Exclusiva: Detonator e as Musas do Metal – Bruno Sutter

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Entrevistar o maior vocalista de Heavy Metal da galáxia não é algo que acontece todo dia. E uma honra maior ainda seria entrevistar este mesmo vocalista duas vezes, não é mesmo? Pois, assim como o DELFOS já entrevistou o Detonator uma vez, agora lá estava eu tentando conseguir outra entrevista com o ídolo.

Porém, como ele estava com a sua agenda intergaláctica apertada, não foi possível marcar um horário para a conversa. Sobrou, então, para o faz-tudo do músico, Bruno Sutter, conceder ao DELFOS uma entrevista. E sabe o mais curioso? Ele também já deu uma entrevista ao site! Confira a entrevista nova, na íntegra, abaixo.

DELFOS: Primeiramente, muito obrigado, Bruno, pela entrevista…

Bruno: De nada! Valeu, tchau! (risos)

DELFOS: Vamos começar falando do seu CD solo, o Metal Folclore, que é um disco extremamente detalhado. De onde veio a ideia para pôr tantos elementos no disco?

Bruno: Ah, eu pensei em fazer um disco diferente do que era o Massacration, senão eu estaria simplesmente copiando uma ideia do Hermes e Renato. Como eu não estava mais no grupo, acho que seria antiético, e já que eu saí, queria fazer uma coisa diferente aproveitando o personagem. Então, achava que seria mais honesto fazer uma coisa totalmente autoral – desconstruindo o personagem “Detonator” no esquema do Massacration para fazer uma coisa totalmente nova.

O Massacration fazia uma sátira do Heavy Metal de uma forma mais rasa: a gente pegava aquela brincadeira de falar um inglês tosco com temáticas aleatórias, fazendo graça disso. No Metal Folclore, eu quis fazer um tipo de humor meio sátira mas, ao mesmo tempo, com alguns pontos de crítica ao Heavy Metal, porque eu acho meio fora de propósito, hoje em dia, você fazer Heavy Metal em inglês sendo o Brasil o maior polo de Heavy Metal do mundo. Todas as bandas gringas vêm para cá e fazem turnês no Brasil inteiro porque na Europa e nos EUA o Metal está quebrado, então eu acho que seria muito mais coerente você fazer metal em português para o maior público de Heavy Metal do mundo.

E, além disso, falar do folclore brasileiro, porque as bandas nórdicas falam do folclore deles com muito orgulho, além, claro, do Rhapsody, do Blind Guardian… E eu acho isso legal. E no Brasil, o que o pessoal faz? Faz Metal em inglês falando de cavaleiros. Isso pra mim está totalmente errado, porque a gente não vivenciou isso. Então eu achei que era necessário fazer isso, que é quase uma sátira: vou fazer o que o Rhapsody faz, só que no Brasil. Então ao invés de eu falar de elfo, de Cavaleiro da Távola Redonda, eu vou falar do Saci, do Curupira, do Boto, porque é o que a gente vivencia na nossa cultura.

DELFOS: Você acha que o CD teria o mesmo êxito de tivesse uma gravadora por trás?

Bruno: Não. Esse disco foi aceito porque o pessoal entendeu que eu tomei “não” de todo mundo e se identificou com a dificuldade que o mercado impõe pro Rock e pro Metal. Se eu fosse aceito por uma gravadora, a gravadora ia ter pouco dinheiro, ia investir pouco, fazer um CD de baixa qualidade (que talvez não viesse nem com as figurinhas) e eu não ia ter o que falar, porque já que eles bancariam eu ia ter que acatar o que eles determinassem. Eles iam escolher quanto tempo ia ter o CD, iam falar que o estilo do CD está indo pra um lado e teria que ir para o outro, iam querer mexer no conceito… Então, sendo independente, ele ficou exatamente do jeito que eu queria, mandando a mensagem da forma que eu achava mais coerente.

DELFOS: Então você acredita que foi essa proximidade com o público que fez esse CD ter um sucesso tão grande.

Bruno: Acredito que sim, cara. Acredito que sim.

DELFOS: Mas, ao mesmo tempo, você também teve os discos do Massacration, que também fizeram muito sucesso e tiveram uma gravadora por trás.

