Até o Último Homem

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Sabe uma coisa que eu percebi enquanto assistia a Até o Último Homem? O quanto tudo que eu sei de guerra veio dos videogames. Eu já sabia que as poucas armas que eu conheço de nome era por causa dos joguinhos eletrônicos, mas mesmo em matéria de táticas e estratégias, a coisa tem uma intersecção forte. Ou vai ver o Mel Gibson também é um fã de Call of Duty.

Por exemplo, em determinado momento tem um sujeito com um lança-chamas fazendo altos estragos. Eu fiquei mentalmente gritando: “atira no tanque que está nas costas que ele explode”. Não deu outra. Os soldados receberam a mensagem, atiraram ali e bum! Em outra hora, o Peter Parker se esconde em um túnel onde não dava para acertá-lo com tiros. O que fazer? Ora pois, jogar uma granada. E é o que os inimigos fazem.

Ao contrário do que pode parecer, no entanto, a guerra é só uma das três metades do filme. Pelo primeiro ato, aliás, você pode imaginar que se trata de um romance, já que vemos nosso herói Desmond Doss (Peter Parker) conhecendo e seduzindo uma teteia.

Mas daí a Segunda Guerra Mundial explode, e ele resolve se alistar. A ideia dele não é matar pessoas, mas cuidar dos feridos. De fato, de todas as funções que você pode ter em uma guerra, esta talvez seja a única que traz um resquício de honra e humanidade.

O problema é que as autoridades do exército não gostam muito da ideia de mandar um caboclo que não mexe em armas para a linha de frente. Esta é a segunda metade do filme, que acaba levando até a um julgamento, onde ele poderia ser dispensado de forma desonrosa.

Nessa segunda metade, também temos um bom desenvolvimento do treinamento dos soldados, o que me lembrou bastante do clássico Nascido Para Matar. Essa parte é bem engraçada, e conta com Vince Vaughn fazendo seu primeiro papel em um filme sério em sei lá quanto tempo. Ele é o responsável pelo humor dessa parte, mas ainda assim é um papel tão diferente dos que o nosso Menudo Fenômeno costuma fazer que eu até quis ficar nos créditos para garantir que era ele mesmo.

Ah, claro, temos também o Mel Gibson, que dirige o longa. Isso faz com que tenhamos duas coisas: as fortes motivações religiosas do protagonista e a violência explícita, cheia de tripas, membros arrancados e demais coisas que só costumamos ver no cinema Z.

Curiosamente, apesar de ser dirigido pelo dono daquele eterno mullet, Até o Último Homem está longe de ser um espetáculo do mau gosto, como foi A Paixão de Cristo. O sujeito deu um jeito de colocar suas características preferidas em um filme que não parece ter vindo da mente de um fanático, o que sem dúvida é uma boa notícia.

Se tanto, Até o Último Homem apenas deixa claro que veio da mente de um estadunidense. A forma que os japoneses são representados, como monstros fanáticos sem amor à própria vida deve ser bem como os japinhas são vistos pela turma vermelha e azul, mas também é bem próximo a como a gente vê eles daqui.

Já é estranho para nós alguém se alistar para ir à guerra por vontade própria, e fica ainda mais nonsense quando o carinha se recusa a pegar em armas e ao mesmo tempo não aceita desistir, mesmo percebendo que tudo aquilo pode acabar muito mal para ele.

Claro, no final de contas é uma história de herói, como quase todos os filmes de guerra e, neste ponto, até que ele se dá bem. Por mais absurda que qualquer guerra pareça para nossas mentes não-estadunidenses, acho que todo mundo concorda que o vilão ali não é o sujeito que está cuidando dos feridos, e isso o coloca acima da maioria.

Particularmente, eu não sou um fã de filmes de guerra e tenho claras discordâncias ideológicas contra o Mel Gibson, mas Até o Último Homem consegue não só ser assistível, como até ser uma boa diversão.