Água Negra

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Não sei quanto a você, caro delfonauta, mas eu gosto de assistir às refilmagens de terror japonês, tão em moda ultimamente. Acho que é porque eles não demandam grandes explicações e a violência apresentada não é tanto física, mas psicológica.

Também gosto de ler as críticas a respeito deles, aquelas que geralmente falam que o original é melhor. Aí eu vejo os filmes originais e constato: crítico de cinema é um bicho chato por natureza, que muitas vezes gosta de falar mal só porque é legal. Vejamos os casos de O Chamado e O Grito. Muitos disseram que O Chamado era o melhor filme de terror a surgir em um longo tempo (eu achei muito meia-boca) e outros disseram que, adivinhe, o original era melhor (e eles são absolutamente iguais, pô). Já O Grito ganhou críticas dizendo que era bom, mas não chegava aos pés da película da fita maldita (eu achei mais legal) e, é claro, o original era melhor (bem, o original tem mais sustos, porém contém toda uma passagem bem confusa que foi limada da versão estadunidense. Daí declaro um empate).

O caso de Água Negra é um pouco diferente. Todas as críticas que li foram desfavoráveis e ninguém fez a tão comum comparação com o filme original. Enquanto a versão japonesa de Água Negra não chega às locadoras (se as versões dos filmes acima chegaram, por que neste caso seria diferente?), o jeito é passar minhas impressões do filme do brasileiro Walter Salles como uma obra única.

Bem, vamos tirar o óbvio da frente: eu gostei do filme. Devo dizer que, talvez influenciado pelas críticas que li, estava preparado para uma bela porcaria. Não é o caso. Mas talvez ajude mais se você não considerá-lo um filme de terror – afinal há poucos sustos, e a maioria bem ineficiente. Aliás, se os sustos não funcionam, são porque novamente acontecem em situações-clichê do gênero. Será que não há mais como inovar ou trata-se de pura falta de imaginação? Água Negra é, isso sim, um suspense com elementos sobrenaturais, já que a atmosfera de tensão permeia o filme inteiro.

Tensão que começa quando Dahlia (Jennifer “eu gosto de caras verdes e grandes” Connelly), recém-divorciada, muda-se com a filha pequena para um decrépito prédio na Ilha Roosevelt (ilha vizinha de Manhattan). Uma estranha goteira de Água Negra (ahá!) começa a pingar no apartamento alugado de Dahlia e durante a noite barulhos podem ser ouvidos no apê de cima. Até aí, tudo normal, mas acontece que o tal imóvel está vazio… Tã, tã, taaaaan!

É, parece que os japoneses adoram uma boa história de fantasmas e famílias disfuncionais, não necessariamente nessa ordem. Afinal, os dois filmes citados no início dessa resenha têm a mesma temática. Neste caso, parece que a moral da história é: cuide bem de seus filhos, senão… (para os devidos efeitos, imagine um brutamontes falando isso enquanto estala os punhos). E isso é tudo o que posso falar sem entregar demais.

Como escrevi lá no começo, estes filmes não apresentam muita violência física (aqui ela é quase inexistente), mas um lado psicológico bem forte. Neste caso, devido a um trauma de infância sofrido por Dahlia e que será a chave para a resolução do mistério.

Há também um furo de roteiro, uma situação que parecia ser importante para a trama, mas que acabou sendo esquecida. Claro, nem tudo precisa ser explicado, mas este não é um desses casos.

Agora, o que me surpreendeu mesmo, e fez este filme subir vários pontos no meu conceito, foi o final no mínimo inusitado. Não chega a ser uma surpresa, mas também não é muito comum para uma produção hollywoodiana.

No campo das atuações, tirando a oscarizada e linda Jennifer Connelly, que tem potencial para ser uma “rainha do grito”, merecem também destaque John C. Reilly, como um corretor de imóveis picareta, e um irreconhecível Tim Roth como o advogado de Dahlia.

Para quem está se perguntando como se saiu nosso querido Walter Salles (aliás, leia a resenha de Diários de Motocicleta) em sua primeira incursão no cinemão estadunidense, digo que escapou ileso. Entregou uma direção correta e discreta, porém muito segura. Nada que mereça críticas ou destaque. Quem merece uma menção favorável é o também brasileiro Affonso Beato, que já trabalhou em outros filmes na terra do Bush, responsável pela bela fotografia em tom esverdeado.

Dada minha experiência prévia com os outros exemplares do gênero (se é que se pode chamar assim), posso dizer que este filme pode surpreender a alguns, assim como me surpreendeu, mas com certeza não deverá agradar a muita gente. Trata-se de um indicativo de que a tal moda do terror japonês, embora ainda funcione, está precisando de uma renovação em sua temática. Senão corre o risco de ser atropelada por uma nova moda.

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