Bruno: Sim, sim, o primeiro disco do Massacration foi lançado pela Deck e o segundo pela EMI. O da Deck é o que a gente pode usar como exemplo, porque o da EMI foi muito mal trabalhado na mídia – para você ter uma ideia, foram lançadas duas mil cópias e não fizeram mais, e do Detonator eu acabei de mandar prensar a terceira leva de mil cópias, então duas mil cópias já foram vendidas em dois meses de lançamento e cem cópias dessa terceira leva já foram vendidas na FNAC (n.e.: no dia 31 de outubro, houve um show da banda lançando o disco na FNAC da Avenida Paulista, em São Paulo.)

DELFOS: E agora um ponto que eu acho que você já deve ter pensado muito. Muita gente pensa que ser independente não é ser de boa qualidade e ser humorístico não é ser um trabalho sério. Qual a sua opinião a respeito disso?

Bruno: Aí eu vou ter que usar uma frase que o Fausto (Fanti, humorista recentemente falecido que trabalhou com Bruno no Hermes & Renato) usava, que eu acho hiper coerente: eu não tenho nenhum tipo de preconceito e aceito muito bem quando o cara fala que não gostou da música, mas eu me sinto hiper invadido e desrespeitado quando eles falam que por eu ser um humorista eu não deveria fazer Heavy Metal, que deveria ficar na televisão. Artisticamente eu me sinto super desrespeitado, e na verdade isso é uma forma muito amadora de ver a arte aqui no Brasil. Aqui ou o cara canta, ou dança, ou representa, não tem um cara como nos EUA em que o cara é foda tanto cantando quanto representando ou atuando, um artista completo. Aqui no Brasil isso não existe. O máximo que eu imagino que canta, dança, etc. é a Cláudia Raia, mas não existe isso por aqui. E é um puta preconceito.

O que o disco do Detonator está fazendo no mercado está causando uma reviravolta, e muita gente não está entendendo. Por quê? Porque a grande maioria não quer arriscar. Pensam “vou cantar em inglês, porque em português não rola”. Eles já têm medo de fazer em português porque, quando você escreve em português, você tem que ter uma letra boa, ou então o cara vai ouvir e falar “putz… Que merda de letra” – a mensagem o cara vai receber na hora, não vai ser só a música. E o humor é uma ferramenta muito poderosa, cara. Vê o caso dos Mamonas Assassinas, do Spinal Tap lá fora – todo mundo do Heavy Metal fala do Spinal Tap. Além disso, tem a empreitada do Detonator também no lance da loja virtual e de vender nos eventos. Para você ter uma ideia, vou te falar em primeira mão: O Rafael Bittencourt (guitarrista do Angra), hoje, estreou a lojinha dele em um evento de animê vendendo pessoalmente porque ele me viu fazer isso em um evento.

Então, eu já penso com uma cabeça totalmente diferente em relação à mídia, a marketing, porque eu venho da televisão e entendo como funcionam essas coisas. O mercado de Metal Nacional é hiper amador, então é por isso que tem esses preconceitos – que na realidade é um desconhecimento mesmo.

DELFOS: Você se vê abrindo um caminho no Heavy Metal no nosso país?

Bruno: Claro, porque esse negócio de ser rockstar, de se colocar em um pedestal… Isso já foi. O pessoal vê o Yngwie Malmsteen e já fala “putz, que saco, lá vem o chatão”. Hoje em dia, com o esquema das redes sociais e tudo, o fã escolhe o que ele quer ouvir. Antigamente era a mídia, as gravadoras e os canais de televisão que determinavam o que o cara ia ouvir, e hoje em dia é o contrário, e o artista bota o negócio para o cara escolher.

O poder de escolha do público agora é muito grande, então a relação entre ídolo e fã virou muito mais uma relação de brother. O cara, quando me vê na loja vendendo, fala “puta que pariu, esse cara é maneiro” – e eu faço isso com a maior gratidão, porque eu considero que o cara que compra o meu disco, que, de cem canais, escolhe o meu para assistir, de uma certa forma é o meu patrão. E eu trato ele com a maior gratidão. Quando eu vejo o cara dar trinta contos no meu disco, eu agradeço pra caralho, e de coração. E esse é o tipo de relacionamento que eu acho que todo artista deveria ter com o público, pelo menos para experimentar como é gratificante. Eu lembro quando eu fiz o disco lá em casa, gravando os riffs e pensando se isso ia vingar, e agora o pessoal comentando, indo comprar, você vindo aqui fazer entrevista com conhecimento do disco… Eu acho isso do caralho, e sou grato por isso. Sem frescura.

DELFOS: Falando um pouco mais do disco, ele tem muitas participações especiais, isso não é novidade. Mas teve algum nome que ficou de fora?

