Assassin’s Creed IV: Black Flag

0

Assassin’s Creed vem passando por maus lençóis. Depois de uma estreia excelente e duas continuações que melhoraram consideravelmente suas qualidades, a partir de Assassin’s Creed Revelations, a série parece ter perdido um pouco seu rumo.

Cada vez mais sumiam as forças da série, como o stealth e os assassinatos minuciosamente planejados, para dar lugar a coisas como tower defense e criação de bombinhas. Assim, Assassin’s Creed III veio com muita expectativa de que retomaria o rumo das coisas e acabou sendo bem pior recebido do que todos gostaríamos. Um “ciclo do Sonic” parecia estar tomando conta da série, e assim Assassin’s Creed IV vem com a difícil missão de convencer os jogadores desiludidos com os rumos recentes a retomar a fé que tinham na série.

MAY THE FATHER OF UNDERSTANDING GUIDE YOU

Mais uma vez, temos um novo protagonista. Agora o dono da bola é Edward Kenway, o avô do Connor, de Assassin’s Creed III. Ele é um pirata, daqueles que saqueiam navios alheios em busca de riquezas.

Considerando que a Ubisoft diz que os jogos da série não são feitos em um ano, é deveras curioso ver o quanto a repercussão de Assassin’s Creed III parece ter influenciado este. Sai o sisudo Connor e entra um protagonista que, se não é cafajeste como o popular Ezio Auditore, é bem mais relacionável e simpático do que seu neto. Mas a principal diferença é que Assassin’s Creed IV não é mais um jogo em que você corre pelos telhados: é um jogo de navegação pelos sete mares. Uma mudança considerável e que parece influenciada por todos os reviews do jogo anterior que diziam que comprariam um jogo focado nos combates navais. Bom, é exatamente isso que temos aqui.

Boa parte do jogo e das missões acontecem em alto mar mesmo. Siga um navio, encontre um navio, destrua um navio. Este é o foco. Quando você não estiver em uma missão, vai navegar de ilha em ilha em busca de alguns mimos, tipo baús e mapas de tesouro.

Existem algumas cidades maiores, mas ao contrário do que deixou a série famosa, elas não são muito apropriadas para correr pelos telhados, já que não existem muitos prédios e mesmo as casas são bastante separadas. No final das contas, acaba sendo mais fácil e mais rápido correr pelo chão mesmo. E como mesmo as principais cidades são relativamente pequenas, você nunca vai precisar correr muito para ir de um ponto a outro.

NOTHING IS TRUE, EVERYTHING IS PERMITTED

As mecânicas básicas sofreram algumas alterações. A melhor delas é o novo sistema de fast travel, que permite que você se teleporte a qualquer momento para qualquer viewpoint previamente sincronizado. Simples e rápido, como tem que ser.

Edward também usa duas espadas, mas na prática isso afeta apenas as animações, pois o combate é o mesmo de sempre, focado em contra-ataques e sequências de fatalities. Cá entre nós, já está dando sinais de cansaço, e está mais do que na hora de recriarem o combate do zero.

É no stealth mesmo que Assassin’s Creed brilha. Assim como no jogo anterior, você pode se movimentar por plantações mais altas e delas assobiar para chamar a atenção dos guardas e matá-los sorrateiramente. Neste ponto, o jogo melhorou bastante, e é justamente onde ele deveria melhorar. Mas obviamente, temos o prato principal: o combate naval.

A PIRATE’S LIFE FOR ME

Eu gostei do combate naval em Assassin’s Creed III, e aqui ele está ainda melhor. Você pode atacar qualquer navio quando estiver fora de missões para pegar a carga que eles estiverem carregando. É possível afundar o navio e pegar o que flutuar (metade do valor) ou então invadir e ficar com tudo.

As primeiras invasões são muito legais. Seus capangas contratados jogam cordas no navio inimigo e começam a puxá-lo na sua direção. Você assume um canhão para matar alguns caboclos enquanto os navios se aproximam e, quando finalmente estiverem perto, balança numa corda em direção ao convés alheio, onde vai sair na porrada com todo mundo que estiver a bordo.

Os objetivos variam dependendo do tamanho do abordado. Em alguns casos, basta matar cinco marinheiros. Em navios maiores, chamados de “Man’o’war”, você vai precisar matar 20 caboclos e ainda destruir a bandeira, matar o capitão e os vigias. Os maiores benefícios estão, obviamente, nestes colossos dos mares, mas os objetivos começam a levar tempo demais e isso deixa enjoativo. Você sabe, matar 20 carinhas em um Assassin’s Creed leva um bom tempo, especialmente considerando que o combate está ultrapassado.

Isso é agravado pelo fato de que os upgrades para a sua embarcação exigem uma quantidade absurda de metal e de madeira, tornando os combates navais um exercício em grinding.

Também é um pouco cansativo ter que navegar por quilômetros de uma ilha para outra, uma vez que o navio é lento, especialmente para virar, e nada acontece no alto mar, a não ser que você resolva atacar os outros navegadores. As músicas que a sua tripulação canta são bem legais e ajudam a passar o tempo, mas no final das contas navegar em Assassin’s Creed IV deixou de ser a divertida ação de pular de telhado em telhado para se tornar simplesmente apontar seu navio em uma direção e esperar alguns minutos até ele chegar no seu destino.

Assim, o que era o mais legal do jogo acabou parecendo um simulador de perda de tempo, e tornou o novo fast travel totalmente necessário, embora para poder utilizá-lo com propriedade, você precisará navegar muito de ilha em ilha antes para sincronizar os viewpoints.

