monkey Island) durante a jogatina (basta habilitar os comentários e apertar Z quando aparecer na tela) e ver artes conceituais, que devo confessar que não me apetecem tanto. Além disso, o jogo também aderiu à moda dos troféus: existem dois tipos, um em que basta fazer com que algum personagem fale alguma frase específica durante uma conversa e outro que você ganha por terminar os Anos.

FAZ JUS AO TÍTULO DE REMASTERED?

Sim. A bem da verdade, no começo do jogo eu não via sinais da remasterização, e os gráficos para mim pareciam completamente iguais ao que eram antigamente, com polígonos e tudo o mais. Contudo, a Double Fine teve a grande sacada de separar um botão exclusivamente para alternar entre a versão remasterizada e a original, que no PC é a tecla Tab. Qual não foi a minha surpresa ao apertar o botão e ver a realidade…

A remasterização foi muito bem feita, com uma especial atenção para iluminação e sombra. Nessa versão, os gráficos dos personagens durante o gameplay estão no mesmo nível dos gráficos das cutscenes, o que dá uniformidade ao visual. Não bastasse isso, eles também mudaram o modelo do menu e também das legendas. Estas últimas, na versão original, ficavam próximas ao personagem que falava, mas agora se encontram na parte de baixo da tela, como é usual.

Um outro problema que eu percebi e achei deveras estranho foi o fato de o jogo não salvar automaticamente. Qualquer jogo atualmente salva sozinho, mas a Double Fine manteve o save manual, o que pode gerar dores de cabeça aos mais desatentos. O curioso é que, no início do jogo, há um aviso de que os saves são manuais, e isso me faz pensar que, se eles sabiam que as pessoas esperam por saves automáticos, por que não colocaram?

É importante destacar que os fundos fixos não sofreram nenhuma alteração, o que para mim não fez nenhuma diferença. Ao reparar que eles não mudavam, me assustei por perceber que eles eram absolutamente bonitos desde o original. Na galeria você terá exemplos de algo que foi o que mais me espantou: a água. Nossa, como a água nesse jogo é bem feita! Muitos jogos feitos posteriormente não têm uma água tão bonita quanto este, e isso é um ponto a favor de Grim Fandango Remastered.

Não só os gráficos foram remasterizados, como o som também. A trilha sonora, por exemplo, foi totalmente refeita com uma orquestra completa. A dublagem também foi remasterizada, o que nos leva a um ponto sensível…

A DUBLAGEM EM PORTUGUÊS

Aqui, a dublagem original em português foi inclusa novamente. A julgar pela época em que o jogo foi lançado (1998, quando eu mal tinha dois anos de idade), sou obrigado a concordar que o trabalho foi muito bem feito para todos os personagens… Exceto Manny. A voz de Manny, que possui sotaque espanhol tanto na dublagem original quanto na dublagem em português, simplesmente não soa bem.

Um dos problemas é o sotaque em espanhol, que é tão caricato que não funciona. Para se fazer um paralelo, um outro personagem masculino que também tem sotaque em espanhol é Salvador Limones, e a dublagem dele é uma das melhores do jogo todo. Eu estranhei o porquê de o sotaque funcionar em um e não no outro, mas isso só mostra que o trabalho na voz de Manny poderia ser melhor.

Outro problema é que a dublagem de Manny não transmite a emoção necessária. Em um dos momentos, Manny grita (eu sei disso pois todas as letras da legenda estavam em caixa alta), mas a dublagem não acompanha. Essa falta de emoção, somada ao sotaque equivocado, dá a impressão de o personagem ter sido dublado pelo Google Tradutor. O pior mesmo foi constatar que todas as outras vozes foram feitas com esmero, mas a do personagem principal ficou bastante a desejar.

Curiosamente, as cutscenes não são dubladas em português, apenas no idioma original. Isso é curioso pois na versão original o jogo inteiro era dublado em português, mas aqui isso se limita ao gameplay. Felizmente, você pode mudar a dublagem a qualquer momento, o que é um alento.

CONCLUSIÓN

Grim Fandango Remastered é obrigatório para você que gosta de boas histórias e mais obrigatório ainda para quem gosta de adventures. Se você, assim como eu, não está acostumado com o gênero em sua forma original, pode ser que tenha alguns problemas no começo, mas eu garanto: vai valer a pena.

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Brütal Legend: Chapter I: A Double Fine já fez um jogo focado no mundo do heavy metal.

Brütal Legend: Chapter II: A segunda parte da resenha delfiana do jogo mais trüe já feito.

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