Bruno: Na verdade, eu pensei em alguns nomes mas que não puderam. Eu queria que o Andreas (Kisser, guitarrista do Sepultura) tocasse na música do Saci porque a música do Saci tem uma pegada muito tribal, meio Sepultura, sabe? Eu pensei no Andreas, mas ele teve que fazer uma viagem aos EUA e não pôde. O Edu (Falaschi, vocalista do Almah e ex-Angra) ia fazer a Boitatá, mas estava muito ocupado e não teve como fazer. E o Andre Matos ia fazer a Mula-Sem-Cabeça, mas como ele estava fazendo a turnê do Angels Cry, eu não conseguia fechar uma data, e acabei fazendo com a Anna Paula Marchesini, que é a cantora que canta comigo no The Soundtrackers e está agora no The Voice Brasil. Eu até fiz uma brincadeira, falei “tá vendo, cantar no disco do Detonator dá tanta sorte que ela entrou no The Voice!” (risos).

Eu fiquei hiper satisfeito com as participações do disco, mas eu não fico enaltecendo as participações. Eu coloquei porque são pessoas das quais eu sou fã e eu gostaria de ter colocado comigo no disco, mas não é uma coisa que eu quero utilizar para vender mais disco – é só para dar uma recheada, tanto que eu não faço propaganda disso.

DELFOS: Uma coisa que eu senti falta ao fazer a resenha do disco era justamente a participação de algum membro do Massacration. Não houve nenhum convite ou algo nesse sentido?

Bruno: Ah, cara, o Hermes & Renato, na época da gravação do disco, tinha voltado para a MTV e eles estavam muito ocupados. Também não passou pela minha cabeça convidá-los porque de uma certa forma eu fiquei receoso de vir essas comparações, sabe? “Ah, volta para o Massacration”, “Massacration era mais legal”, porque isso sempre tem, essa viuvez. E quando você quer lançar um produto novo, por mais que eu seja amigo do pessoal do Hermes e Renato, é um divórcio, sabe? Eu tinha que encontrar meu próprio caminho sozinho, independente deles. Eu saí do Hermes e Renato por diferenças do que a gente queria para a nossa carreira. Eu queria ir para um lado, na minha carreira humorística e artística, e eles queriam ir para outro. É igual casamento, chega um momento em que cada um quer ir para o seu lado, e por isso eu não pensei em chamar ninguém – mas nada me impede de, quando eu for gravar o DVD do Metal Folclore, chamá-los para participar tocando músicas do Massacration. Muito pelo contrário, eu ficaria hiper grato se rolasse.

DELFOS: Então vai ter um DVD do Metal Folclore?

Bruno: Eu não posso te afirmar, mas eu quero fazer. Mas aí é aquilo, eu não tenho gravadora e não quero gravadora, eu não quero atravessadores no meu negócio. Eu ter tomado esses “nãos” foi ótimo, cara, porque eu consegui realmente enxergar o que é você levar uma carreira artística independente. É você ser o dono da sua própria empresa, da sua banda – sem intermediários. E é exatamente isso que eu levo, é assim que tem que ser.

DELFOS: Esse é o futuro?

Bruno: Esse é o presente. Era futuro antigamente.

n.e.: nesse momento, os músicos da banda do Detonator e do Cavaleiros in Concert se preparam para sair e perguntam ao Bruno se ele vai sair com eles. No fim das contas, ao perceber que Bruno estava dando uma entrevista, Larissa Tássi, vocalista do Cavaleiros in Concert, decide deixar uma mensagem, que você confere logo abaixo. Sério, vale a conferida.

DELFOS: Falando um pouquinho do Massacration, você gravou o primeiro disco com a produção do João Gordo e o segundo com a produção do Roy Z. Como foi essa diferença de experiências?

Bruno: O Gordo é o cara que eu considero o padrinho do Massacration. Quando a gente fez todas as sátiras musicais do Hermes e Renato, o João Gordo ouviu o Massacration, que era uma delas e falou “cara, vocês têm que lançar um disco”. E ele ficou martelando, “vocês têm que fazer um disco”, “têm que fazer um disco”… E a gente fez o disco, muito por influência dele, e foi muito legal porque ele deixou a gente muito à vontade gravando, dizia “as músicas estão do caralho, não tem nada o que fazer aqui, vai lá e grava, de boa.” O Roy Z também, porque o Hermes e Renato sempre foi um grupo que sempre trouxe tudo pronto e nunca precisou de um produtor musical ou de um finalizador de roteiro… A gente sempre trouxe tudo pronto. Na verdade, eles foram mais facilitadores de como deixar um som legal. O João Gordo deixou um som mais flat, que eu prefiro. Eu prefiro o som do Gates of Metal (Fried Chicken of Death, primeiro disco) do que o som do Roy Z no Good Blood Headbanguers (segundo disco). Eu achei que o som do Roy Z ficou um som muito genérico de Heavy Metal, meio de plástico, sabe? Aquele som muito comprimido… Na verdade, eles funcionaram mais como facilitadores para deixar o som do jeito deles. Mais em masterização, em mix. Em relação a arranjo, não fizeram muita diferença.