No final das contas, no entanto, a Ubisoft deu aos jogadores o que eles queriam. Todo mundo gostou da parte naval de Assassin’s Creed III e queríamos mais disso. Pois aqui está, um jogo inteiro focado nisso.

ASSASSINOS E TEMPLÁRIOS: CADÊ?

A questão é que Assassin’s Creed IV não parece um Assassin’s Creed. O foco do jogo é mesmo no combate naval, e você vai passar pelo menos 90% da sua jogatina a bordo do Jackdaw, o navio de Edward. E a história também passa longe do que se espera da franquia.

Templários, assassinos e sua eterna luta ficam em segundo plano, e acabam sendo muito mais coadjuvantes de luxo. A história é Edward em busca de um lugar chamado de “Observatório”, onde ele espera encontrar muitas riquezas. Obviamente, tanto os assassinos quanto os templários também estão atrás do local, mas eles quase não aparecem. Temos aqui uma história de pirataria, antes de qualquer coisa.

Inclusive, Edward não é um assassino, e só começa a trabalhar do lado deles bem no finalzinho do jogo. Até lá, você é totalmente independente, e se faz algumas missões para os assassinos, o faz simplesmente porque eles pagam. Inclusive, no início, você faz até alguns trabalhos para os templários. Admito, é bem emocionante quando, em algumas missões, assassinos começam a aparecer para te caçar, mas também me decepcionou um pouco quão fácil é para derrotá-los.

O fato de Edward não ser um assassino é refletido em suas roupas. Seu traje padrão é um traje roubado de um assassino, mas ele fica sem o capuz na maior parte do tempo. Além disso, praticamente todas as outras roupas que você destrava ao longo do jogo são trajes comuns, roupas e armaduras da época, que nada têm a ver com a irmandade dos assassinos.

O lado bom é que há mais fases de assassinato por aqui, algo que andava rareando nos jogos anteriores. No entanto, falta algum build-up para elas, algo que os dois primeiros jogos faziam tão bem. Muitas vezes você começa uma fase sem saber que ela será uma fase de assassinato até o jogo te dizer “mate fulaninho de tal”.

O lado negativo é que praticamente todas as fases em terra começam com objetivos que envolvem seguir alguém sem ser visto ou ouvir conversas, e estes são exatamente os tipos de missões que todo mundo reclama na série. Felizmente, depois disso, as mesmas fases evoluem para alguns objetivos mais interessantes, mas o começo é sempre igual.

Diante de toda a navegação e combate naval, e do fato de seu personagem não ser um assassino, você não pode mais chamar um discípulo para te ajudar no combate ou matar um guarda que está enchendo o saco. Uma pena, pois esta foi uma das adições mais legais da série, e o principal responsável para Assassin’s Creed Brotherhood ser o melhor da série.

UMA DESENVOLVEDORA DE GAMES FROM HELL

Falamos bastante dos piratas, mas uma das principais características da série sempre foi a narrativa na época atual, cheia de teorias da conspiração. Black Flag continua essa característica, mas uma vez que o protagonista Desmond Miles está de botas batidas, as coisas mudaram um pouco de figura.

Foi feito um retcon e agora o Animus não funciona apenas para ver seus antepassados. Você pode ver também os antepassados de qualquer outra pessoa que tiver doado seu DNA. No caso, você não é mais o Desmond, mas Edward ainda é um dos antepassados do antigo protagonista, e isso é possível pois os templários recuperaram seu corpo e restauraram vários antepassados dele (este assunto é abordado em um dos e-mails que fala sobre os possíveis rumos para a série).

Ah, mas o mais importante: ao invés de ser um soldado ou algo parecido, você é um desenvolvedor de games, que usa pesquisas históricas no DNA de “generosos” doadores para criar “experiências interativas”. Assassin’s Creed: Metalinguagem FTW!

Embora claramente baseada na Ubisoft, a Abstergo Entertainment, onde seu personagem trabalha, é um lugar onde coisas muito estranhas acontecem. Não vou me estender muito para não estragar a surpresa, mas boa parte da narrativa nestas sequências é feita através de arquivos de áudio ou vídeo que você encontra após hackear computadores.

Os minigames de hacker são bem básicos e se dividem em três modos. Um envolve matemática, outro é um labirinto que depende mais de sorte do que de qualquer outra coisa e o último é exatamente igual ao Frogger. Isso mesmo, aquele jogo em que você ajuda um sapinho a atravessar a rua. Prepare-se para jogar bastante dele no seu Assassin’s Creed IV.

Há algumas pontas de personagens dos jogos anteriores, e boa parte de suas hackeadas revelará coisas relacionadas ao Desmond, então ainda tem bastante conteúdo para quem está interessado nos antigos protagonistas.

UMA GARRAFA DE RUM

Assassin’s Creed IV: Black Flag é o jogo mais diferente da série. Se o que você espera dele é um desenvolvimento da parte naval de seu antecessor, regozije-se. Se você, como eu, esperava algo mais próximo das raízes, pode se decepcionar um pouco. Ainda é um bom jogo, mas o tempo passado simplesmente navegando sem nada para fazer a não ser ouvir as músicas cantadas pela tripulação o torna mais cansativo do que os outros jogos da série.

COLOQUE SEU MANTO BRANCO E LEIA TAMBÉM:

Assassin’s Creed – O começo da saga!

Assassin’s Creed II – A estreia de Ezio!

Assassin’s Creed Revelations – O fim das histórias de Ezio e Altair!

Assassin’s Creed III – Um Assassino contra Templários, esquilos e guaxinins!

Assassin’s Creed: entrevista exclusiva com o roteirista da série – Falamos de história, filosofia e literatura com o criador dos conceitos de Assassin’s Creed em uma das melhores entrevistas da nossa história.