DELFOS: Mas é curioso, porque a gente vê uma diferença entre o Gates of Metal e o Good Blood Headbanguers no sentido dos arranjos do segundo disco estarem um pouco mais sofisticados, com solos um pouco mais trabalhados..

Bruno: É, musicalmente pode até soar assim, mas eu particularmente acho o Gates of Metal, nossa, dez milhões de vezes melhor do que o Good Blood, porque tem que passar um tempo pra você entender como é o disco… Eu não gosto do Good Blood, na verdade, acho um disco fraco.

DELFOS: Sério?

Bruno: É. As músicas que eu gosto nele são a primeira, Hammercage Hotdog Hell, a Four Elements (n.e.: “The Fire, The Steel, The Heavy and the Money”) – mas só até a metade, porque aquele final eu acho chato pra caramba, meio ManowarThe Bull e The Mummy. O resto eu acho que foi tirar leite de pedra do que o Massacration já tinha sido, acho que foi meio forçar a barra.

DELFOS: Agora eu vou citar duas coisas aqui. No Gates of Metal nós temos Metal Bucetation, que tem o vocal inspirado na Dark Ride, do Helloween. No Good Blood nós temos a Sufocators of Metal, que é inspirada na Battle Hymn, do Manowar.

Bruno: É, pode crer.

DELFOS: Na resenha eu falei que a Boitatá tinha inspiração em Hellrider, do Judas Priest. Confirma?

Bruno: Certíssimo. Parece que em cada disco eu dou uma homenageada em um, entende? A Boitatá é bem similar à Hellrider mesmo, porque Boitatá eu achei uma música bem agressiva, e quando você está compondo você está ouvindo alguma coisa. No dia em que eu estava compondo a Boitatá eu estava ouvindo o Angel of Retribution (n.e.: disco do Judas Priest em que Hellrider foi lançada. Mas a intenção não é copiar nem nada, eu só acho que encaixa, sabe. Encaixou e eu falei “putz, tem que ser essa linha de voz, foda-se”.

DELFOS: E acaba sendo uma grande homenagem ao Judas porque o Judas é uma banda que faz muita música sobre monstro.

Bruno: Pode crer. É mais como uma homenagem do que querer ser malandro sabe? Eu não preciso ser malandro. Se você pega o conceito inteiro do Metal Folclore, isso é um conceito tão ínfimo… Tanto quanto nas músicas do Massacration, também. No dia em que eu fiz a linha de voz da Metal Bucetation, eu estava indo para a casa dos caras ouvindo o The Dark Ride, aí estava aquela base, mí-ré-dó… Ficou na cabeça, vou fazer isso. Tanto é que depois de anos, alguém me perguntou, em uma entrevista, e eu falei “isso é totalmente a Dark Ride“. Aí o Fausto me perguntou “pô, o que é isso?”, e eu respondi “é uma música do Helloween, ouve aqui”. Aí eu botei e ficou Marco, Fausto, todo mundo falando “Poooooorrra, cara, que cara de pau, cara…” (risos). Foi engraçado pra caralho, isso. E tem outra música lá, a Bad Defecation, do Good Blood, em que o Fausto, na época, estava ouvindo pra caralho Kiss, e tem uma música do Kiss que tem exatamente esse riff da Bad Defecation (nesse momento, o Bruno cantarola o riff da música), que eu não lembro que música que é.

Mas a gente quando cria alguma coisa está inspirado. É complicado você criar uma coisa do zero, musicalmente, mas quando você pode trabalhar o conceito da coisa toda, a música vira um detalhe só.

DELFOS: Você já teve e já participou de muitas bandas cover. Tem o Death Tribute…

Bruno: Sim, e vai fazer um show dia 5 lá no Blackmore Rock Bar, em homenagem a mais um aniversário da morte do Chuck.

DELFOS: Teve a banda cover do Judas Priest, Hell Patrol, em que você eventualmente fazia participações, a Children of the Seven Keys, cover de Helloween, a Soundtrackers, que trabalha com trilhas sonoras… Você tem mais alguma ideia para banda cover?

Bruno: Não, não dá tempo, cara. (risos) De vez em quando eu faço algum tipo de evento como eu vou fazer esse mês em São Paulo, o “Bruno Sutter canta Clássicos do Heavy Metal”, que me chamaram para fazer e que eu vou cantar as músicas que eu gosto com uma banda-base. Eu amo cantar, cara, minha vida é cantar. Eu sou humorista por acidente e músico por escolha, então eu tento conciliar o que eu amo fazer com a minha profissão. Agora eu consegui concluir esse objetivo que é viver de música, viver de Rock, e o humor, que também faz parte da coisa toda… Eu tento conciliar tudo para ficar as duas coisas que eu adoro fazer, que é humor e música.

DELFOS: Falando no “Amada Foca” (n.e.: grupo de humor do qual Bruno Sutter faz parte), qual a diferença entre trabalhar no Amada Foca e no Hermes e Renato?

Bruno: O Hermes e Renato era um grupo que me dava muito trabalho, psicologicamente falando, porque o esquema de criação do grupo é muito intenso. Então, para quem acha que o pessoal do Hermes e Renato ligava a câmera e começava a falar um monte de merda, você está hiper equivocado. Porque a realidade é que a gente se encontrava durante doze anos de dez da manhã até as seis da tarde, de segunda a sexta, para criar texto. Então era muito desgastante, eu ficava no laptop digitando os textos, dando ideia e digitando, e depois de doze anos trabalhando com isso eu fiquei realmente muito estafado de criar humor – tanto que hoje em dia eu não crio mais. No esquema do “Amada Foca”, eu vou exclusivamente como ator, porque eu não aguento mais escrever humor. Eu tenho na cabeça o pensamento de que eu prefiro fazer humoristicamente uma coisa muito intensa que eu posso utilizar desse trabalho (como um roteiro para uma peça de teatro em que eu excursione com ela, ou um disco como o do Detonator, em que eu concentro meus esforços todos ali e saio excursionando, mostrando as músicas do disco) do que criar 40 roteiros muito fodas que vão passar na televisão uma vez e ninguém vai ver mais. Eu acho que é um desperdício muito grande de energia – que eu já fiz, na época do Hermes e Renato, e nesse legado ninguém mexe.

Imagino que o que eu colho hoje foi o que eu plantei com muito esforço no Hermes e Renato junto com os meus amigos. Eles ainda mantêm esse tipo de trabalho, e eu acho insano. Eu acho um trabalho muito grande, fazer aqueles roteiros hipertrabalhados que vão passar em um canal de TV a cabo que sei lá se o pessoal vai ver – que talvez possa ir para o Youtube mas não vai ter aquele reconhecimento que deveria ter. Tanto que o Hermes e Renato é um grupo muito subestimado. Muita gente não conhece o grupo porque era uma parada hiperunderground. O pessoal redescobriu o Hermes e Renato depois do Youtube, porque na época da MTV só quem via que conhecia. Quem gosta do Hermes e Renato e conhece é o pessoal da época, e o resto do pessoal ouve falar mas não sabe direito o que é.

O Amada Foca é um grupo muito mais leve de se trabalhar, porque os roteiros já vêm prontos – é o Gabriel di Giacomo e o Marcelo Botta, os diretores, que fazem os roteiros, e o Bento Ribeiro também ajuda bastante, porque ele gosta de escrever, e eu vou pra atuar. Estou cansado de escrever humor (risos). Até porque, depois de doze anos escrevendo humor, acho que eu já escrevi sobre tudo, cara. Eu vou acabar me copiando, uma hora ou outra, sabe? E eu não curto fazer mais do mesmo.

Isso é uma coisa que o Hermes e Renato me ensinou e que eu levo para a minha vida: sempre se renove. Tanto que as temporadas do Hermes e Renato cada ano eram uma coisa. A gente fez novela, dublagem, programa de esquetes… Então a gente fazia sempre coisas diferentes. Hoje em dia eu prefiro trabalhar no Amada Foca porque é um grupo leve no sentido de chegar lá, fazer duas horas por semana, grava, dá risada e vai embora. O Hermes e Renato já era mais denso: “essa piada não tá legal, vamos refazer, refazer, refazer…” Esse lance todo de ter esse cuidado acabou criando roteiros que entraram para a história, mas eu penso, humoristicamente falando, que eu já fiz história nesse tipo de formato, então eu prefiro agora fazer uma manutenção confiando nos redatores, porque na época do Hermes e Renato a gente não confiava em nenhum redator. A gente escrevia, o roteiro nunca vinha de fora. Acho que as pessoas que escrevem hoje para o Amada Foca, inspiradas no Hermes e Renato, fazem um bom trabalho.

DELFOS: E o período em que vocês ficaram na Record, como Banana Mecânica, também foi no mesmo estilo que na MTV? (n.e.: após se desvincular da MTV, o Hermes e Renato foi para a Rede Record, onde alterou seu nome para Banana Mecânica e passou a fazer parte do programa Legendários)

Bruno: É, a gente escrevia tudo, e a Record deu total liberdade criativa para a gente escrever o que a gente quisesse – obviamente sem palavrão. Então a gente escreveu nesses moldes no primeiro ano, e foi muito legal: a gente fez o “Tretas de Família”, teve “Os Mutontos”, a gente gravou lá na cidade cenográfica da Record, foi uma puta experiência… Aí o segundo ano foi complicado porque a diretoria mudou e eles queriam fazer um programa de auditório, mais popular, aí começaram a botar o dedo e começou a desandar: “cada um tem que fazer um personagem fixo porque o público vai entender melhor”, “o público vai achar isso, aquilo”… E aí eu pedi para sair do Legendários, porque humoristicamente eu estava me sentindo hipersubestimado. No humor você não pode fazer porque o público acha isso ou aquilo, você tem que fazer porque acha legal, não fazer humor para os outros. Se você faz e você acha legal, foda-se, vai ter alguém no mundo que também vai achar legal. E essa verdade humorística do Hermes e Renato eu levo comigo até hoje.

E aí eu pedi pra sair e tive que sair do Hermes e Renato consequentemente. Foi uma decisão drástica que eu tomei, mas eu não estava aguentando mais me vestir de Dona Peida. Eu expliquei para eles, em um primeiro momento eles foram relutantes sim – na época eu recebi um convite da MTV para fazer um programa de Rock com humor -, mas aí eu saí, amigavelmente.

DELFOS: E no Rocka Rolla (n.e.: programa de Rock protagonizado pelo Detonator na MTV), você acha que conseguiu atingir o seu objetivo inicial?

Bruno: Sem dúvida. Aquele foi um programa que eu fiz com muito carinho e que ficou exatamente da maneira que eu achava que um programa de Rock na MTV tinha que ser: um programa que tinha humor, educava a nova geração mostrando as raízes do rock por intermédio das bandas cover, tinha a tradução dos clássicos do Death Metal, tinha as participações especiais, transformando qualquer coisa em Heavy Metal – foi o Fofão, cara, foi a Valesca Popozuda! E foi um programa que dentro da MTV fez muito sucesso. Foi sucesso de crítica também, e a gente ganhou até um prêmio, o Prêmio Rock Show, lá em Santos, como melhor programa de TV. O pessoal entendeu que era um programa necessário para a grade da MTV, que estava muito perdida na época. Então foi um programa que agregava rock, humor e música, tudo junto de uma forma bem legal.

DELFOS: Você acha que o programa teria crescido mais se a MTV tivesse continuado?

Bruno: Acredito que sim. Acredito que, se tivesse sido em outra época, o programa teria sido um sucesso. O problema é que a MTV acabou, né? Então na época em que o Rocka Rolla acabou, no final de 2012, a Abril já estava cagando para a MTV: “ah, faz qualquer coisa aí, a gente já vai fechar mesmo, a gente vai ficar até o final do ano que vem…” A Abril já sabia disso, só que não nos falava, então eles não se interessavam. E o departamento comercial da MTV era muito preguiçoso. Eu tinha que bolar campanhas de marketing para vender para o Comercial da MTV para eles irem atrás dos clientes. Como a MTV sempre foi um canal super cult, eles esperavam o cliente vir até a MTV, entendeu? A Coca-Cola chegava na MTV, marcas de pasta dental chegavam na MTV, e quando as coisas começaram a desandar, os anunciantes pararam de procurar. E a MTV parou de procurar também: o pessoal do departamento comercial ganhava uma grana, um salário, e foda-se. O Rocka Rolla não teve grana para continuar por isso.

Mas era um puta programa legal, divertido. Eu tenho todos os programas gravados em casa e de vez em quando eu fico vendo, tanto que tem vários quadros do Rocka Rolla que eu pego e boto no Bem Que Se Kiss (n.e.: programa de rádio da Kiss FM apresentado por Bruno Sutter.) Por exemplo, a tradução dos clássicos do Death Metal eu pego o áudio do programa e jogo lá, porque pouca gente viu. Nesse final da MTV, o direcionamento estava muito confuso, e o pessoal começou a ficar “de bode” da MTV e parou de ver.

DELFOS: Você já trabalhou na televisão, trabalha com música, já lançou livro, já trabalhou com revista no Hermes e Renato, agora está na rádio, com o Bem que se Kiss, e na internet com o Amada Foca… Qual a influência dessa rotatividade de mídias na sua carreira?

Bruno: Puta, cara, é muito louco. Eu sou um cara que fica meio inquieto fazendo uma coisa só, em uma plataforma só. As pessoas que falam de signo dizem que geminiano é assim, né, faz uma coisa com mó paixão e depois “ah, não quero mais fazer isso”. Como eu cansei de criar humor, eu quero sempre me desafiar com coisas que eu nunca fiz, para justamente ter essa coisa de continuar buscando e estar apaixonado pela vida dura de encontrar um caminho novo. Acho isso do caralho. Igual agora, a minha menina dos olhos é a Lojinha do Detonator, em que a gente pega e tem o desafio: a gente tem que vender! Aí o Verdone, meu parceiro de venda, vai lá, traz o cara, apresenta o Detonator… E a rádio também, cara. Eu nunca tinha feito rádio ao vivo. A gente gravava os esquetes do Hermes e Renato na 89FM e na Mix, mas era tudo pílula que passava durante a programação.

Ter um programa de rádio ao vivo, puta que pariu, é muito maneiro porque você exercita o conversar com o público – coisa que o Hermes e Renato nunca teve, interação ao vivo, sabe, e eu acho sensacional. A internet eu também acho uma plataforma nova de se trabalhar, e hoje em dia eu tenho muito mais confiança na internet do que na televisão, e até por isso eu não voltei para a TV. Pro meu estilo humorístico, eu nunca vou para uma TV aberta, porque eu já tive a Record como exemplo e sei que a TV aberta não é lugar para mim. Eu já não tenho mais essa pegada de criar humor como era no Hermes e Renato e… Eu quero viver de rock, e isso não cabe na TV aberta. Eu tenho um projeto muito legal de um programa pro Detonator que é tipo uma continuação do Rocka Rolla que não cabe em uma TV aberta – caberia em uma TV a cabo -, mas como eu estou com muita coisa, não dá tempo de eu separar e correr atrás. Se vier um canal de televisão a cabo convidar, a gente trabalha, mas por enquanto não é o meu interesse.

Eu também adorei fazer o livro. Outro dia eu fui ler o livro – porque você esquece, né? -, fui dar uma cagada e peguei o livro pra ler (risos). Bicho, o livro é muito maneiro! Sabe, tem umas sacadas que eu fico tipo “cara, fui eu que pensei nisso?”, porque quando eu fui escrever o livro, eu escrevi em uma semana. Me foquei para fazer o negócio, tipo aquela teoria que eu te falei, em que eu prefiro me concentrar para fazer uma coisa legal e tirar disso o produto que vai rodar. Com o livro foi assim. E o livro na lojinha vende muito bem, e na lojinha virtual também. Então eu estou curtindo muito, adoro estar multiplataforma.

DELFOS: Você já está com o Detonator há doze anos e é um personagem que exige muito da sua voz. Como você faz para manter a performance vocal em alto nível?

Bruno: Muito obrigado pelo alto nível. (risos) Cara, eu amo cantar, cantar é a minha vida. A minha formação de cantor é uma formação erudita de madrigal. Eu cantava música antiga da Renascença, e esse tipo de música exige bastante do falsete e da voz de cabeça. O Andre Matos prefere falar que é voz de cabeça (risos), mas a voz de cabeça é um falsete encorpado, colocado na caixa craniana da maneira correta para te dar mais potência. Eu trabalhei muito a voz de cabeça nessa época do madrigal, e utilizo isso com o Detonator. Eu uso bastante falsete com o Detonator, voz de cabeça eu uso mais cantando Helloween, e isso é uma coisa que não machuca a minha voz. Tanto que a gente tava no show, o show acabou e eu estou conversando contigo com a minha voz normal. Ela está um pouco cansada, obviamente, porque eu fiquei vendendo duas horas e pouca na loja e depois fui fazer o show.

O que tira mais a minha voz é falar para vender na loja do que cantar. Mas eu cuido da minha voz, tem o xarope lá, o Pei Pa Koa, o xarope chinês que é um milagre… Mas eu cuido da minha voz. Eu não costumo gritar, gosto de falar em um volume baixo, e a técnica de voz que eu aprendi durante os anos, principalmente no Soundtrackers, ajudou muito no Detonator. Eu cuido bastante da minha voz para ter um futuro com o Detonator.

DELFOS: Mas ao mesmo tempo você também tem o Death Tribute, em que você canta gutural. Como você faz para aliar esses mundos, do gutural, do falsete, da voz de cabeça…?

Bruno: É, eu uso muito a minha voz. A minha vida está baseada na minha voz, se eu perder a voz, fodeu (risos). Então eu tenho que cuidar, tenho sempre um Pei Pa Koa na mão – e outro dia eu fui lá na Liberdade (n.e.: bairro de São Paulo) e tinha acabado o Pei Pa Koa. Eu fiquei desesperado, indo de loja em loja, até que eu achei uma lojinha lá no finalzinho da Liberdade que tinha… E aí eu comprei logo três, R$45 cada um, gastei uma grana. Mas eu tenho um em cada lugar, um na casa da minha namorada, um na minha casa e um no carro. Qualquer coisa, eu tomo.

Mas o lance do gutural é mais complicado. Gutural não tem técnica, tu pode aliviar um pouco, mas machuca a voz. Aí é aquele negócio: a gente voltou a ensaiar com o Death Tribute agora, e nos primeiros ensaios eu vou me machucar, mas depois meu organismo vai se acostumar. Mas o gutural é algo que você tem que usar com muito cuidado, porque aquilo ali fode a voz mesmo. Mas o gutural fechadão, tipo o do Cannibal Corpse, do Chris Barnes, aquele não machuca a minha voz, o que machuca é aquele mais rasgado. O problema é que o do Death não é o fechadão, né, é um meio termo, é complicado.

DELFOS: Estamos chegando ao fim da entrevista. Agora eu te falo o nome de uma banda e você fala, em uma frase, o que você acha dessa banda.

Bruno: Tipo pingue-pongue.

DELFOS: Exatamente. Vamos lá:

Angra – Gosto.
SepulturaBestial Devastation.
Shaman – Andre Matos.
Black Sabbath – Minha vida.
Andre Matos – Ídolo.
Massacration – Gratidão.
Dio – Exemplo.
Noturnall – Thiago Bianchi e um bom marketing.
Krisiun – Correria, porque eles são “correria” mesmo.
Korzus – Putz…

DELFOS: Eles também são correria.

Bruno: Não, eu sei, foi uma banda que não existiu na minha vida, sabe? Eu não conheço o trabalho do Korzus. Mas eu respeito. Acho que respeito é a palavra.

Manowar – Massacration (risos).
MC Gui – (risos) Ostentação.

DELFOS: Bruno, quais seriam a melhor e a pior música da sua carreira?

Bruno: Cara a pior música da minha carreira eu nunca lancei, mas eu espero que um dia eu lance. Músicas conhecidas?

DELFOS: Sim, sim.

Bruno: Cara, uma música que eu acho ruim, mas não sei se é, é a Bad Defecation ou a Good Blood Headbanguers, são umas músicas totalmente desnecessárias. E não tem uma música que é a melhor. São momentos, né? Atualmente, Curupira é a minha música, que eu tenho um puta orgulho de ter feito, entendeu? Mas já foi Metal Bucetation, já foi Metal Is The Law, já foi Metaleiro… Quando eu fiz Metaleiro, cara, meu deus do céu… Parece chavão, mas eu fiz o disco todo e faltava uma música. Eu tava no banho, pensando que eu deveria falar dos outros estilos musicais brasileiros, e aí eu pensei em um riff para uma música de forró (nesse momento, Bruno canta o riff da música em um ritmo de forró). E aí eu pensei “putz, isso aí poderia ser um riff de Heavy Metal, é só você mudar as células rítmicas. E assim nasceu Metaleiro. E eu tava vendo alguma coisa de futebol , e passou aquela música “Eu sou brasileiro, com muito orgulho…” E aí foi isso. Eu fiquei muito orgulhoso com a Metaleiro. A anterior à Curupira era Metaleiro, mas agora é Curupira.

DELFOS: Bruno, muito obrigado pela entrevista, e eu vou te pedir para deixar uma mensagem para o seleto público do DELFOS.

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